EVARIST​O MENDES

Evaristo Mendes

Ações sem valor nominal. Apontamento [i]

Já existe um número razoável de textos sobre as ações sem valor nominal [ii] . Dispensamo-nos, por isso, de um tratamento geral do tema. Subsistem, contudo, alguns pontos obscuros ou que merecem atenção, incluindo de índole terminológica. Com o presente apontamento, pretende-se lançar alguma luz sobre o assunto. Como se observará, ao valor nominal, relativo às ações que o possuem, correspondem, nas ações sem valor nominal, dois conceitos distintos: o de valor fracionário (também dito valor contabilístico, mas esta expressão presta-se a confusão); e o de valor fracionário de emissão (que a lei, por vezes, designa como valor de emissão). Os preceitos legais pertinentes devem ser interpretados tendo presente esta distinção [iii] .

1. Na sociedade anónima, o «capital é dividido em ações» (art. 271). Quer dizer, numa leitura formal do preceito, o capital estatutário [art. 9.1g)] ou nominal (art. 276 - epígrafe) está abstratamente dividido em frações, de valor igual (art. 276.4) [iv] . A cada fração corresponde uma ação: ação participação social ou unidade de participação social. Nesta medida, a ação tem um valor fracionário ou percentual, correspondente a uma fração do capital social.

Do pacto social tem de constar, além da cifra do capital social, o número das ações correspondentes às frações em que ele se divide [art. 272a)]. As ações podem ter, também elas, um valor estatutário [art. 272a)] ou nominal (arts. 272a) e 276) -ações com valor nominal. Este valor é um valor constante, desde que se mantenha o respetivo número e, inclusive, mesmo que o capital social seja aumentado. Só não será assim se sobre elas incidir um ato de divisão (até ao mínimo legal de 1 cêntimo - art. 276.3) ou de agrupamento (fusão) [v] ou um aumento do capital por incorporação de reservas se a opção for pelo correspondente aumento do valor nominal das ações.

Sendo as ações valores mobiliários, o que acontece quando se dá a sua titulação/cartularização ou escrituração (art. 46.1 do CVM), tal valor consta também das menções do título [art. 97.1 do CVM, por remissão para o art. 44.1b)] ou do registo individualizado [art. 68.1 do CVM, por remissão para o art. 44.1b)].

Mas o valor das ações correspondente ao valor das frações em que o capital se divide (valor fracionário ou percentual) pode não constar dos estatutos, isto é, pode não ser um valor formal ou explícito, mas meramente implícito, resultando de uma operação aritmética de divisão da cifra do capital estatutário pelo número (estatutário) das ações. Neste caso, teremos ações sem valor nominal. Na opção do legislador português, estas ações podem ser emitidas por valores fracionários diferentes consoante as emissões que haja (inicial ou sucessivas, correspondentes a aumentos de capital) (cfr. o art. 298.3) [vi] . Donde resulta que o valor das frações em que o capital, globalmente considerado, se divide - e o correspondente valor fracionário das ações - já não é um valor constante, mas um valor que pode vir a alterar-se em sucessivas emissões; ou seja, em contraste com a fixidez da cifra do capital estatutário e do valor nominal (estatutário) das ações com VN (valor fracionário com expressão nominal e estatutária), este é um valor variável.

2. Toda a ação tem como pressuposto uma entrada de capital: é atribuída a certo subscritor do contrato de sociedade ou de certo aumento do capital - ou seja, é emitida - contra o pagamento de certo valor. O valor da entrada (i.e., de subscrição ou emissão) - aquilo que o sócio paga por ela - não pode ser inferior:

- ao valor nominal da ação, no caso das ações com valor nominal (como se observou, um valor fracionário constante, explícito nos estatutos, nos títulos e no registo de ações escriturais) (art. 25.1 e art. 298.1);

- ao seu valor fracionário ou percentual correspondente a certa emissão [vii] - breviter, valor fracionário de emissão -, no caso das ações sem valor nominal (como se notou, um valor fracionário variável com sucessivas emissões, se as houver - cfr. o art. 298.3) (art. 25.2 e 298.1).

Se o valor de emissão - isto é, o valor da entrada que o sócio realiza para ter uma ação - for superior a esse valor fracionário de referência, ele inclui, além deste, uma segunda componente: um prémio de emissão [art. 295.3a) e d)].

3. Este valor fracionário de emissão - correspondente a cada fração em que se divide o capital inicial (emissão inicial) e a cada fração em que se divide a cifra de capital relativa a certo aumento (emissão sucessiva) - não se confunde com o aludido valor fracionário fundamental que resulta do princípio da divisão do capital em ações (supra, n.º 1). Na verdade, esse outro valor fracionário - apelidável de valor fracionário das ações [viii] , ou valor fracionário tout court -, que assume um relevo especialnas ações sem valor nominal, corresponde a uma fração do capital globalmente considerado, em contraposição à parcela (atual ou potencial) do capital envolvido numa dada emissão. Trata-se, no caso das ações com valor nominal, de um valor constante e, no caso das ações sem valor nominal, de um valor variável se houver sucessivas emissões com valores fracionários de emissão distintos.

Vejamos um exemplo. Uma SA constitui-se com capital inicial de 500 000 €, dividido em 500 000 ações sem valor nominal. As ações têm um valor fracionário de emissão de 1 € cada uma, uma vez que 1 € é o valor da fração de capital que a cada uma corresponde nesta emissão inicial. Este valor fracionário coincide com o próprio valor de emissão das ações se não tiver havido prémio de emissão. E coincide também com o valor fracionário das ações (também dito valor percentual, ou valor contabilístico segundo a Diretiva), uma vez que o resultado da divisão do capital estatutário (da sua totalidade) pelo número das ações existentes (da sua totalidade) é 1 €.

Todavia, suponha-se um subsequente aumento do capital de 500 000 €, numa situação de perda de valor das ações (real, contabilístico e/ou de cotação), com emissão de 1 milhão de novas ações; passando o valor do capital social a ser de 1 milhão e o número das ações, correspondente a outras tantas frações em que o capital se divide, a ser de 1 milhão e meio. Neste caso, o valor fracionário de emissão das novas ações é de 50 cêntimos (500 000/1 M); contra o valor fracionário inicial de 1 €. Mas o valor fracionário das ações - ou valor fracionário de capital [ix] das ações - é de 75 cêntimos (1 M/1,5 M); contra o valor inicial de 1 €. [x]

Admita-se, ainda, que a sociedade, com um capital social de 500 000 €, se valorizou, mas carece de um reforço financeiro, pelo que é aprovado um aumento do capital de 500 000 €, sendo o valor unitário de emissão das ações (o valor pago por cada fração de capital subscrito na operação) de 2 €. O valor de emissão tem aqui duas componentes: 1 € de valor fracionário (imputável ao capital) e 1 € de prémio de emissão. O valor fracionário das ações - resultante da divisão do capital (€ 1 M) pelo número de ações (1 M) - não se alterou, mantendo-se em 1 € [xi] .

4 . Genericamente, o valor fracionário de emissão das ações (ou valor de emissão simples) é relevante no contexto do princípio da exata formação do capital social, isto é, em relação às entradas necessárias para assegurar a integral cobertura patrimonial do capital estatutário, e tem a ver com a flexibilização financeira das sociedades anónimas pretendida com a introdução das ações sem valor nominal. O valor fracionário das ações cumpre um papel organizativo idêntico ao do valor nominal, nas ações com valor nominal, sendo o referente ou medida dos direitos e vinculações inerentes às ações. Vejamos algumas aplicações práticas, começando pelo CSC [xii] .

No CSC, dispõe-se no art. 298.1 que, tendo as ações valor nominal, é proibida a sua emissão abaixo do par, ou seja, abaixo do valor nominal (cfr. também o art. 25.1). No caso das ações sem valor nominal, é, por sua vez, proibida a emissão de ações abaixo do seu valor de emissão - ou seja a pessoa a quem for atribuída uma ação deve realizar uma entrada de capital pelo menos igual a este valor de emissão. Sucede que, segundo a terminologia comummente aceite, o valor de emissão de uma ação é a soma pecuniária que alguém paga para ela lhe ser atribuída originariamente, criada a seu favor, podendo ter duas componentes: uma fundamental, correspondente a uma fração do capital envolvido na emissão, e um eventual prémio de emissão [xiii] . Por conseguinte o valor de emissão a que a lei aqui se refere é esse valor fundamental, ou seja, o valor fracionário de emissão. Como se confirma não só pelo paralelo com as ações com valor nominal, mas também pelo art. 25.2, que dispõe: «[n]o caso das ações sem valor nominal, o valor da entrada do sócio deve ser pelo menos igual ao montante do capital social correspondentemente emitido». O mesmo sentido tem a expressão legal «valor de emissão» no art. 25.3 [xiv] .

Diferentemente se passam as coisas noutros preceitos legais. Assim, quando no art. 22.1 se dispõe que, na falta de preceito especial ou convenção em contrário, «os sócios participam nos lucros e nas perdas da sociedade segundo a proporção dos valores das respetivas participações no capital», o que está em causa é, nas ações com valor nominal, este valor; no caso das ações sem valor nominal, é o respetivo valor fracionário ou percentual (não o valor fracionário de emissão) [xv] . O mesmo sucede na partilha do ativo restante, como de forma até mais explícita decorre do art. 156 (n.ºs 2 e 4), apesar de a respetiva redação merecer reparos [xvi] .

A mesma regra é, ainda, aplicável - agora contra o texto da lei - no art. 341.2, que estabelece: «[a]s ações sem direito de voto conferem direito a um dividendo prioritário não inferior a 1% do respetivo valor nominal ou, na falta deste, do seu valor de emissão, deduzido de eventual prémio de emissão (...) e ao reembolso prioritário do seu valor nominal ou do seu valor de emissão na liquidação da sociedade». Na verdade, embora o texto aponte para um valor fracionário de emissão (valor de emissão menos eventual prémio de emissão), os titulares de ações preferenciais devem ter o mesmo tratamento sejam as ações com ou sem valor nominal; e, para este efeito, o que releva é o valor fracionário das ações, não o respetivo valor fracionário de emissão (cfr. o citado art. 156). O mesmo vale para o art. 345.4 e para o art. 346.1 (omisso acerca das ações sem valor nominal) [xvii] .

5 . No CVM, do registo da emissão de ações (de cada emissão) deve constar o valor nominal das ações com tal valor e o valor fracionário de emissão das ações, aí apelidado de valor percentual - [art. 44.1b)]. No registo individualizado das ações - também dito registo de titularidade - deve também indicar-se o VN ou o valor percentual [art. 68.1, que remete, nesta parte, para o art. 44.1b)]. Mas aqui o valor fracionário ou percentual não deve ser o valor fracionário de emissão, mas o valor fracionário ou percentual das próprias ações, produto da divisão do capital social existente pelo número de ações emitidas. O mesmo acontece, no art. 97.1, quanto às menções que devem constar dos títulos.

É este, na verdade, o valor que serve de referência ou medida dos direitos e vinculações, a ter em conta no exercício destes e numa eventual negociação das ações. Mas temos um problema.

Com efeito, sendo as coisas deste modo, o registo individualizado de ações escriturais terá que ir sendo atualizado em função de sucessivas emissões, o que obriga a uma operação de cálculo por ocasião de cada emissão e, sendo o registo detido por entidade diferente da sociedade emitente, obriga à comunicação do resultado a essa entidade. Seja como for, a solução afigura-se viável sem grandes custos. Todavia, a situação é mais séria no caso das ações tituladas: aí, os títulos terão que ser substituídos ou reconfigurados. Ou seja, as ações sem valor nominal casam mal com a respetiva titulação.

Glossário

Ação ou ação participação social: é a unidade de valor e de participação social ou posição jurídico-corporativa elementar e juridicamente autónoma correspondente a uma fração do capital social, atribuída a um sócio fundador ou participante em aumento do capital em troca da subscrição desta fração e consequente responsabilização pela realização do seu valor.

Ações com valor nominal (par value shares): são ações cujo valor fracionário de capital - ou seja, o valor correspondente a cada uma das frações em que o capital social se divide - é expresso nos estatutos da sociedade (tendo a estabilidade própria destes), nos títulos acionários e nos registos das ações escriturais. Ver valor nominal.

Ações sem valor nominal (no par value shares) : no ordenamento português (e demais ordenamentos europeus, em que apenas se admitem as chamadas ações sem valor nominal impróprias, correspondentes a frações do capital estatutário), são ações cujo valor fracionário de capital - ou seja, o valor correspondente a cada uma das frações em que o capital social se divide, que se obtém através da divisão do capital pelo número de ações existentes (salvo tendo havido remição de ações) - não é um elemento dos estatutos da sociedade, podendo variar em virtude de sucessivos aumentos de capital. Ver valor fracionário.

Capital próprio (ou situação líquida): valor do património líquido contabilístico ou de balanço de certa entidade, numa sociedade tipicamente oriundo de contribuições dos sócios e gerado pelo negócio social. Em sentido lato ou material, valor líquido ou residual da sociedade (aquilo que ela vale para os sócios).

Capital social (capital nominal ou estatutário): nas sociedades, cifra monetária inserida nos estatutos e com a estabilidade/fixidez própria destes. Deve cumprir as regras legais de capital mínimo.

Divisão do capital em ações : em sentido formal, é a divisão da cifra estatutária do capital em frações iguais, ou unidades de valor, a cada uma das quais corresponde uma posição jurídico-corporativa elementar relativamente autónoma - a ação participação social - atribuída a um sócio fundador ou participante em aumento do capital em troca da subscrição desta fração e consequente responsabilização pela realização do seu valor.

Emissão de ações : ato de criação e atribuição jurídica "originária" de ações a alguém (em geral, contrato de sociedade ou operação de aumento de capital); ou operação de criação e oferta para subscrição de ações aos investidores. Ver subscrição e valor de emissão.

Subscrição de ações : é a subscrição de uma ou mais das frações em que o capital se divide ou de uma ou mais ações da parcela de capital correspondente a certo aumento; noutros termos, o ato pelo qual alguém assume o compromisso de aquisição originária de ações - unidades de valor e de participação social correspondentes a outras tantas frações do capital social - ou o ato de aquisição originária de ações. Ver subscrição de capital.

Subscrição de capital : é a subscrição de documento donde consta o capital social ou uma parcela do mesmo, responsabilizando-se o subscritor pela realização do valor subscrito, isto é, pela realização de uma correspondente entrada de capital. Ocorre designadamente com a subscrição do contrato de sociedade (do que consta o capital) pelos fundadores ou de certo aumento do capital.

Valor contabilístico das ações : não havendo categorias especiais de ações, é o valor que se obtém dividindo o valor do capital próprio (ativo menos passivo contabilísticos ou de balanço) pelo número de ações existentes (também apelidado valor patrimonial, quando os elementos do balanço são ajustados de modo a refletir o seu valor real na data relevante). Um conceito particular encontra-se usado no art. 92.1 do CSC [e, porventura, na Diretiva do capital (hoje, diretiva de consolidação alargada)]: ver valor fracionário das ações.

Valor fracionário das ações [= valor percentual, valor capitalístico ou valor fracionário de capital das ações]: é o valor de cada fração em que se divide o capital social ou o valor da ação correspondente a essa fração. É ele que funciona como referência ou medida dos direitos e vinculações inerentes às ações (função organizativa ou ordenadora). Nalguns textos, sinónimo devalor «contabilístico» (formal) das ações: ver valor contabilístico.

- Valor com expressão nominal-estatutária (constante) no caso das ações com valor nominal; e valor inscrito nos títulos das ATN e nos registos de ações escriturais;

- Valor sem tal expressão estatutária - ou seja, valor meramente implícito, obtenível mediante divisão aritmética da cifra do capital estatutário pelo número total de ações emitidas (e subsistentes, salvo tendo havido remição de ações), suscetível de variar em função de sucessivas emissões de ações (correspondentes a outros tantos aumentos de capital) - no caso das ações sem valor nominal. Valor inscrito no registo individualizado de ações escriturais e eventualmente nos títulos de ATN.

Valor fracionário de emissão das ações : é o valor a pagar pela atribuição de uma ação correspondente a cada fração em que se divide o capital inicial (emissão original) ou a cada fração em que se divide o valor de certo aumento do capital (emissões sucessivas). Representa o valor mínimo legal a pagar por cada ação. É um valor simples de emissão, sem prémio de controlo. Ver valor de emissão.

Valor de emissão das ações : é o valor que alguém paga para lhe serem atribuídas uma ou mais ações ou com que tem que entrar para a sociedade para lhe serem atribuídas uma ou mais ações. Pode ser um valor simples, fracionário ou capitalístico, correspondente a uma fração do capital estatutário (original) ou a uma fração do valor de certo aumento deste; ou um valor com uma segunda componente, sujeita a um regime distinto - o prémio de emissão.

Valor nominal das ações : é valor de uma ação correspondente a uma fração do capital estatutário e, como este, integrante dos estatutos, com a estabilidade ou fixidez própria destes.

Valor de mercado das ações : é o valor pelo qual as ações se transacionam no mercado livre ou em mercados especiais, como o mercado da bolsa. No mercado oficial, regular e regulamentado da bolsa, corresponde ao valor de cotação unitário das ações. No mercado das ofertas públicas, tipicamente transacionam-se posições de controlo ou procura-se obter o controlo da sociedade, podendo as transações envolver um prémio de controlo, que acresce ao valor da cotação. O valor de oferta pública é, portanto, distinto do valor (unitário) de cotação).

Valor real societário das ações ou valor teórico das ações: é o valor correspondente a uma fração do valor económico-financeiro líquido ou residual da sociedade, que, com dedução do respetivo passivo, a esta é conferido pela empresa ou negócio sociais (ou prática profissional, se se tratar de sociedade profissional) e eventuais elementos ativos não afetos à exploração.

Valor de subscrição das ações : valor fixado pela sociedade para a aquisição originária de uma ação. Ver valor de emissão.

Lisboa, 9.10.2019



[i] Agradece-se ao Prof. Rui Pinto Duarte e ao Dr. Diogo Pessoa a leitura do projeto do presente texto (concebido para fins académicos) e as observações feitas acerca do mesmo.

[ii] CÂMARA, PAULO / ANTUNES, ANA FILIPA MORAIS – Acções sem Valor Nominal, Coimbra (Coimbra Editora) 2011

CORDEIRO, ANTÓNIO MENEZES – «Acções sem Valor Nominal», RDS II (2010)/3-4, p. 471-508

CUNHA, PAULO OLAVO – «Aspectos Críticos da Aplicação Prática do Regime das Acções sem Valor Nominal»,in Capital Social Livre e Acções sem Valor Nominal (coord. P. Tarso Domingues e Mª Miguel Carvalho)Coimbra (Almedina) 2011, p. 131-152

DOMINGUES, PAULO DE TARSO – Variações sobre o Capital Social, Coimbra (Almedina) 2009, p. 179 e ss.; «As Acções sem Valor Nominal», DSR 4 (2010), p. 181-214; «As Acções sem valor nominal no direito português», I Congresso DSR, Coimbra (Almedina) 2011, p. 53-73; – «Traços Essenciais do Novo Regime das Acções sem Valor Nominal»,in Capital Social Livre e Acções sem Valor Nominal, (coord. P. Tarso Domingues e Mª Miguel Carvalho)Coimbra, Almedina, 2011, p. 107-130; Comentário aos arts. 276 e 298 do CSC, in CSC em Comentário (coord. de Coutinho de Abreu), vol. V, 2.ª ed., Coimbra (Almedina) 2017, p. 72 e ss., 339 e ss.

FONSECA, TIAGO SOARES - Anotação ao art. 298 do CSC, in CSC Anotado (coord. de Menezes Cordeiro), 2.ª ed., Coimbra (Almedina) 2011, p. 848 e ss.

MACHADO, FRANCISCO SOARES – «Acções sem Valor Nominal: A sua Emissão a um Valor de Emissão Inferior ao das Acções Anteriormente Emitidas», CadMVM 41 (2012), p. 9-34

OLIVEIRA, ANA PERESTRELO – Manual de Corporate Finance, 2.ª ed., Coimbra (Almedina) 2015

OLIVEIRA, CATARINA GONÇALVES DE / JOANA PINHAL – «As “Novas" Acções sem Valor Nominal como Alternativa de Financiamento para as Empresas Portuguesas»,in Actualidad Jurídica Uría Menéndez, n.º 28 (2011), p. 107-112

SILVA, MIGUEL REIS E - «Acções sem valor nominal: algumas reflexões», Estudos IVM, 2011 .

[iii] Dados os fins limitados deste apontamento, não tratamos da questão se saber se uma tal interpretação é compatível com o sentido a dar aos arts. 47, 48.1 e 69 da Diretiva 2017/1132. Ressalva-se, no entanto, que, se nestes preceitos o conceito relevante for o do valor fracionário das ações e não o respetivo valor fracionário de emissão, matéria da competência do TJUE, uma interpretação do CSC conforme à Diretiva imporá uma revisão restritiva dos seus preceitos. Além disso, o texto parte do pressuposto de que só existe uma categoria de ações e abstrai das especificidades da criação e emissão de ações em caso de fusão, cisão ou transformação de sociedades.

[iv] Apelidáveis de ações unidades de valor, dado que as frações são todas iguais (art. 276.4). Note-se, contudo, que aqui só curamos do plano formal da divisão do capital em ações. Para uma análise substancial do princípio, cfr. Evaristo Mendes, «Deliberações dos sócios e intangibilidade do capital social. Algumas questões», in IV Congresso DSR, Coimbra (Almedina) 2016, p. 153-212, 159, e «Aquisições potestativas no artigo 490 do CSC após a Reforma de 2006 e procedimento justo», in V Congresso DSR, Coimbra (Almedina) 2018, p. 343-400, 347 e ss.

[v] Sobre esta operação, cfr., por ex., P. Olavo Cunha, «O (re)agrupamento de ações (só) nas sociedades cotadas», DSR 16 (2016), p. 197-206.

[vi] Trata-se, portanto, de ações sem valor nominal de tipo belga. Além disso, correspondendo a frações de uma cifra de capital fixada nos estatutos, são também designadas ações sem valor nominal impróprias, por contraposição àquelas que existem nas sociedades sem tal capital, como pode ser o caso dos EUA, mas não dos países da UE, por força da Diretiva citada. Cfr., por ex., P. Tarso Domingues, «Traços essenciais do novo regime das acções sem valor nominal» (2011), p. 107 e ss., 116 e s. (citando estudo de 2010), e CSC em Comentário (2017), p. 72 e s., 78 e s., P. Câmara /Ana Filipa Antunes, Acções sem valor nominal (2011), p. 15 e 35 e s, 41 e ss., 99 e ss., e F. Soares Machado, «Acções sem valor nominal (…)» (2012), p. 9 e ss.

[vii] Emissão inicial, que ocorre quando da conclusão do contrato de sociedade, ou emissão sucessiva, correspondente a cada aumento do capital.

[viii] No art. 92.1 do CSC (participação de um sócio num aumento de capital por incorporação de reservas), usa-se a expressão valor contabilístico. Trata-se de um valor contabilístico formal, distinto do comummente designado valor contabilístico que se obtém através da divisão do capital próprio (não do capital estatutário) pelo número de ações existentes. Note-se que, nestes aumentos gratuitos de capital, em que não está em causa a flexibilização do financiamento das SA cujas ações apresentam um valor deprimido (real, contabilístico em sentido material ou de cotação), é o valor fracionário das ações, correspondente à divisão do capital pelas ações existentes, que está em causa.

Cfr. também P. Tarso Domingues, «Traços essenciais do novo regime das acções sem valor nominal» (2011), p. 108 e 122, CSC em Comentário V (2017), p. 79, 85 e ss. Cfr., no entanto, Paulo Câmara / Ana Filipa Antunes, Acções sem valor nominal (2011), p. 107 e s., 114 e s.

Quanto à Diretiva 2017/1132, na versão inglesa do art. 47 (relativo ao preço de emissão das ações), do art. 48.1 (respeitante à liberação mínima das ações emitidas em contrapartida de entradas) e do art. 69 (relativo à liberação mínima num aumento de capital mediante novas entradas), utiliza-se a expressão «accountable par», na francesa «pair comptable» e, na tradução espanhola, «valor par contable»; na alemã, rechnerisches Wert, e na italiana «valore contabile». Mas «fractiewaarde», na holandesa. Trata-se do valor fracionário das ações ou do seu valor fracionário de emissão? Em tese geral, pode ser o valor fracionário das ações existente antes de um aumento do capital, esse mesmo valor referido ao valor do capital social aumentado ou o valor fracionário de emissão. Na primeira interpretação, não existe uma real flexibilização do financiamento das sociedades através do aumento oneroso do capital social. Na segunda, existe alguma flexibilização, mas a limitação ainda é considerável. Na terceira, a flexibilização é maior. Apenas nesta última a lei portuguesa - na respetiva interpretação corrente, que se segue no texto, fundada na exposição de motivos, na terminologia utilizada e no art. 298.3 - é conforme à Diretiva. Caso seja outro o sentido do texto europeu, a nossa lei terá, portanto, de ser interpretada restritivamente.

No sentido de que o valor contabilístico da Diretiva é o que se obtém através da divisão da totalidade do capital pelo número das ações existentes, cfr., por ex., P. Tarso Domingues, «Traços essenciais do novo regime das acções sem valor nominal» (2011), p. 108, CSC em Comentário V (2017), p. 79, 85 e ss. (aludindo ao problema da conformidade da nossa lei e da lei belga com a Diretiva). Aludindo ao problema terminológico e entendendo que a definição do que seja o «valor contabilístico» é deixada às legislações nacionais, cfr. P. Câmara /Ana Filipa Antunes, Acções sem valor nominal (2011), p. 32 e ss., 39 e ss.

[ix] Também suscetível de ser designado valor capitalístico, na terminologia de Menezes Cordeiro, 2010, p. 503.

[x] Substancialmente no sentido do texto e com exemplo semelhante, embora com outro quadro conceptual, cfr. Tarso Domingues, «Traços essenciais do novo regime das acções sem valor nominal» (2011), p. 113 e ss, e CSC em Comentário (2017), p. 72 e ss., 82 e ss. Cfr., ainda, Ana Perestrelo de Oliveira (2015), p. 60 e ss.

[xi] Se se tiverem em conta apenas os dados da hipótese, o valor contabilístico das ações, após o aumento, será de 1,5 € [(500 000+500 000+500 000) € / 1M].

[xii] Cfr. também, por ex., P. Tarso Domingues, p. 83 e ss., 85 e ss., e Ana Perestrelo de Oliveira (2015), p. 63.

[xiii] Cfr., por ex., o art. 295.3a).

[xiv] Cfr., ainda, o art. 28.3e). A linguagem é semelhante à do art. 25.2, pelo que se alude aqui ao valor fracionário da emissão. Mas, como se vê pelo confronto com a alínea d), se houver prémio de emissão, ele deve também ser contemplado no relatório do ROC, pelo que o valor em apreço poderá ser o valor fracionário da emissão (correspondente ao VN nas ações com este) acrescido do prémio, ou seja, o valor de emissão tout court. Veja-se também o art. 295.3a) e d).

[xv] Cfr., por ex., P. Câmara /Ana Filipa Antunes, Acções sem valor nominal (2011), p. 107, 109 e s., P. Olavo Cunha, «Aspectos Críticos da Aplicação do Regime das Acções Sem Valor Nominal» (2011), p. 147, referindo outros preceitos legais.

[xvi] Cfr. P. Olavo Cunha, «Aspectos Críticos da Aplicação do Regime das Acções Sem Valor Nominal» (2011), p. 150. O n.º 2 do preceito, que mantém a redação original, dispõe: «O ativo restante é destinado em primeiro lugar ao reembolso do montante das entradas efetivamente realizadas; esse montante é a fração de capital correspondente a cada sócio, sem prejuízo do que dispuser o contrato para o caso de os bens com que o sócio realizou a entrada terem valor superior àquela fração nominal». Como se vê pelo itálico, está em causa o reembolso do valor da fração do capital social que a participação social (parte social, quota ou ação) detida por cada sócio representa – no caso das ações, a idêntica fração do capital que cada uma delas necessariamente representa (art. 276.4) -, ou seja, o respetivo valor nominal ou, tratando-se de ações sem valor nominal, o correspondente valor fracionário. Mas, como decorre do primeiro segmento da norma, na medida em que tal valor se encontre realizado. No mesmo sentido depõe o critério estabelecido no n.º 3, a circunstância de, estando em causa ações fungíveis, não se saber se elas são anteriores ou posteriores a certa emissão, bem como o facto de os valores de emissão poderem variar, uma vez que, se o reembolso se referisse ao valor fracionário de emissão, variando este, teria que haver diferentes categorias de ações (cfr. o art. 302.º).

[xvii] Cfr., no entanto, Paulo Câmara / Ana Filipa Antunes, Acções sem valor nominal (2011), p. 117 e s. Vejam-se, ainda, o já citado art. 92.1 (valor «contabilístico») e o art. 136.1. Note-se, contudo, que a existência de diferentes categorias de ações justifica uma análise mais pormenorizada, fora dos propósitos deste apontamento.