EVARIST​O MENDES

Evaristo Ferreira Mendes

(D)A TRANSMISSIBILIDADE DAS ACÇÕES

Dissertação de Mestrado em Ciências Jurídico-Comerciais apresentada na Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa, relativa ao ano lectivo de 1985-86

Lisboa

1989

Vol. I

Participação accionária.

As acções como objecto de transmissão


PRINCIPAIS ABREVIATURAS

AcP – Archiv für die civilistische Praxis

ADHGB - Allgemeines Deutsches Handelsgesetzbuch

AG - Die Aktiengesellschaft

AktG - Aktiengesetz

BB - Der Betriebs-Berater

BBTC - Banca, Borsa e Titoli di Credito

BGB - Bürgerliches Gesetzbuch

BGB-RGRK- Ver comentários (na bibliografia)

BGE - Entscheidungen des schweitzerischen Bundesgerichts

BGH - Bundesgerichtshof

BGHZ - Entscheidungen des Bundesgerichtshofs in Zivilsachen

CC - Código Civil

CCom - Código Comercial

CO - Code des Obligations (suíço)

Col. Jur. - Colectânea de Jurisprudência

CSC - Código das Sociedades Comerciais (de 1986)

CVM - Código dos Valores Mobiliários (de 1999)

DB - Der Betrieb

DepotG (Depotgesetz) – Gesetz über die Verwahrung und Anschaffung von Wertpapieren (de 4.2.1937)

Foro It - Il Foro Italiano

GenG – Genossenschaftsgesetz

GG - Grundgesetz

Giur.Comm - Giurisprudenza Commerciale (Società e falimento)

Giust.civ – Giustizia Civile

GK – Grosskommentar

GmbH – Gesellschaft mit beschränkter Haftung (Sociedade de responsabilidade limitada)

GmbHG - GmbH-Gesetz (Lei das Srl)

GmbHR – GmbH-Rundschau

HGB- Handelsgesetzbuch

J. Soc. – Journal des Sociétés

JZ – Juristenzeitung

KK – Kölner Kommentar

Komm – Kommentar

MK – Münchener Kommentar

N. - número (número à margem), nota

N.A. - Nota de actualização

NJW – Neue Juristische Wochenschrift

Nov. Dig. It. – Novissimo Digesto Italiano

RabelsZ – Zeitschrift für ausländisches und internationales Privatrecht (fundada por Rabel)

RDC (Riv. dir. comm.) – Rivista del diritto commerciale (…)

RDE - Revista de Direito e Economia

Rev. Soc. – Revue des Sociétés

Rev. trim. dr. comm. – Revue trimestrielle de droit commercial

Riv. Soc. - Rivista delle Società

RG - Reichsgericht

RGZ – Entscheidungen des Reichsgerichts in Zivilsachen

Riv. dir. civ. – Rivista di diritto civile

Riv. trim. dir. pr. civ. – Rivista trimestrale di diritto e procedura civile

RLJ – Revista de Legislação e de Jurisprudência

ROA- Revista da Ordem dos Advogados

SA - Sociedade anónima

SAG – Die Schweitzerischee Aktiengesellschaft (La Société Anonyme Suisse)

SJZ – Schweitzerische Juristen-Zeitung (Revue Suisse de Jurisprudence)

SQ - Sociedade por quotas

Srl - Sociedade de responsabilidade limitada

Temi - Temi (Rivista di giurisprudenza italiana)

WG - Wechselgesetz

ZGR – Zeitschrift für Unternehmens- und Gesellschaftsrecht

ZHR – Zeitschrift für das gesamte Handels- und Konkursrecht/Wirtschaftsrecht

ZPO - Zivilprozesordnung

ZRP – Zeitschrift für Rechtspolitik

ZSR – Zeitschrift für Schweizerisches Recht


NOTA PRÉVIA

O presente trabalho constitui uma análise essencialmente teórica do tema que me proponho tratar – A transmissibilidade das acções -, embora não pretenda ser um mero estudo de ciência jurídica pura. Tomei como base, para esse tratamento, o ordenamento jurídico alemão, porque me pareceu ser aquele que, no tempo de que dispunha, possibilitava o melhor enquadramento da matéria, embora o tratamento mais desenvolvido da matéria, no que respeita às restrições à transmissibilidade, se encontre nos direitos italiano e suíço.

Uma primeira parte (constituída pelo título I) é dedicada, fundamentalmente, à construção técnico-jurídica do fenómeno translativo accionário. Nela se destacam duas ideias chaves: a de que a participação accionária não se identifica com a posição global de sócio e é distinta dos direitos que dela emergem no decurso ou no termo da vida social; e a de que ela é, independentemente do tipo de representação que pode revestir (representação cartular ou representação escritural), um «direito-valor». A justificação para o regime especial de circulação (tutela do adquirente de boa fé) que a doutrina, em geral, lhe reconhece decorre da sua própria função jurídico-económica – ela é, acima de tudo, um instrumento de captação e de mobilização de capitais – e não do título que, tradicionalmente, a documenta.

A segunda parte (títulos II a IV) é relativa, sobretudo, à «dimensão societária» da transmissibilidade. No centro, está aqui a autonomia configuradora da acção como direito de transmissibilidade restrita: o seu fundamento e (sobretudo) os seus limites. Complementarmente, procurará determinar-se a natureza desta autonomia.

N.A.: Procedeu-se a uma ligeira revisão formal do texto original, de 1989, e acrescentaram-se algumas notas de actualização, bem como o índice ideográfico.

Lisboa, Novembro de 2019

Título I

A TRANSMISSIBILIDADE DAS ACÇÕES

COMO

QUESTÃO FUNDAMENTALMENTE TÉCNICO-JÚRIDICA

(Objecto da transmissão)


CAPÍTULO I

DIREITO ALEMÃO

1. No direito alemão(*), a transmissibilidade é hoje unanimemente considerada como uma característica essencial das acções. A análise do seu fundamento, significado e limites, que constitui o tema central deste trabalho, será feita no título II. Antes, porém, importa definir o quid relativamente ao qual a questão da transmissibilidade se põe (§ 1.º) e tratar, ainda que brevemente, do tema da natureza e formas da sua transmissão (§ 2.º). Como, na literatura jurídica germânica, a palavra acção é, no seu significado primordial, sinónimo de MITGLIEDSCHAFT numa sociedade anónima [i] , o estudo destas questões será feito tomando como objecto de análise a própria MITGLIEDSCHAFT em geral.

No direito societário, a palavra Mitgliedschaft (literalmente, qualidade de membro) corresponde à expressão portuguesa participação social (ou socialidade). Como, porém, o vocábulo alemão apresenta um campo de aplicação mais vasto - abrangendo também a qualidade de cooperador e a qualidade de associado, membro de uma associação (cf. o art. 180 do CC) -, optou-se pela utilização do mesmo, sem tradução.

§ 1.º

O B J E C T O D A T R A N S M I S S Ã O

(Teoria da MITGLIEDSCHAFT)

A – A teoria da MITGLIEDSCHAFT em geral

1. Conceito de MITGLIEDSCHAFT

2. O termo MITGLIEDSCHAFT – que, nas sociedades de pessoas, é sinónimo de Gesellschaftsanteil [ii] , nas sociedades por quotas, de Gesch ä ftsanteil [iii] e, nas sociedades anónimas, de Aktie [iv] – é, em geral, definido como a posição de membro numa entidade de tipo associativo, isto é, a posição jurídica que tem uma pessoa enquanto membro de uma entidade deste tipo (die gesamte Rechtsstelung als Mitglied) [v] ; ou, noutra perspectiva, como a soma ou complexo de todos os direitos e vinculações que compõem essa posição de membro [vi] .

a) Nas associações e nas sociedades de pessoas

3. Esta definição traduz com relativa exactidão o fenómeno existente nas associações e nas sociedades de pessoas, onde a MITGLIEDSCHAFT tem uma estrutura personalizada e a cada pessoa corresponde uma posição de membro [vii] . Importa apenas esclarecer que este seu carácter personalístico pode ter dois significados distintos.

Com efeito, ele pode querer dizer que a posição jurídica de sócio ou associado deriva da qualidade de membro atribuída a uma determinada pessoa pelo acto constitutivo ou por um acto subsequente da corporação ou sociedade, sendo, por isso, inconcebível a sua dissociação dessa pessoa e, consequentemente, a sua transmissibilidade. Neste caso, a situação pode caracterizar-se como um verdadeiro “status” [viii] .

Mas o fenómeno pode, igualmente, construir-se de outro modo: em resultado do acto constitutivo ou de um acto de adesão à sociedade ou associação, a pessoa adquire (originariamente) uma posição jurídica que lhe confere a qualidade de membro (sócio ou associado); esta posição jurídica, embora tenha carácter essencial ou predominantemente pessoal, pode representar também um valor patrimonial suficientemente importante para justificar a sua eventual mobilização; a sua dimensão pessoal reflectir-se-á, então, neste caso, nas formas de operar essa mobilização [ix] .

b) Nas sociedades de capitais

4. Nas sociedades de capitais, a situação é algo diferente. Na verdade, a MITGLIEDSCHAFT tem aqui uma base necessariamente capitalística – ela constitui uma posição jurídica correspondente a uma quota ou a uma unidade elementar de capital contributivo, que funciona como seu pressuposto -, embora os interessados possam, no âmbito da autonomia estatuária reconhecida para o tipo, configurar a sociedade e, consequentemente, configurá-la também a ela como mais ou menos personalizada. Este facto obriga, pelo menos, a uma adaptação ou ajustamento da definição geral acima apresentada.

aa) Sociedades por quotas

5. Nas sociedades de responsabilidade limitada (correspondentes às nossas sociedades por quotas), a Geschäftsanteil (parte do negócio social ou participação no negócio social) é a posição jurídica correspondente a uma quota de capital. Originariamente, é investido nessa posição quem subscreve tal quota; durante a vida da sociedade, uma pessoa pode tornar-se titular de várias ou até de todas as Geschäftsanteilen de uma sociedade, quer em resultado da subscrição de novas quotas de aumento do capital, quer por aquisição derivada de quotas dos outros sócios, mantendo elas a sua autonomia [x] .

Resulta daqui (ou pode inferir-se daqui) que a qualidade de um membro deriva da titularidade de uma Geschäftsanteil MITGLIEDSCHAFT de base capitalística e legalmente configurada como objecto do tráfico jurídico (§ 15 GmbHG) – e que a posição global do sócio (ou membro da corporação) não coincide necessariamente com a Geschäftsanteil.

bb) Sociedades anónimas

I. 6. Mas é nas sociedades anónimas que a necessidade de ajustamento da noção geral de MITGLIEDSCHAFT é mais evidente.

A acção é, com efeito, como se verá melhor adiante, a posição jurídica correspondente a uma das frações ou unidades em que se divide abstractamente o capital social. Originalmente, é investido na sua titularidade quem subscreve uma destas unidades, sendo normal que uma pessoa subscreva mais que uma, tornando-se, assim, titular de várias MITGLIEDSCHAFTEN. A qualidade de membro resulta da titularidade de, pelo menos, uma acção (ou MITGLIEDSCHAFT). A MITGLIEDSCHAFT não coincide, portanto, com a posição global do membro.

Resulta daqui a necessidade de reformular a definição clássica de MITGLIEDSCHAFT nos seguintes termos: MITGLIEDSCHAFT é a posição ou cada uma das posições de membro numa entidade de tipo associativo, ou, noutra perspectiva, a soma ou complexo de todos os direitos e vinculações que compõem essa posição ou cada uma dessas posições de membro.

II. 7. Mais importante, porém, do que esta questão terminológica ou conceptual é a de saber se a noção de acção ou MITGLIEDSCHAFT traduz cabalmente o fenómeno da posição jurídica do sócio na sociedade anónima (ou seja, a posição jurídica que o mesmo detém no âmbio ou no quadro de uma organização societária deste tipo).

Como acaba de ver-se, a posição jurídica global do membro da corporação é distinta da acção. O facto não teria, no entanto, implicações materiais se essa posição global fosse o mero resultado da soma das várias posições accionárias. Não parece, porém, que seja assim. Basta pensar na possibilidade de confinar o direito de voto de cada accionista dentro de certo limite, independentemente do número de acções de que seja titular [cf. o §134 (1) AktG], na existência de direitos cuja titularidade ou, pelo menos, o exercício dependem de certo número de acções [cf. os §§ 121 (2) e 122 AktG], etc., para ver que o sócio tem uma posição na sociedade – i. e., no âmbito da organização societária – que não coincide (necessariamente) com a soma das MITGLIEDSCHAFTEN de que é titular [xi] .

2. A MITGLIEDSCHAFT como posição numa relação jurídica fundamental

a) A MITGLIEDSCHAFT como relação jurídica, rectius, como posição numa relação jurídica fundamental (conteúdo)

8. A MITGLIEDSCHAFT é, de acordo com o que acaba de ver-se, a posição que tem o sócio ou associado na relação jurídica que o liga à sociedade ou associação a que pertence (e aos demais sócios ou associados).

Nas associações e sociedades de pessoas, essa relação é uma só e constitui-se, originariamente, em consequência da participação daquele sócio ou associado no próprio acto constitutivo da entidade de que é membro ou em virtude de um posterior acto de adesão. Nas sociedades por quotas e nas sociedades anónimas, a relação surge, originariamente, como consequência da subscrição de uma quota ou de uma unidade de capital, com a inscrição da sociedade ou de um aumento de capital no registo comercial (antes do registo, haverá uma SQ ou SA em formação) – e uma mesma pessoa pode ter várias MITGLIEDSCHAFTEN, isto é, estar ligada à sociedade por uma multiplicidade de relações jurídicas (ou por uma relação jurídica global, fundada numa pluralidade de MITGLIEDSCHAFTEN).

9. Esta «relação jurídica» tem como conteúdo aquele conjunto de direitos (de natureza patrimonial e administrativa) e vinculações que cabem ao sócio ou associado enquanto tal [xii] . Desta relação jurídica fundamental, de carácter social ou corporativo, e dos direitos que a compõem (MITGLIEDSCHAFTSRECHTE) são de distinguir, em especial no caso das sociedades, aqueles direitos de carácter patrimonial (créditos: Gl ä ubigerrechte) que, por um acto da sociedade (v.g., a deliberação de distribuir dividendos ou de dissolver a sociedade e liquidar o seu património), dela se destacam, adquirindo existência autónoma [xiii] .

Na realidade, a doutrina identifica a MITGLIEDSCHAFT, correntemente, com a própria relação jurídica (Rechtsverh ä ltnis) societária ou associativa [xiv] . HADDING critica, porventura não sem razão, esta identificação: a relação jurídica estabelece-se entre o membro e a entidade a que ele pertence (e porventura entre os membros); o sócio (ou associado) tem apenas uma posição de parte (Stellung als Beteiligter) nessa relação jurídica e é esta posição que constitui a MITGLIEDSCHAFT; tal como não se pode identificar a posição do comprador (ou do vendedor) com a relação jurídico-obrigacional decorrente do contrato de compra e venda, assim também não pode identificar-se a MITGLIEDSCHAFT com a relação jurídica que se estabelece entre uma (sociedade ou) associação e os seus membros [xv] .

b) A MITGLIEDSCHAFT como unidade indivisível (ou incindível)

10. A MITGLIEDSCHAFT é, segundo a doutrina dominante (cf.infra, § 2), uma posição jurídica unitária (eine einheitliche Rechtstellung). Ela constitui uma unidade indivisível (ou incindível), não podendo, portanto, haver uma dissociação (e transmissão autónoma) dos elementos que a compõem [xvi] . A lei estabelece expressamente a sua indivisibilidade no caso das acções [xvii] .

Esta regra da indivisibilidade (ou incindibilidade) da MITGLIEDSCHAFT não obsta, naturalmente, à transmissão ou oneração de direitos patrimoniais já autonomizados ou que o devam vir a ser (Gläubigerrechte), neste último caso, na qualidade de direitos futuros [xviii] . É de notar, porém, que o cessionário destes direitos futuros tem, em geral, uma posição precária, dado que o titular da MITGLIEDSCHAFT continua a poder dispor dela e a cessão daqueles não é oponível ao adquirente desta [xix] .

A indivisibilidade é também compatível com os fenómenos da contitularidade, da alienação fiduciária, da cessão da legitimação no caso das acções [xx] , e com a celebração de contratos com mera eficácia obrigacional relativos a um ou mais direitos singulares [xxi] .

c) A MITGLIEDSCHAFT como direito subjectivo

11. Especialmente controvertida é a questão de saber se a MITGLIEDSCHAFT, isto é, a posição jurídica de sócio ou associado, é susceptível de ser qualificada ou não, em geral, como direito subjectivo (isto é, como Mitgliedschaftsrecht) [xxii] . No caso das acções, esta qualificação é corrente, embora os autores não indiquem, em regra, as razões que a fundamentam [xxiii] .

Segundo WIEDEMANN, a MIGLIEDSCHAFT seria – tal como acontece com outros direitos (direitos de propriedade, ou sobre bens imateriais) – um Mutterrecht (direito-pai/mãe), do qual decorreriam para o sócio ou associado podres jurídicos singulares(einzelne Rechtsbefugnisse), também qualificados como Tochterrechte (direitos-filhos/as) [xxiv] . Para HADDING, esta maneira de ver as coisas não seria, no entanto, aceitável, já que de um direito, mesmo chamado de «Mutterrecht», não poderiam nascer outros direitos e deveres de conteúdo diferenciado [xxv] .

É de referir ainda que – além da visão da MITGLIEDSCHAFT como posição jurídica ou direito fundamental, originário, etc., do qual derivam para o seu titular posições jurídicas mais simples susceptíveis de serem qualificadas como direitos derivados – é possível ver o fenómeno como uma posição jurídica ou direito complexo, englobando um conjunto de direitos singulares, poderes, ónus e vinculações [xxvi] .

Isto mostra que não está aqui em causa apenas a compreensão do fenómeno da MITGLIEDSCHAFT, mas sobretudo a noção de direito subjectivo, noção esta cujo aprofundamento não cabe nos limites deste trabalho.

3. A MITGLIEDSCHAFT como posição jurídica de carácter social ou corporativo

a) A questão da classificação da MITGLIEDSCHAFT nas sociedades de pessoas (societas versus Gesamthand)

12. Considerando a MITGLIEDSCHAFT como uma relação jurídica ( rectius, como uma posição numa relação jurídica), surge ainda a questão de saber se esta é de classificar como uma relação jurídica obrigacional (e, neste caso, como uma relação contratual, sinalagmática ou não) ou como uma relação jurídica de um tipo especial (social ou corporativo, utilizando esta palavra num sentido amplo). O problema tem-se posto com relação às sociedades de pessoas (desprovidas de personalidade jurídica) e tem sido resolvido diferentemente pelos autores. Esta divergência de opiniões decorre, em grande parte, do facto de os autores adoptarem, sobretudo no que se refere às sociedades civis, diferentes construções acerca do fenómeno societário e, consequentemente, da MITGLIEDSCHAFT, o que torna impossível um completo esclarecimento, aqui, desta questão. Para os fins deste trabalho, basta, porém, referir que a doutrina hoje dominante considera que mesmo a sociedade civil é em geral irredutível a um fenómeno de carácter obrigacional e que, na literatura contemporânea, é visível uma tendência no sentido de conceber a MITGLIEDSCHAFT como uma figura unitária do direito associativo privado de carácter social ou corporativo [xxvii] .

13. Na verdade, entendendo, nas sociedades de pessoas, a MITGLIEDSCHAFT como uma posição de membro na sociedade enquanto grupo ou colectividade, a sua dimensão essencialmente corporativa torna-se patente: ela traduz, no essencial e em primeiro lugar, uma relação de participação do sócio na fortuna (é uma forma de afectação do valor da empresa social) e na vida da sociedade; só num plano secundário (como seu pressuposto) aparecem as obrigações relativas à formação (e, eventualmente, manutenção) da sua base patrimonial e ao exercício da actividade social, bem como a sujeição legal ao risco de má fortuna de empreendimento colectivo e outras obrigações, ónus e deveres laterais.

14. Mas, mesmo vendo o fenómeno societário (nas sociedades desprovidas de personalidade jurídica) como comunhão de mão comum e aceitando a concepção clássica acerca desta, é claro que a MITGLIEDSCHAFT não pode reduzir-se a uma pura relação obrigacional. Na realidade, sobretudo no caso das sociedades comerciais, a MITGLIEDSCHAFT aparece até frequentemente identificada com a parte ou quota do património social que caberia a cada sócio [xxviii] . Esta identificação é, pelo menos se levada à letra, manifestamente inadequada naqueles casos em que, como pode acontecer nalgumas sociedades civis, o património social não existe ou é insuficiente; e, mesmo quando a sociedade leva a cabo uma actividade empresarial, assente numa importante base patrimonial, ela é o reflexo de uma visão parcial e estática do fenómeno societário, que não pode ser reduzido ao património comum e às relações dos sócios relativas a esse património. Ela tem, no entanto, o mérito de pôr em evidência que (dentro dos quadros da concepção clássica) existe, tipicamente, no âmbito da sociedade, uma comunhão de bens e que a posição jurídica do sócio representa (embora não se reduza a isso) uma posição nessa comunhão [xxix] .

b) A MITGLIEDSCHAFT como direito corporativo

15. Entre os defensores da MITGLIEDSCHAFT como direito subjectivo – um Mutterrecht, Quellrecht ou Stammrecht, do qual derivam Tochterrechte ou Folgerechte [xxx] e deveres – parece hoje não haver dúvidas de que se trata de um direito simultaneamente de carácter patrimonial e “pessoal”, variando o peso relativo destes dois elementos em função da estrutura da sociedade ou associação – (mais) capitalística ou (mais) pessoal – a que o direito se reporta [xxxi] .

Este direito não é recondutível, nem aos direitos reais, nem aos direitos de crédito: é um direito social ou corporativo (Mitgliedschaftsrecht) [xxxii] , objecto de tutela jurídico-corporativa (ou jurídico-societária) no âmbito da corporação (ou sociedade) e de tutela absoluta como “sonstiges Recht” (§ 823 (1) BGB) nas relações externas [xxxiii] .

c) A MITGLIEDSCHAFT nas sociedades como direito-valor (WERTRECHT)

16. Salientando a sua dimensão patrimonial, a MITGLIEDSCHAFT pode também, sobretudo nas sociedades de capitais, ser qualificada como um direito-valor (WERTRECHT), na medida em que constitui uma técnica de afectação do valor do património (ou da empresa) social [xxxiv] .

B - A acção como MITGLIEDSCHAFTSRECHT (direito corporativo) e como WERTRECHT (direito-valor)

1. Conceito de acção

17. Segundo RENAUD [xxxv] , a palavra acção é usada em três sentidos. Ela significa, em primeiro lugar, uma unidade, parte ou fracção do capital social(Theil des Grundcapitals, Bruchtheil des Stammcapitals) de uma sociedade anónima. É este o significado da palavra, nomeadamente, quando se diz que, na sociedade anónima, “o capital social é dividido em acções” [xxxvi] .

Em segundo lugar, o vocábulo acção significa o direito correspondente àquela unidade ou fracção do capital social (Actienrecht, Vereinsmitgliedschaftsrecht) [xxxvii] .

Finalmente, a acção significa o título que documenta o direito (Actienbrief, Actienurkunde, Actienschein, Theilnahmeschein, Anteilschein) [xxxviii] .

A literatura de língua alemã aceita, em geral, esta tese do tríplice significado da acção [xxxix] . Para a caracterização da acção como figura do direito privado só interessam, no entanto, os dois últimos. Só estes são, portanto, aqui objecto de análise.

2. A acção como direito corporativo e como direito-valor

18. A acção é (essencialmente) um direito corporativo (Mitgliedschaftsrecht) – que, no direito alemão, é, por imperativo legal, susceptível de ser documentado por título de crédito -, tendo este conceito a sua origem na Holanda, no começo do séc. XVII [xl] .

a) Origem

19. Inicialmente, era um direito exclusivamente patrimonial: um direito ao dividendo e à soma dada como entrada. Só mais tarde os accionistas vieram a ter faculdades de carácter administrativo, tornando-se a acção um direito corporativo (Mitgliedschaftsrecht) [xli] .

b) No pensamento de RENAUD

20. Para RENAUD, a acção, neste sentido, significava o direito adquirido como contrapartida do pagamento ou da promessa de pagamento de uma das partes, fracções ou unidades em que o capital social de uma sociedade anónima se divide [xlii] . No seu conteúdo geral, ele é, para este autor, o direito a ser reconhecido como membro da “associação” (Vereinsmitgliedschaftsrecht), decorrendo desta qualidade de membro (ou accionista) uma série de direitos (ou pretensões), entre os quais se contam, em regra, numa sociedade de fim lucrativo, o direito de participar em eventuais lucros da sociedade, no activo de liquidação, nas deliberações sociais, etc. Este direito não traz consigo qualquer obrigação. Ele é contrapartida de uma unidade de capital, realizada ou simplesmente prometida; a obrigação de realizar essa unidade de capital (obrigação de entrada) não é emanação do direito: ela apenas fundamenta a aquisição deste pelo seu subscritor [xliii] .

c) No pensamento jurídico moderno

21. Actualmente, a acção significa - dominantemente - a posição jurídica correspondente a cada uma das unidades em que se divide o capital social de uma sociedade anónima (MITGLIEDSCHAFT), compreendendo não só direitos, mas também obrigações [xliv] .

Esta posição jurídica é qualificada correntemente, como se disse acima, como um direito subjectivo de carácter corporativo [xlv] . Mas, diferentemente do que acontece com outros Mitgliedschaftsrechte, o direito accionário – segundo alguns autores mesmo quando não está “materializado” num título de crédito – é ainda – utilizando a expressão num sentido mais específico do que aquele que foi referido acima – um direito-valor (WERTRECHT) [xlvi] , realçando esta qualificação não só a sua natureza essencialmente patrimonial, mas também o seu carácter despersonalizado e o seu valor de troca.

aa) A acção como direito corporativo

I. 22. À semelhança do que já acontecia nas leis anteriores [xlvii] , o § 1 (2) da AktG (de 1965) estabelece como um dos princípios caracterizadores da sociedade anónima o da divisão do capital em acções [xlviii] . De acordo com este princípio, a cifra (valor nominal) do capital social é dividida em unidades de valor (nominal) determinado (cf. o § 6 AktG), chamadas acções [xlix] .

Como já se assinalou, a cada uma destas unidades de valor corresponde um direito (Mitgliedschaftsrecht) ou posição jurídica na sociedade (MITGLIEDSCHAFT). Tendo cada um dos vários Mitgliesdchaftsrechte (ou Mitgliedschaften) um fundamento patrimonial autónomo, eles são independentes uns dos outros e da pessoa do titular [l] . Daí que um accionista possa ter, como também já se referiu mais acima, vários Mitgliedschaftesrechte (ou Mitgliedschaften), ou possa tê-los até todos, que a sociedade possa adquirir as suas próprias acções (cf. o § 71 AktG), que estas sejam, em princípio, livremente transmissíveis, possam ser representadas por títulos de crédito à ordem e ao portador, etc. [li] .

II. 23. Do que acaba de escrever-se, pode facilmente concluir-se que a palavra MITGLIEDSCHAFT só pode traduzir-se satisfatoriamente por “posição de membro” e o vocábulo Mitgliedschaftsrecht, por “direito social ou corporativo”. As expressões “qualidade de membro”, “condição de membro” – utilizadas por autores de língua latina para traduzirem aquele termo alemão -, evocando uma ligação à pessoa e sugerindo a ideia da unicidade da qualidade ou condição, traduzem mal o significado que a MITGLIEDSCHAFT(-acção) tem no pensamento jurídico alemão [lii] .

III. 24. O direito accionário (tal como acaba de ser caracterizado) nasce com o registo da sociedade ou do aumento de capital no registo comercial [liii] . Com efeito, é com este que a sociedade anónima surge como tal – isto é, como entidade dotada de personalidade jurídica e com o capital dividido em acções – e o aumento de capital se torna eficaz; só nessa altura surge entre a sociedade e os membros, com relação a cada uma das unidades em que se divide o capital social, uma relação jurídico-corporativa; antes disso, existem apenas “direitos de parte/participação” (Anteilsrechte) numa sociedade em formação (dita Vorgesellschaft, Gründungsgesellschaft), à qual não se aplica a lei das sociedades anónimas (cf. o § 41 (1) e (4) AktG) [liv] , ou correspondentes à parte do aumento de capital subscrita (cf. os §§ 189 e 191 AktG) [lv] .

bb) A acção como direito-valor

I. 25. A acção é um direito fungível, susceptível de ser documentado por um título de crédito à ordem ou ao portador [lvi] . Esta titulação tornou-o um direito especialmente apto para o tráfico e, em particular, para o mercado de capitais. A AktG parte do pressuposto de que ele é, pelo menos normalmente, titulado, embora possa, na realidade, não o ser - sem que esta falta de título impeça a sua circulação, de acordo com regras relativas à transmissão dos direitos em geral (§§ 398 ss/413 BGB) [lvii] .

O título parece ser, no entanto, legalmente, necessário, quer para a submissão do direito – sobretudo no que se refere à sua transmissão – a regras próprias ou análogas às do direito das coisas (nomeadamente, a da tutela do adquirente de boa-fé), quer para a sua qualificação como valor mobiliário, de que depende, nomeadamente, a sua circulação pelas formas do direito bancário previstas na Depotgesetz (lei relativa ao depósito de valores mobiliários: cf. o § 1 (1) e os §§ 18 (3) e 24 DepotG). A doutrina dominante é neste sentido [lviii] .

II. 26. Na prática, acontece, porém, que o título deixou, em geral, de cumprir a função que historicamente desempenhou de instrumento de transmissão e exercício do direito nele documentado: a grande maioria dos títulos está imobilizada nos bancos de depósitos de valores mobiliários (ditos Wertpapiersammelbanken): o tráfico de valores mobiliários é um tráfico “desmaterializado " (stükenlos) : nem a transmissão, nem sequer o exercício do direito dependem do título [lix] . Esta situação deu origem a um movimento doutrinal no sentido do alargamento do conceito tradicional de valores mobiliários, de forma a abranger igualmente direitos não titulados que, pela sua função económica e de acordo com a perspectiva que deles tem o tráfico, se lhes equiparam. Ao lado dos valores mobiliários titulados ( Briefeffekten) teríamos, assim, uma categoria de valores mobiliários que podem designar-se como escriturais (Bucheffekten) [lx] .

Na origem deste movimento parece estar OPITZ, considerado como um fundador da chamada teoria do direito-valor (Wertrechtslehre) [lxi] . Segundo CANARIS, deve considerar-se como tal um direito não titulado que cumpre uma função idêntica à de um valor mobiliário tradicional [lxii] , e ao qual são de aplicar, por isso, analogicamente, as disposições do direito das coisas e da Depotgesetz que se lhe aplicariam, directamente, se ele estivesse documentado por um título de crédito [lxiii] . Um destes direitos é o direito accionário.

3. O título accionário

27. O direito accionário é, como se disse, susceptível de ser documentado por um título de crédito e, se bem que, em grande medida, este tenha deixado de desempenhar, na prática, o papel que já teve no exercício e transmissão daquele, a lei ainda continua a considerá-lo como um fenómeno normal e a utilizar a palavra acção para designar, quer o direito, quer o título accionário (cf. por ex., o § 10 AktG e o §1 (1) DepotG). Mais: segundo as concepções dominantes, tratando-se de um título à ordem ou ao portador, na na respectiva circulação por tradição ou endosso, o que se transmite é o título; não a Mitgliedschaft, que segue aquele ou cabe a quem dele se torna titular. Importa, por isso, fazer uma breve análise do mesmo [lxiv] .

A acção é legalmente um título à ordem ou ao portador (§ 10 AktG), concebido para circular; ou, noutra perspectiva, a ação-Mitgliedschaft está incorporada num título de alguma destas espécies. De acordo com a doutrina dominante, os interessados não podem configurá-lo, através de uma cláusula não à ordem (Rektaklausel), como um título nominativo ou de legitimação direta (Rektapapier), isto é, excluir, no caso da acção nominativa, a transmissão por endosso [lxv] .

O título tem natureza meramente declarativa [lxvi] , podendo não existir [lxvii] , e, quando existe, não só não é «veículo» necessário da transmissão do direito [lxviii] , como nem sequer é, hoje em dia, numa grande parte dos casos (cf. supra, o que se disse acerca da transmissão desmaterializada), o veículo normal dessa transmissão [lxix] . Pode, portanto, afirmar-se que, actualmente, o título está, em relação ao direito accionário, num plano meramente secundário [lxx] . Enquanto não for plenamente reconhecida, porém, a figura dos valores mobiliários escriturais, o accionista continua a ter um relevante interesse em que o seu direito seja titulado, interesse que a lei tutela reconhecendo-lhe implicitamente um direito inderrogável ao título, isto é, insusceptível de ser afastado pelos estatutos [lxxi] .

a) Acções ao portador e acções nominativas

28. As acções ao portador impuseram-se de tal modo na prática, que a actual lei, na sua versão inicial, as consagrou expressamente como regra (§ 24 (1) AktG, na sua redacção original). Hoje, os fundadores devem indicar nos estatutos se as acções hão-de ser nominativas ou ao portador [§ 23 (3).5 AktG] [lxxii] .

As acções nominativas são, legalmente, títulos à ordem [geborene Orderpapiere: cf. o § 68 (1) AktG [lxxiii] ], sendo permitido o endosso em branco, o que lhes confere uma transmissibilidade, em certa medida, equiparável à das acções ao portador e torna o título apto para o tráfico na bolsa [lxxiv] . Neste tipo de acções, o título não legitima o accionista para o exercício dos direitos sociais; este é legitimado pela sua inscrição no livro das acções (§ 67 AktG) [lxxv] . Habilita-o, no entanto, a exercer o seu direito à inscrição neste livro [lxxvi] .

O principal interesse da admissibilidade legal de documentar o direito accionário por dois modos distintos – a acção ao portador e a acção nominativa – tem a ver com a organização e tutela do seu tráfico: a acção nominativa visa, em primeira linha, alertar o adquirente para o facto de que a escolha deste tipo de acção poderá significar, ou que ela não está ainda completamente liberada, ou que lhe é inerente uma obrigação de prestações acessórias, ou ainda que o seu regime de transmissibilidade (legalmente, livre transmissibilidade) foi modificado pelos estatutos (isto é, que o direito é de transmissibilidade restrita) [lxxvii] .

b) A acção na teoria geral dos títulos de crédito

29. Dada a importância que o título accionário desempenhou na prática e ainda desempenha no sistema legal, é conveniente (tendo em conta aquelas que me parecem ser as tendências da doutrina contemporânea mais significativa) passar em revista alguns conceitos e princípios da teoria geral dos títulos de crédito, começando pela própria noção destes e pelo postulado em que todo o sistema assenta: o da indissociabilidade da titularidade do direito e do título.

aa) Noção de título de crédito. O postulado da indissociabilidade da titularidade do direito e do título

A doutrina alemã hoje dominante define o título de crédito (Wertpapier) como um documento que certifica ou tem inscrito de tal modo um direito (privado), que a posse daquele é necessária para o exercício deste [lxxviii] . A sorte do direito está, assim, estreitamente ligada à do título, na medida em que o exercício daquele depende da posse de documento. Por outro lado, é o direito documentado que dá valor económico ao título; sem ele, este seria uma simples folha de papel. Eles formam, por isso, uma unidade económica.

Daqui decorre que quem é titular do direito documentado deve, pelo menos em princípio, sê-lo também do documento e vice-versa, ou, noutros termos, a titularidade do direito que decorre do título(das Recht aus dem Papier) e a do direito sobre o título (das Recht am Papier) devem ser de uma única pessoa [lxxix] . Tomando como ponto de partida a construção que a doutrina dominante faz do fenómeno translativo dos títulos de crédito, este resultado pode ser atingido de duas maneiras: ou através da regra de que o direito segue o título (das Recht aus dem Papier fogt dem Recht am Papier); ou aplicando o princípio contido no § 952 BGB, segundo o qual o título segue o direito nele documentado (das Recht am Papier folgt dem Recht aus dem Papier) [lxxx] .

A primeira regra é característica dos títulos à ordem e dos títulos ao portador; a segunda, dos títulos nominativos (Rektapapiere) [lxxxi] . No texto a seguir, far-se-á uma breve análise do significado de tais regras e do seu campo de aplicação, em especial da primeira, que é aquela que mais directamente se prende com o tema deste trabalho. Mas, como esta é apenas uma fórmula didáctico-interpretativa destinada a traduzir aquilo que o fenómeno da circulação dos títulos à ordem e ao portador tem de característico, torna-se imprescindível estender esta análise à própria transmissão em si deste tipo de títulos. Duas questões merecem uma referência particular: a de saber se é possível transmitir um título circulante por cessão do direito nele documentado e a de saber se para esta cessão vigora ou não o princípio da tradição.

bb) Função dos títulos de crédito à ordem e ao portador. A questão das suas formas de circulação e a regra de que o direito segue o título

30. Num ambiente jurídico caracterizado, no domínio patrimonial, pela contraposição entre direito real e direito de crédito, os títulos de crédito à ordem e ao portador surgiram como um instrumento técnico-jurídico destinado a conferir a certos direitos não reais uma aptidão para circular equiparável à da propriedade mobiliária [lxxxii] . Através da sua documentação num título desta natureza, o direito entrou, de certo modo, no universo das coisas móveis, ficando sujeito às formas e ao regime de transmissão destas, ainda que, no caso dos títulos à ordem, com as alterações impostas pela natureza do título. Este resultado foi, no século XIX, traduzido e justificado pela doutrina germânica dominante através da ideia de incorporação (Verkörperung) do direito (entidade imaterial) no documento (coisa móvel, entidade tangível) [lxxxiii] . Abstraindo das diferentes construções doutrinais existentes, pode dizer-se que, para a doutrina dominante, a incorporação traduz num determinado âmbito de conexão existente entre o direito e o documento, variável consoante o título, uma dependência do primeiro em relação ao segundo [lxxxiv] .

31. Aqui interessa-nos, essencialmente, a questão de saber se essa dependência existe, necessariamente, na transmissão do direito e qual o seu significado. Para a doutrina tradicional, a resposta é afirmativa no caso dos títulos circulantes (Umlaufpapiere), isto é, nos títulos à ordem e ao portador (I). A questão deixou, porém, de ser pacífica, desde que, em 1974, ZÖLLNER publicou o seu estudo Die Zurückdrängung des Verkörperungselements bei den Wertpapieren (II). O recuo do elemento corpóreo nos valores mobiliários, traduzido, essencialmente, na desmaterialização da sua circulação, veio, com efeito, pôr em evidência que a alegoria da incorporação, do documento-portador (Träger) ou veículo de circulação do direito e daquilo a que poderia chamar-se a «satelitização técnico-jurídica» (embora não substancial) deste direito, para além de ter impedido a construção do sistema em bases mais racionais e de ter levado a resultados não justificados pela função do título, está em flagrante contradição com a realidade. Uma revisão de fundo da matéria, tanto quanto é do meu conhecimento, falta ainda, e não é este o momento nem o local apropriado para o fazer. Creio, no entanto, ser possível e conveniente uma breve reflexão sobre o assunto (III).

I. 32. Segundo a doutrina (tradicional) dominante, a incorporação de um direito num título à ordem ou ao portador tem como consequência a necessidade do documento para a sua transmissão. A sua titularidade passa a ser definida pela propriedade do papel, que, tecnicamente, constitui o centro do fenómeno translativo, embora o documento não tenha, em si mesmo, qualquer valor [lxxxv] : tal propriedade é «das Zuständigkeitbestimmende Recht» [lxxxvi] . Aquele fenómeno translativo desloca-se, assim, por força da documentação ou incorporação, do direito das obrigações (cessão) para o direito das coisas (transmissão segundo os §§ 929 ss BGB) [lxxxvii] . Para traduzir esta situação, diz-se que o título é portador (Träger) do direito, veículo da sua circulação, que a transmissão deste se dá através da transmissão daquele, e que o direito segue o título (das Recht aus dem Papier folgt dem Recht am Papier) [lxxxviii] .

32. No fundo, o resultado da incorporação é, de acordo com esta perspectiva das coisas, uma espécie de «satelitização» do direito no tráfico jurídico. Embora o valor do título de crédito resida no direito nele documentado, é o documento que, por razões técnico-jurídicas, aparece como objecto deste tráfico; o direito acompanha-o (ocorrendo uma certa inversão metodológica, relativamente à ordem natural das coisas).

Mesmo quando há uma aproximação da realidade e se afirma que a transmissão do papel abrange também a do direito nele inscrito (cf. JACOBI, p. 342 ss), evitando-se a ideia do direito-satélite do documento, é o primeiro que está no centro. O direito como que qualifica o papel que o documenta, dando-lhe valor económico, passando este a constituir uma coisa móvel (que já era) com valor. É esta e não o direito em si que constitui o objecto das transacções. Daí a aplicação do regime da transmissão das coisas móveis.

A situação pode explicar-se recorrendo à ideia de fusão-absorção do direito pelo documento, no âmbito da transmissão. O fenómeno pode ainda construir-se do seguinte modo: embora continuem a ser entidades distintas, o direito e o papel passam, em virtude da incorporação, a representar, no âmbito da conexão própria do título, uma figura jurídica unitária (ein einheitliches Rechtsgebilde), em que o direito é, internamente, determinante, mas em que domina, externamente, o documento, o que faz com que a titularidade daquele seja definida pela propriedade deste e ambos circulem (como um todo unitário) segundo as regras das coisas móveis, a que o documento pertence apesar da incorporação, embora sujeitas a desvios resultantes da presença do direito [lxxxix] .

33. Note-se, contudo, que, embora o facto tenha – que eu saiba – passado até aqui sem qualquer reparo especial, na realidade, para a doutrina tradicional, a dependência do direito em relação ao título, no âmbito da transmissão (voluntária, a título singular), não tem o mesmo significado nos títulos à ordem e nos títulos ao portador. Com efeito, nestes últimos, a única forma de transmissão admitida (salvo o caso de existir lei especial que acrescente outras formas, como acontece, no caso dos valores mobiliários, com a Depotgesetz) é aquela que vem prevista nos §§ 929 ss BGB para a propriedade das coisas móveis, com exclusão, portanto, da forma de transmissão própria do direito, isto é, que ele teria se não estivesse titulado [xc] . Diferentemente, nos primeiros, além da forma de transmissão cartular, admite-se também a cessão do direito neles documentado [xci] .

34. Os interessados podem, assim, optar: ou por aquela forma de transmissão (cartular), funcionando o título como veículo da circulação do direito, como acontece nos títulos ao portador, e aplicando-se regras inspiradas, em grande parte, no regime das coisas móveis (ou, noutra perspectiva, aplicando-se este regime com as adaptações impostas pela natureza do título); ou pela cessão do direito. Neste caso, diz-se que, tal como acontece com os títulos nominativos ou de legitimação directa(Rektapapiere), o documento segue o direito (das Recht am Papier folgt dem recht aus dem Papier), de acordo com o disposto no § 952 BGB [xcii] . Decorre daqui que, diferentemente do que acontece com os títulos ao portador, o título, sendo veículo possível, não é veículo necessário do direito. Mas a transmissão depende, em qualquer caso, do documento: mesmo tratando-se de cessão, como esta acarreta, legalmente, a transmissão daquele (§ 952 BGB), segundo as regras gerais de transmissão das coisas móveis, o mero acordo é insuficiente; mesmo para transmitir o direito é necessária a entrega do papel (ou equivalente) [xciii] .

35. A conclusão que se extrai desta doutrina é a de que os títulos ao portador representam um grau de incorporação mais acabado do que os títulos à ordem. Os primeiros, apesar da incorporação do direito (que lhes dá valor), são vistos como puras coisas móveis; ou são, pelo menos, tratados como tal [xciv] . Nos segundos, já o mesmo não pode, em boa verdade, afirmar-se, uma vez que se admite poder o direito neles documentado ser objecto autónomo do tráfico, circulando segundo o regime próprio dos direitos da sua espécie, embora modificado pela presença do título. Eles estarão, assim, num estado intermédio, entre os títulos ao portador e os títulos nominativos ou de legitimação directa [xcv] .

II. 36. Esta não é, contudo, a única perspectiva das coisas. A posição da doutrina tradicional tem vindo a ser rejeitada, no todo ou em parte, por um número crescente de autores, que são, aliás, os mais ou, pelo menos, dos mais representativos do pensamento jurídico germânico contemporâneo, em matéria de títulos de crédito. Assim, admitem a cessão do direito documentado em título ao portador ZÖLLNER, HEFERMEHL e CANARIS [xcvi] . A propriedade do documento passará, neste caso, para o adquirente do direito, de acordo com o disposto no § 952 BGB [xcvii] .

37. No que se refere à questão da necessidade ou não da tradição para ceder o direito (documentado por título à ordem ou ao portador), é ainda maior o número de autores que, na esteira da doutrina dominante para os títulos nominativos ou de legitimação directa [xcviii] , afirmam, em todos ou pelo menos nalguns casos, a desnecessidade dessa tradição [xcix] , apesar de ela fazer parte do sistema geral de transmissão das coisas móveis. Vários argumentos são invocados em defesa desta tese. Em primeiro lugar, a cessão é uma forma de transmissão distinta da transmissão do direito das coisas, não havendo razão pelo menos naqueles casos em que o elemento corpóreo sofreu um nítido recuo (cf., supra, o caso das acções), para sujeitar aquela ao princípio da tradição [c] . [ci]

Em segundo lugar, os interesses em causa não seriam de molde a justificar tal modificação do regime da cessão [cii] . Finalmente, o facto de o título ser necessário para o exercício do direito nele documentado constitui uma questão distinta daquela que está aqui em discussão, e que consiste em saber se ele o deve ser também para a transmissão; o adquirente é que deve ajuizar da conveniência ou não de adquirir a titularidade sem o papel (de que depende o futuro exercício do seu direito) e de correr o risco de a sua titularidade poder vir a ser preterida em caso de conflito com a de adquirente de boa-fé empossado do título [ciii] .

III. 38. Justifica-se uma breve reflexão crítica acerca da posição da doutrina dominante. Antes, porém, importa enunciar sumariamente as conclusões que resultam da sua análise. São elas:

1ª Os títulos ao portador só são transmissíveis segundo as formas e o regime da propriedade mobiliária, isto é, mesmo documentando um direito de outra espécie que lhes dá o valor económico que têm, são tratados, no tráfico jurídico, como puras coisas móveis (corpóreas).

2ª Os títulos nominativos (ou de legitimação directa) só são transmissíveis por cessão do direito neles inscrito. Não são, portanto, tratados, no tráfico jurídico, como coisas autónomas, mas como direitos aos quais está ligado (ou anexado) o documento de que depende o seu exercício.

3ª Os títulos à ordem são, basicamente, transmissíveis por uma e outra forma, ou seja, comportam-se no tráfico, ora como coisas móveis, ora como direitos aos quais está anexado o documento de que depende o seu exercício.

4ª Sendo o título transmitido por cessão, o que acontece nos títulos nominativos e pode acontecer nos títulos à ordem, a tradição é necessária neste caso, mas não naquele.

39. Destas conclusões interessam-nos duas, a primeira e a quarta. Em causa estão, portanto, as seguintes questões: pode o direito documentado num título ao portador ser transmitido por cessão? Para transmitir por cessão um direito documentado em título circulante, é necessária a tradição do documento?

i) De acordo com a doutrina tradicional, as características do título ao portador podem assim sintetizar-se: 1) o documento é necessário tanto para o exercício, como para a transmissão do direito nele inscrito, o que significa uma relação de dependência deste face àquele no âmbito do exercício e da transmissão; 2) o direito representado no título transmite-se por simples tradição deste (rectius: por acordo translativo mais entrega do documento, ou acto equivalente, nos termos dos §§ 929 ss BGB); 3) a legitimação para o exercício do direito depende da simples posse do título. O título à ordem tem as mesmas características, apenas com as diferenças que se seguem: quanto à segunda, a transmissão dá-se por tradição do título endossado; quanto à terceira, a legitimação cartular assenta na posse de um título que documenta uma cadeia ininterrupta de endossos (posse qualificada). Abstraindo das diferenças relativas ao exercício do direito e à respectiva legitimação, que aqui não estão em jogo (pelo menos directamente), temos que o título à ordem se distingue do título ao portador pelo facto de a sua transmissão cartular depender de uma formalidade - o endosso - que não é exigida para este último: a traditio é uma traditio qualificada por esse elemento adicional.

40. Este confronto sumário já revela que, se o título à ordem é transmissível por cessão do direito nele documentado, não parece haver razão para concluir diferentemente no caso dos títulos ao portador. Com efeito, a única diferença assinalável no regime de transmissão dos dois títulos é a referida formalidade suplementar exigida para a transmissão cartular do direito inscrito num título à ordem e não se vê que relação esta tenha com a questão da admissibilidade ou não de uma forma de transmissão não cartular do direito (a cessão).

41. Pode, no entanto, o título ao portador, apesar de ser um documento que “incorpora” um direito, considerar-se - no tráfico jurídico - como uma pura coisa móvel [civ] , transmissível, portanto, (apenas) pelas formas próprias deste tipo de coisas? A resposta deve, quanto a mim, ser negativa. Com efeito, como poderá ter tal natureza uma entidade em que, sendo composta por um elemento corpóreo - o documento - e um elemento incorpóreo, o direito nele inscrito, o seu valor (ou substância) reside neste segundo [cv] ?

É verdade que é corrente ver-se no título ao portador essencialmente um documento (coisa móvel) e considerar o direito que ele «incorpora» como um seu apêndice ou satélite, que o segue para onde ele for e ao qual se aplica, imediatamente, o seu regime de transmissão. Embora para as partes o objecto da transmissão seja, na realidade, o conjunto formado pelo direito e pelo título, do ponto de vista técnico-jurídico, objecto autónomo do tráfico será apenas o primeiro, pelo que - dir-se-á - a cessão não terá aqui lugar. Todavia, para além de ser manifesto que estamos perante uma simples e artificial construção jurídica destinada a explicar o resultado a que se quer chegar - isto é, a submissão da transmissão do direito cartular ao direito das coisas -, mais uma vez é de notar que a mesma construção é feita, igualmente, para os títulos à ordem e, nestes, como se viu, a cessão é admitida. Sendo assim, das duas uma: ou se considera que tal construção tem um alcance limitado – e não se vê razão bastante para isso acontecer só em relação aos títulos à ordem –, ou deverá concluir-se que ela é inadequada para traduzir o fenómeno translativo dos títulos circulantes, como, aliás, o sugere o facto de aquilo que constitui o verdadeiro valor em circulação aparecer nela num plano meramente secundário e subordinado a um documento em si mesmo sem valor.

Vejamos, no entanto, a questão mais de perto. Como já se assinalou, é corrente afirmar-se que os títulos circulantes (títulos à ordem e ao portador) se caracterizam pelo facto de que neles o direito segue o título (das Recht aus dem Papier folgt dem Recht am Papier) – o que traduz, num determinado âmbito, uma dependência do direito em relação ao documento -, enquanto que nos títulos nominativos ou de legitimação directa vigora a - mais natural - regra inversa de que o título segue o direito (das Recht am Papier folgt dem Recht aus dem Papier). Como a primeira regra é, por vezes, invocada a propósito da questão da admissibilidade ou não da cessão, importa ver se uma resposta afirmativa a esta questão é incompatível com ela. Noutros termos, a questão é a seguinte: a transmissão por cessão de um título é inconciliável com o facto de nele ser característica a regra de que o direito segue o título? [cvi] .

A resposta a esta questão só pode ser negativa. Com efeito, como se assinalou, a regra de que o direito segue o título é característica, não só dos títulos ao portador, mas também dos títulos à ordem e nestes não há dúvida de que a transmissão por cessão é permitida. Característico dos títulos circulantes é, na verdade, o facto de estes poderem transmitir-se por uma forma especial em que “o direito segue o título”. Nesta medida, pode dizer-se que eles se caracterizam pela regra de que a aquisição da titularidade do documento importa necessariamente a do direito nele inscrito. Mas isso é perfeitamente compatível com a admissibilidade da cessão, como o revela (se tal fosse necessário) a situação doutrinal e jurisprudencial existente nos títulos à ordem. A regra de que o direito segue o título tem um campo de aplicação circunscrito à transmissão cartular. Havendo uma transmissão por cessão, a regra aplicável será a inversa.

Na verdade, o que está em causa é uma questão anterior à do campo de aplicação destas regras: é a de saber se, ao lado da transmissão própria do título, deve ser admitida a sua transmissão por cessão do direito nele documentado, aplicando-se uma regra ou outra consoante o tipo de transmissão que, em concreto, se verificar. O mesmo valendo para outras máximas comummente apresentadas como tendo um significado equivalente ao da regra de que o direito segue o título.

Noutros termos, dizer-se que, nos títulos circulantes, o documento é portador ou veículo do direito ou que a transmissão deste se dá através daquele não resolve a questão de saber se, ao lado da transmissão cartular, é ou não de admitir a cessão. O que está em discussão não é saber se o documento é portador, veículo, etc., mas se ele é portador ou veículo necessário do direito, se a transmissão deste se dá necessária ou exclusivamente através do documento; e, quanto a esta questão, de acordo com a situação doutrinal e jurisprudencial relativa aos títulos à ordem, a resposta será negativa. Mais latamente, a tese da incedibilidade, sendo o título ao portador, também não pode considerar-se uma consequência, necessária ou natural, da incorporação, traduzida no âmbito da transmissão, numa dependência do direito em relação ao título, uma vez que tanto os títulos ao portador, como os títulos à ordem se caracterizam por essa dependência e, como se tem dito repetidamente, tal não impediu que, nestes últimos, se tivesse imposto a opinião de que a cessão é possível.

ii) 42. Uma vez que a construção que a doutrina dominante faz do fenómeno translativo dos títulos ao portador (e à ordem), não é imposta por qualquer texto legal, mas se destina a explicar e justificar a aplicação das formas e do regime de transmissão das coisas móveis à transmissão de direitos diferentes da propriedade mobiliária (corpórea), a apreciação feita até aqui deve ser completada com a análise funcional de tal construção, isto é, há que verificar se ela é ou não adequada para o fim que se pretende atingir. A questão põe-se nos seguintes termos: para tornar possível a aplicação a um direito não real do regime de transmissão da propriedade mobiliária, ou de um regime especial inspirado neste, é necessário considerar o título - em si mesmo, tendo o direito nele inscrito como satélite, ou o conjunto formado pelo documento e pelo direito - como (pura) coisa móvel (ou equipará-lo a uma coisa deste tipo)?

Ou é necessário construir, tecnicamente, o seu fenómeno translativo de tal modo que objecto autónomo do tráfico é apenas o documento (coisa móvel), seguindo-o o direito nele inscrito (em virtude da conexão funcional entre eles existente ou outra razão)?

Mais uma vez a situação existente nos títulos à ordem revela, por um lado, que o título não é uma pura coisa móvel nem se comporta necessariamente, no tráfico, como tal; e, por outro, que, na perspectiva tradicional, objecto autónomo deste tráfico pode sê-lo também o direito. De contrário, não se compreenderia a sua transmissão por cessão. E nem por isso os títulos desta espécie deixaram de cumprir aquela função de permitir a circulação dos direitos neles documentados, basicamente, pelas formas e segundo o regime de transmissão da propriedade mobiliária.

43. Mas há outras razões que justificam a revisão da própria razão de ser da construção que a doutrina, em geral, faz do fenómeno translativo dos títulos circulantes, de modo a adequá-la à realidade e à função que um título deste tipo se destina a cumprir. Com efeito, na vida real, nem as transmissões cartulares dos títulos à ordem e ao portador têm por objecto directo e imediato apenas o documento, seguindo-o o direito, nem a cessão tem por objecto apenas o direito, seguindo-o o título; o objecto das transacções é, nos dois casos, o conjunto formado pelo documento e pelo direito nele inscrito [cvii] . Além disso, como é evidente sobretudo nos títulos meramente declarativos - e nos valores mobiliários, em especial -, no centro da transmissão está o direito e não o documento: o valor transaccionado reside no primeiro. O papel existe para tornar possível a circulação cartular do direito nele documentado. Como se consegue tal resultado sem construções técnico-jurídicas divorciadas da realidade e, em particular, sem ter que recorrer ao artifício de considerar que, em virtude da documentação, o papel substitui o direito como objecto autónomo do tráfico e sem ser necessário lançar mão de imagens como a do documento – veículo do direito nele inscrito?

A resposta é simples. O documento opera uma espécie de qualificação do direito, dando-lhe publicidade equiparável à de uma coisa móvel, o que torna possível (mas não necessária) a sua transmissão pelas formas e segundo o regime da propriedade mobiliária, ou melhor, segundo uma lei especial de circulação inspirada neste regime [cviii] .

Objecto do tráfico é sempre o direito; não o direito puro e simples, mas o direito documentado [cix] , ainda que se trate de uma forma especial de documentação; nunca, porém, o documento, que tem uma função meramente instrumental em relação àquele. O papel não é nenhum veículo, não é portador de nada, nem a disposição do direito se dá através de um negócio de disposição do documento. Consequentemente, o direito não segue documento nenhum. Em virtude da referida qualificação, ele fica, simplesmente, a ter duas formas de transmissão: a que teria como direito puro e simples e a que resulta do facto de estar documentado no título. Para garantir que a titulação cartular cumprirá efectivamente a função de tornar o direito apto para a circulação, não é preciso excluir a cessão; basta tornar possível também a sua transmissão pela forma e segundo o regime próprios do título, e considerar que a aquisição cartular de boa-fé prevalece, em caso de concorrência de transmissões [cx] .

Neste sentido, mas só neste sentido, pode dizer-se que o título é determinante na definição da titularidade do direito cartular.

iii) 44. Para terminar este ponto, importa agora tratar da questão de saber se a eficácia da cessão depende ou não da entrega do documento (ou acto equivalente). No essencial, ela resume-se no seguinte: provoca a documentação de um direito por título à ordem ou ao portador uma modificação do regime da cessão, no sentido de a tornar sujeita ao princípio da tradição?

Como se disse acima, nos títulos nominativos, a doutrina dominante nega que a transmissão esteja submetida a este princípio. Isto significa que o argumento (utilizado, nomeadamente, pelo RG) de que, sendo o documento necessário para o exercício do direito nele inscrito, a sua transmissão deveria igualmente depender da sua entrega (ou acto equivalente) foi abandonado [cxi] .

Por outro lado, tal como acontece nos títulos nominativos, o documento não cumpre qualquer função translativa na cessão de um título circulante (TO ou TP), representando a proclamada necessidade da tradição uma formalidade suplementar que não pode, na ausência de disposição legal que a imponha, admitir-se sem uma razão ponderosa, tanto mais que a analogia existente entre a situação que se verifica em caso de cessão de título circulante e aquela que ocorre nos títulos nominativos leva naturalmente a concluir em sentido contrário [cxii] . Além disso, tendo o título sido concebido para tornar o direito nele inscrito apto para a circulação, dotando-o de uma lei especial de transmissão, também parece evidente que a exigência da tradição, em caso de cessão, não está coberta pela função da titulação. Onde está, então, o seu fundamento?

45. Segundo ULMER, o documento funcionaria neste caso como símbolo da transmissão bertragungssymbol ) [cxiii] , mas não é difícil reconhecer que se trata de uma simples fórmula que, se tem algum significado explicativo, não pode fundamentar uma norma jurídica como aquela que está em discussão. Para o BGH, o princípio da tradição desempenharia aqui o papel de evitar a dissociação da titularidade e da possibilidade de exercício do direito constante do documento, tutelando-se, deste modo, o adquirente e o valor da «clareza jurídica» (Rechtsklarheit) [cxiv] .O argumento da necessidade ou conveniência de tutela do adquirente é, no fundo, um prolongamento da ideia de que, dependendo o exercício do direito do documento, o mesmo deve acontecer com a transmissão, ideia que, como se referiu, foi, muito justamente, abandonada. Por outro lado, como também já se disse, não há razão para o ordenamento jurídico querer tutelar o cessionário… contra o seu próprio interesse [cxv] . Quanto ao argumento da «clareza jurídica» (Rechtsklarheit), tudo está em saber se esta tem de ser prosseguida através da exigência da tradição, o que não está demonstrado [cxvi] .

46. O problema pode surgir é quanto à questão de saber se as partes numa eventual transmissão tiveram a intenção de operar uma cessão ou uma transmissão cartular. Os casos duvidosos podem, no entanto, resolver-se através de uma presunção de facto de que as partes quiseram esta segunda.

47. Poderia ainda invocar-se o valor da segurança do tráfico (e os interesses de terceiros que por ele estão cobertos), mas este valor é suficientemente acautelado através das regras que tutelam a aquisição (cartular) de boa fé [cxvii] .

48. Em boa verdade, na base da doutrina tradicional, parece estar sobretudo a ideia de que, nos títulos circulantes, a propriedade do título é, pelo menos tipicamente, dominante, quer na definição da titularidade do direito cartular, quer na construção da sua transmissão. Ocupando, com efeito, o documento (coisa móvel), tipicamente, o lugar central do fenómeno translativo – e não se distinguindo claramente, na caracterização do título, entre dependência do direito (relativamente ao papel) para circular e para circular cartularmente -, é, de alguma forma, compreensível (embora não justificada) a conclusão de que a tradição é sempre necessária.

O caso muda, no entanto, de figura se o título de crédito for visto tal como ele é realmente: um direito documentado que, em virtude desta documentação, pode ser transmitido, não só pela forma própria dos direitos da sua espécie, mas ainda segundo a lei especial própria do título. Na verdade, torna-se, então, manifesto que (no âmbito da transmissão) a função e o significado do título se esgotam na «transmissão cartular», não podendo a sua presença justificar a aplicação do princípio da tradição à cessão, em que ele aparece como mero acessório do direito. Isto é pelo menos assim nos títulos declarativos, nos quais as acções se incluem.

cc) Títulos à ordem e ao portador e direitos de transmissibilidade restrita

49. A documentação de um direito por um título de crédito à ordem ou ao portador não visa torná-lo livremente transmissível. Com efeito, a transmissibilidade é uma característica, não só dos direitos reais, mas também de outros direitos patrimoniais (incluindo os direitos de crédito), exceptuando aqueles que a própria lei configura como intransmissíveis ou de transmissibilidade restrita (cf., por exemplo, os §§ 38, 717 e 719 BGB) e aqueles que são assim configurados pelos interessados ao abrigo duma disposição legal [cf., nomeadamente, os §§ 399/413 BGB, o § 15 GmbHG e o § 68 (2) AktG].

50. A concepção que a doutrina dominante tem da natureza dos títulos circulantes, em especial do seu fenómeno translativo, levanta, porém, a seguinte questão: é conciliável, num título à ordem ou ao portador meramente declarativo, a eventual transmissibilidade restrita do direito (nele documentado) com o regime de livre transmissibilidade da propriedade mobiliária (próprio do documento)?

Como se verá melhor mais tarde, a maioria dos autores considera o regime de transmissibilidade restrita incompatível com a natureza dos títulos ao portador, mas não com a dos títulos à ordem. A ideia, acima referida e criticada, do título ao portador como (pura) coisa móvel parece ser a grande responsável por esta diferenciação. Mas o problema é mais complexo. A doutrina dominante concebe, como se viu, o fenómeno translativo cartular dos títulos circulantes como uma transmissão da propriedade do documento (coisa móvel), levando este consigo o direito nele documentado. Daqui retira uma minoria de autores uma incompatibilidade daquele regime também com a natureza dos títulos à ordem [cxviii] .

51. Não existe, porém, nenhuma incompatibilidade, nem com a natureza dos títulos ao portador, nem com a dos títulos à ordem. Num título meramente declarativo, o problema da livre transmissibilidade ou não do direito está fora do âmbito do fenómeno cartular; não é o título que define esta matéria. A questão coloca-se, portanto, nos seguintes termos: sendo o direito de transmissibilidade restrita, faz sentido ele ser titulável por um título à ordem ou ao portador? O título ainda cumprirá neste caso a sua função de o tornar apto para o tráfico, dando-lhe uma publicidade equiparável à de uma coisa móvel e dotando-o, assim, de uma lei de circulação especial que se traduz, nomeadamente, na tutela da aquisição cartular de boa-fé?

A resposta é afirmativa, e a doutrina dominante confirma o acerto desta resposta, ao admitir a documentação por título à ordem de um direito de transmissibilidade restrita [cf. infra, tít. II]. Na verdade, o documento não se destina, nem a definir se o direito há-de poder ou não ser transmitido por cessão e se há-de ser livremente transmissível ou não, nem a subtraí-lo ao domínio do direito das obrigações para o sujeitar ao das coisas móveis. A sua função é mais limitada: consiste em tornar possível a sua circulação segundo um regime especial, que não inclui qualquer norma incompatível com o carácter restrito da transmissibilidade do direito cartular. A incompatibilidade acima assinalada tem a ver com meras construções doutrinais, já criticadas, acerca da natureza do título e do fenómeno da sua circulação, e, nomeadamente, com a chamada teoria da propriedade, que coloca a propriedade do documento no centro do fenómeno cartular (títulos ao portador) ou, pelo menos, no centro da transmissão dos títulos circulantes.

52. Considerando, em especial, o caso das acções nominativas de transmissibilidade restrita, a dificuldade levantada pela construção da doutrina dominante pode ser ultrapassada entendendo que a norma do § 68 (2) AktG, que permite configurar um direito titulável (ou mesmo titulado) por um título circulante como um direito de transmissibilidade restrita, abrange não só o direito mas também o título, contendo, assim, uma excepção ao princípio da livre transmissibilidade da propriedade mobiliária. A consideração do título, neste caso, como um mero título nominativo não se justifica porque o título à ordem continua a cumprir a sua função.

Já não me parece que o problema possa ser ultrapassado invocando a natureza causal do título e recorrendo ao conceito de literalidade per relationem. Por esta via, conseguir-se-ia, quando muito, uma inoponibilidade da transmissão à sociedade, que teria contra o adquirente do título uma excepção ex causa. Na verdade, mesmo constando a restrição do papel, a questão da impossibilidade jurídica de estabelecer limites (reais) à transmissão da propriedade (do título) manter-se-ia em aberto.

Entendendo-se que não são incompatíveis com a natureza e o regime dos títulos circulantes (ou títulos de crédito stricto sensu) eventuais restrições à transmissibilidade, subsiste, no entanto, a questão de saber se, ainda no caso das ações, tais restrições devem, por razões de política legislativa e de ordenação sócio-económica, circunscrever-se às ações nominativas (títulos à ordem com associado «registo» legitimador), fazendo passar a mensagem de que estas poderão ter essa contingência enquanto as ações ao portador são livremente transmissíveis (salvo eventual norma legal especial em sentido diferente). Quanto a ela, a resposta já se mostra positiva, como se verá na segunda parte deste estudo (tít. II).

4. Breve referência a outras concepções da acção e da sua natureza jurídica

53. Da análise precedente decorre que, actualmente, a acção é entendida pela doutrina germânica como um direito corporativo titulável. Esta concepção remonta a RENAUD, como se viu, embora neste autor o conceito não seja exactamente o mesmo que veio a ser consagrado pela doutrina posterior. Importa agora fazer referência a duas concepções que, embora abandonadas (pelo menos formalmente), merecem notícia, ainda que breve [cxix] .

a) A concepção realista da acção: o accionista como (com)proprietário

54. SAVIGNY considerava as acções como títulos representativos de quotas de propriedade (Antheile am Eigentum) de uma empresa e o accionista como comproprietário (Miteigentümer), embora reconhecesse que o fenómeno poderia construir-se de outra maneira, isto é, considerando a corporação como proprietária da empresa e os accionistas como simples credores desta [cxx] . As razões da sua preferência pela primeira construção têm a ver, essencialmente, com a sua concepção acerca do significado da personalidade jurídica da corporação. Segundo ele, a personificação desta não teria outro fim senão o de facilitar a sua representação e de completar a sua existência face a terceiros [cxxi] , deixando subsistir a relação jurídico-societária existente entre os seus membros e, portanto, a compropriedade destes [cxxii] .

55. Esta concepção de SAVIGNY parece ter estado presente na redacção do ADHGB (de 1861), que, no seu art. 216 I, atribuía ao accionista uma quota do património (Antheil an dem Vermögen) da sociedade [cxxiii] , enquanto o art. 213 reconhecia esta como um sujeito de direito autónomo [cxxiv] . É de notar, no entanto, que a al. II do art. 216 estabelecia que o accionista não tinha o direito de exigir a restituição da entrada e que, durante a vida da sociedade, apenas tinha um direito ao lucro.

56. A doutrina que se desenvolveu a partir destes textos não foi, porém, no sentido da conciliação savigniana da personalidade da corporação e da propriedade do accionista. Uns autores, como THÖL [cxxv] , afirmaram a existência de uma verdadeira sociedade entre os accionistas, a quem pertenceria o património social, e, consequentemente, negaram a personalidade jurídica desta. Outros, pelo contrário, consideram a corporação como pessoa jurídica, titular do património social, e interpretaram, por isso, a expressão “Antheil an dem Vermögen”, utilizada no art. 216, como uma mera fórmula sintética de referir os direitos patrimoniais do accionista [cxxvi] . Os accionistas não seriam titulares do património social, que pertenceria à sociedade como pessoa jurídica autónoma; os seus direitos (patrimoniais) – como, aliás, o sugere a al. II do art. 216 – confinar-se-iam a certos direitos (de crédito) contra a sociedade, que lhes garantiriam o valor monetário daquele património: durante a existência da sociedade, o direito ao pagamento do lucro resultante do exercício da actividade social, após a sua dissolução, o direito a uma quota na partilha do património líquido da sociedade (que, note-se, não se confunde com a restituição das entradas, expressamente excluída pela lei: art. 216 II) [cxxvii] .

57. A tese que vingou foi a da sociedade-pessoa jurídica e da acção-direito corporativo, como se viu acima. O triunfo desta não eliminou, no entanto, totalmente, de alguns espíritos a ideia de propriedade. K. WIELAND é um exemplo disso [cxxviii] . Mais recentemente, é de salientar que, na exposição de motivos relativa ao projecto governamental de lei das sociedades anónimas de 1962 [cxxix] , o accionista é considerado como, economicamente, comproprietário da empresa e é manifestada a intenção de fazer corresponder o regime da sociedade anónima a esta posição (Eigentümerstellung) – e, nomeadamente, aos princípios da constituição económica que garantem e tutelam a propriedade privada [cxxx] . A concretização deste objectivo foi tida como indispensável para que continuasse a haver proprietários privados prontos a pôr os seus recursos à disposição da sociedade anónima, garantindo, deste modo, a existência e o progresso de uma ordem económica baseada na iniciativa privada [cxxxi] .

58. Deste tipo de análises e do facto de a ação ser considerada como «propriedade» no sentido do art. 14 GG [cxxxii] não pode, naturalmente, retirar-se a conclusão de que o accionista é contitular da empresa (em sentido objectivo) ou do património social: no direito alemão, a ideia do accionista-proprietário era, no dizer de FLUME, já em 1962 um anacronismo [cxxxiii] . Elas sugerem, no entanto, por um lado, que a acção é, antes de mais, se não uma forma de afectação da empresa ou do património social em si mesmos, pelo menos, uma forma (específica) de afectação do seu valor [cxxxiv] ; e por outro lado, que a posição do accionista, nos limites impostos pela dimensão social da acção, é merecedora de uma tutela inspirada por princípios semelhantes aos que vigoram para a propriedade.

b) As concepções obrigacionais da acção: o accionista como credor da sociedade. Tese de MATSUDA

aa) A superação das concepções obrigacionais (em geral)

59. Apesar do artigo 216 I ADHGB, triunfou, ainda durante o séc. XIX, a opinião de que o património social pertence à sociedade-pessoa jurídica [cxxxv] ; e o conceito de acção desenvolveu-se, como se viu, como um conceito autónomo, quer relativamente à propriedade, quer em relação ao direito de crédito. Hoje, é clara na doutrina germânica a distinção entre a posição accionária em si – que surge, em virtude da subscrição de uma das unidades em que se divide o capital social, com o registo da sociedade ou do aumento de capital – e os (eventuais) direitos de crédito que, tendo nela o seu fundamento, resultam de um acto da corporação distinto daquele que deu origem à primeira [cxxxvi] .

As concepções da acção como direito de crédito – que (no quadro da dicotomia direito real, direito de crédito) apareciam, no séc. XIX, como a alternativa às teses realistas compatível com a ideia da personalidade jurídica da corporação [cxxxvii] – devem considerar-se, justamente, superadas por esta distinção, hoje pacífica na doutrina, entre a posição accionária propriamente dita e os eventuais direitos de crédito dependentes de um acto da corporação posterior e distinto do acto que está na origem da primeira, direitos estes que inspiram as teses da acção-direito de crédito eventual e da acção-direito de crédito condicional.

bb) A concepção de MATSUDA

60. A concepção da acção como direito de crédito foi, no entanto, retomada por MATSUDA, já neste século, e, embora não tenha tido seguidores, merece uma referência especial porque ela revela que a construção do fenómeno accionário feita pela doutrina dominante não é a única possível.

Viu-se anteriormente que a acção tal como é hoje pacificamente entendida, apesar da sua dimensão corporativa, não esgota a relação sócio-sociedade [cxxxviii] . Este facto, que tem passado praticamente despercebido, revela uma recondução fundamental da relação corporativa sócio-sociedade ao fenómeno accionário, dando, no entanto, ao mesmo tempo, a impressão de que fica algo de fora, que não se encaixa na estrutura da MITGLIEDSCHAFT.

61. A construção da MATSUDA evita este resultado. Segundo ele, resulta da análise do fenómeno societário que a sociedade anónima tem uma dupla natureza, colectivista e individualista [cxxxix] . A esta dupla natureza da sociedade corresponderia a existência de uma dupla relação jurídica entre ela e o accionista: este teria, antes de mais, como contrapartida da sua entrada, uma posição jurídica de carácter duradouro que lhe permitiria realizar os seus interesses patrimoniais (posição esta, correspondente ao momento individualista da sociedade): a acção. Esta teria natureza creditória (seria um crédito no interior da sociedade), seria titulável e transmissível, e dela emergiriam determinados direitos laterais (Nebenrechte) - como direito ao dividendo – e estar-lhe-iam associados outros tantos direitos acessórios, como o direito ao título e o direito a ser inscrito no livro das acções. A sua titularidade atribuiria, por força dos estatutos, a quem nela estivesse investido o estatuto de membro, que se traduziria num conjunto de direitos orgânicos de carácter pessoalíssimo – e, portanto, intransmissíveis – cujo exercício deveria ser feito no interesse da sociedade. A acção seria o único objecto circulante. A sua transmissão acarretaria a extinção dos direitos orgânicos do transmitente e a sua aquisição originária, por força dos estatutos, pelo transmissário, que, em virtude da titularidade da acção, entraria para a sociedade, isto é, passaria a ser membro desta [cxl] .

Em síntese, através da subscrição, o subscritor adquiriria, como contrapartida da entrada, uma acção. Com isso, entraria para a sociedade e, na qualidade de membro, ficaria submetido à sua «constituição». Como, segundo esta, todo o membro teria direito a tomar parte na vida da corporação, ele adquiriria também, originariamente e sem mais, os direitos orgânicos [cxli] .

62. Esta construção, que significa um certo retorno à noção originária da acção e a negação do seu carácter corporativo [cxlii] , dissociando-a, pelo menos logicamente, do «status socii», é no essencial, teoricamente bem conseguida, apesar de não ter tido êxito. Ela poderia, portanto, apresentar-se como alternativa à concepção dominante. O facto de traduzir, em parte, uma visão «corporativista» do fenómeno societário (cf. o que afirma acerca do exercício dos direitos orgânicos) torna-a, no entanto, pelo menos, discutível ou merecedora de revisão. Por outro lado, é manifesta a estreiteza do quadro de categorias jurídicas em que o autor se move. Com efeito, negando à acção o carácter de um direito corporativo, como consequência da sua redução a uma dimensão meramente patrimonial, ele conclui, sem mais, que se trata de um direito de crédito. Ora, mesmo pondo de lado a ideia da propriedade e admitindo que a acção é um direito, esta conclusão não é forçosa, já que a posição accionária em si, tal como o autor a concebe, pode ainda qualificar-se como um direito de participação (Beteiligungsrecht), de natureza especial [cxliii] , distinto dos eventuais direitos de crédito que, nos termos acima assinalados , dele venham a surgir.


§ 2.º

A MITGLIEDSCHAFT COMO «OBJECTO» TRANSMISSÍVEL

A – A MITGLIEDSCHAFT COMO OBJECTO DO TRÁFICO JURÍDICO

1. A MITGLIEDSCHAFT como objecto do tráfico. Natureza do fenómeno translativo

a) Doutrina dominante

63. Afirmou-se no parágrafo anterior que, de acordo com a doutrina dominante, a MITGLIEDSCHAFT - independentemente da sua qualificação ou não como direito subjectivo – constitui uma posição jurídica unitária, uma unidade incindível [cxliv] . Resta acrescentar que, segundo a mesma doutrina, ela é mais do que isso: é uma posição jurídica unitária apta para o tráfico jurídico(eine verkehrsf ä hige einheitliche Rechtsstellung), um objecto (Gegenstand) desse tráfico [cxlv] .

Isto significa, em primeiro lugar, que ela não é um mero conjunto de direitos e vinculações ou um mero conjunto de “objectos” (Gesamtheit mehrer Mitgliedschaftsrechten und Mitgliedschaftspflichten, Inbegrif von Gegenstanden) [cxlvi] ; e, em segundo lugar, que não é inseparável da pessoa do seu titular [cxlvii] .

Na verdade, a jurisprudência e a doutrina dominante admitem, actualmente, mesmo no que se refere às sociedades de pessoas (e inclusive às associações), a possibilidade de a MITGLIEDSCHAFT ser objecto de uma verdadeira transmissão, isto é, uma sucessão na posição jurídica do seu titular [cxlviii] .

b) Breve referência a outras construções

64. Relativamente ao fenómeno da transmissão da MITGLIEDSCHAFT, são ainda conhecidas, basicamente, duas outras construções doutrinais. A primeira consiste em negar a possibilidade de uma verdadeira transmissão: a mudança do membro de uma sociedade ou de uma associação reflectiria forçosamente uma extinção da MITGLIEDSCHAFT de quem sai e a sua aquisição originária por quem entra, aquisição esta que se daria através de um acto de natureza “jurídico-social” (contrato entre a sociedade ou associação e a pessoa que entra). Para os partidários da segunda, pelo menos nalgumas organizações, seria possível transmitir os direitos patrimoniais que integram a MITGLIEDSCHAFT, mas os direitos administrativos, pelo seu carácter pessoal, extinguir-se-iam com a transmissão e seriam adquiridos “ex novo” pelo transmissário (através de um acto de natureza jurídico-social) [cxlix] .

65. A primeira construção – que não deixa de fazer lembrar uma concepção ultrapassada do direito subjectivo e a figura do «status» – não corresponde à visão que o tráfico tem do fenómeno (pelo menos, do fenómeno societário). No caso das acções ao portador, o seu carácter artificioso é evidente; no caso das quotas de uma sociedade por quotas e das acções nominativas, ela pressupõe uma interpretação dos §§ 16 GmbHG e 67 AktG que não corresponde à que hoje se lhes dá. Com efeito, tanto num caso como no outro, a inscrição do adquirente junto da sociedade não só não faz parte da transmissão – pelo contrário, pressupõe-na – como nem sequer é requisito da sua eficácia; ela tem o mero significado de instrumento de legitimação para o exercício dos direitos sociais [cl] .

66. A segunda traduz, no fundo, uma duplicidade ontológica da MITGLIEDSCHAFT que não está de acordo com a sua estrutura unitária e indivisível, tal como ela é hoje entendida pela doutrina dominante [cli] . Seria, no entanto, possível – no caso das sociedades, em especial, no caso das sociedades de capitais – construir o fenómeno de outro modo, reconhecendo na posição do sócio, antes de mais, um direito patrimonial de participação, transmissível (com ou sem restrições consoante o caso); à titularidade deste poderia ser, então, inerente a qualidade de membro com os direitos e obrigações respectivos, ou poderia a aquisição desta depender de um acto da sociedade, vinculado ou não, que funcionaria ou não como “condicio iuris” de eficácia da transmissão do direito patrimonial [clii] .

2. A transmissão daMITGLIEDSCHAFT (por acto entre vivos)

67. Uma vez admitida a transmissibilidade da MITGLIEDSCHAFT, põe-se a questão de saber como se opera a sua transmissão, em especial, a transmissão voluntária por acto entre vivos. Na exposição que se segue, está em causa apenas esta e far-se-á ainda abstracção da sucessão na posição de membro de uma associação, que me parece menos relevante para os fins deste trabalho [cliii] . Das acções tratar-se-á posteriormente (B). Fica-nos, assim, em seguida, o tratamento do tema nas sociedades de pessoas e nas sociedades por quotas.

a) Nas sociedades de pessoas

68. Em relação à transmissão da MITGLIEDSCHAFT nas sociedades de pessoas, existem divergências doutrinais sobre vários pontos. Vejamos.

O primeiro tem a ver com o próprio enquadramento legal do fenómeno. Assim, ao lado de autores que consideram que a lei é omissa sobre o assunto mas que ele é de admitir [cliv] , existem outros que o vêem regulado, ou no § 719 I BGB [clv] , ou no § 717 (1ª parte) BGB [clvi] , e o julgam igualmente admissível por considerarem estes preceitos (enquanto reguladores da transmissão da MITGLIEDSCHAFT) como meramente dispositivos (cf. infra, tít. II).

69. O segundo ponto é relativo à construção do próprio negócio translativo e é este que verdadeiramente interessa. Uma minoria de autores qualifica-o como um negócio trilateral [clvii] . O BGH e a maioria da doutrina, porém, consideram-no um negócio bilateral (entre o alienante e o adquirente), um contrato de cessão regulado pelos §§ 398 ss/413 BGB, cuja eficácia depende de uma “condicio iuris”: o consentimento dos restantes sócios, a prestar nos termos dos §§ 182 e seguintes do BGB [clviii] . Este é, aliás, um ponto de apoio para a construção de uma teoria geral da MITGLIEDSCHAFT, uma vez que, como se verá, a transmissão das acções e das quotas vinculadas também é concebida nestes termos.

70. Outro ponto controvertido é o da qualificação da transmissão da MITGLIEDSCHAFT (nas sociedades de pessoas, e, sobretudo, nas sociedades civis) como uma cessão do contrato (Vertragsübernahme), sendo esta, por sua vez, construída pela doutrina ora como contrato trilateral, ora como contrato bilateral cuja eficácia depende do consentimento do cedido [clix] . A doutrina (hoje) dominante rejeita, no entanto, esta qualificação [clx] . Escrevendo a propósito das sociedades civis, LARENZ limita-se a afirmar que o fenómeno da transmissão da MITGLIEDSCHAFT corresponde, no direito dos contratos obrigacionais, à cessão do contrato: nos dois casos, o objecto da transmissão é a posição jurídica como um todo [clxi] .

É de referir ainda que, se se considera a transmissão da MITGLIEDSCHAFT uma cessão do contrato, ela será concebida como um negócio bilateral ou trilateral consoante a concepção que se adopte para o fenómeno da cessão do contrato em geral. Mas já é possível considerar que aquela não se reconduz a esta e, apesar disso, manter que se trata de um negócio trilateral.

b) Nas sociedades por quotas

71. Nas GmbH (srl correspondentes às nossas sociedades por quotas), a própria lei regula, em parte, a transmissão daMITGLIEDSCHAFT (Geschäftsanteil), qualificando-a como cessão (Abtretung) e exigindo para esta uma forma solene (§ 15 III GmbHG). Sendo as quotas (Geschäftsanteile) livremente transmissíveis (§ 15 I GmbHG), a cessão constituirá um negócio bilateral puro e simples. Sendo vinculadas (isto é, sendo a sua transmissão sujeita ao consentimento a que se refere o § 15 V), ela continuará a ser um negócio bilateral, embora sujeito a uma “condicio iuris” de eficácia: o consentimento da sociedade (ou dos sócios), a prestar nos termos dos §§ 182 e seguintes do BGB [clxii] .

c) Conclusão

72. Pode, assim, concluir-se que, de acordo com aquilo que parece ser a orientação hoje dominante na jurisprudência e na doutrina germânicas, a transmissão singular entre vivos se dá por contrato entre o titular da MITGLIEDSCHAFT e o adquirente, embora, como se verá melhor no título seguinte, a sua eficácia possa, por disposição legal (supletiva) ou por cláusula estatutária [clxiii] , estar dependente do consentimento dos sócios, corporação ou sociedade a que a MITGLIEDSCHAFT se refere, a prestar nos termos dos §§ 182 e seguintes BGB.

B – A TRANSMISSÃO DAS ACÇÕES

1. Os modos de transmissão das acções (a questão do objecto da transmissão no caso de o direito accionário estar titulado)

a) Em geral (acções livres)

73. Numa sociedade anónima, importa considerar separadamente três situações: a da transmissão do direito accionário não titulado; a da transmissão das acções nominativas (ou do direito documentado por título provisório); e a da transmissão das acções ao portador. No primeiro caso, o direito é transmissível – a partir do seu nascimento, com o registo da sociedade ou do aumento de capital [clxiv] -, pelo modo geral de transmissão de direitos, isto é, por cessão nos termos dos §§ 398/413 BGB [clxv] .

Sendo as acções nominativas, segundo a doutrina dominante, o direito está forçosamente documentado por um título à ordem e tanto pode ser transmitido por cessão, como segundo a lei de circulação do título, isto é, por endosso [clxvi] . Quanto às acções ao portador, o direito accionário circula por tradição do título, sendo discutido na doutrina, como já se viu, se também pode ser transmitido por cessão [clxvii] .

A estas formas de transmissão acrescem, como se disse acima, pelo menos estando o direito titulado, as modernas formas do direito bancário previstas na Depotgesetz [clxviii] .

b) Acções vinculadas

74. Sendo as acções vinculadas (isto é, estando a sua transmissão sujeita ao consentimento da sociedade nos termos do § 68 (2) AktG), a construção do fenómeno não muda. Apenas a eficácia da transmissão fica dependente de uma “condicio iuris”, como se verá desenvolvidamente no título seguinte [clxix] .

c) Objecto da transmissão

75. Como se viu no parágrafo anterior, mesmo sendo o direito titulado, na realidade, o objecto da transmissão é constituído pelo próprio direito enquanto direito documentado, isto é pelo direito e pelo seu documento (na maioria dos casos, aliás, imobilizado), e não pelo título ou pelo direito, seguindo este aquele ou sendo seguido por ele, consoante se trate de transmissão cartular ou de cessão. A concepção tradicional é, no entanto, diferente. Afirmando-se, mesmo, que, na transmissão cartular, o que se transmite é o título e não o direito documentado - a Mitgliedschaft -, sendo esta encabeçada por quem for ou se tornar titular do documento accionário. Neste caso, tratando-se de acções nominativas vinculadas, a norma do § 68 (2) AktG compreenderá - ou é susceptível de compreender - na limitação à transmissibilidade não só o direito (Mitgliedschaft) mas também o título (Wertpapier), afectando o negócio de disposição do mesmo (cf. o § 1 B.3b) e veja-se o tít. II).

2. O regime da transmissão

76. Numa primeira impressão, poderia pensar-se que, quando o direito circula por cessão, pelo menos se não está documentado por título de crédito, se aplica, sem mais o regime dos artigos 398 e seguintes do BGB. É de notar, no entanto, que este só é aplicável na medida em que não haja lei especial e a sua aplicação não contrarie a natureza própria do direito [clxx] .

Ora já RENAUD chamou a atenção para o facto de que, sendo o direito accionário um direito corporativo e não um direito de crédito, as regras da cessão (nomeadamente a da oponibilidade pelo cedido de excepções pessoais relativas à pessoa do transmitente do direito accionário) não podem sem mais aplicar-se [clxxi] .

Esta questão não tem, no entanto, merecido grande atenção por parte da doutrina posterior, que se limita, em geral, a abordar a questão da aplicação ou não do § 399 (relativo à possível intransmissibilidade, natural ou contratual, do crédito) [clxxii] . A possível consagração do direito não titulado como direito-valor resolverá, provavelmente, a questão fundamental da oponibilidade das excepções pessoais sem deixar, todavia, o problema inteiramente esclarecido.

77. A situação será outra, naturalmente, se estiver em causa uma cessão de algum dos direitos de crédito que, tendo o seu fundamento na MITGLIEDSCHAFT, dele se autonomizaram, nomeadamente, o direito ao dividendo deliberado.


§ 3.º

P R I N C I P A I S C O N C L U S Õ E S

(que interessam especialmente para a exposição subsequente)

I

78. 1 - A acção, no seu significado fundamental, é a posição jurídica correspondente a cada uma das unidades em que o capital social, numa sociedade anónima, se divide.

2 - Como a sociedade anónima só existe como tal – isto é, como corporação dotada de personalidade jurídica e com um capital dividido em acções – e o aumento do capital só se torna eficaz com a respectiva inscrição no registo comercial, esta posição jurídica, se bem que tenha o seu fundamento no acto de subscrição do seu titular originário, nasce com essa inscrição.

3 - A lei configura-a implicitamente como titulável por título de crédito (à ordem ou ao portador) e, como se verá melhor no título II, parte do pressuposto de que é transmissível.

4 - Como ela só nasce, porém, com o registo, só a partir deste pode haver emissão de título e dar-se a sua transmissão.

5 - Com o depósito dos títulos nos bancos de depósito de valores mobiliários, o documento perdeu, na prática, quer a sua função de instrumento de circulação da acção, quer a sua função legitimadora.

6 - Daí que alguma doutrina mais recente proponha o seu reconhecimento como direito-valor, no sentido de um direito submetido aos mesmos princípios que regem os valores mobiliários titulados (mesmo se não documentado.

II

7 - A posição accionária, tal como é hoje entendida, é uma posição jurídica complexa de natureza corporativa e carácter essencialmente patrimonial, qualificada pela generalidade dos autores como um direito subjectivo.

8 - Ela constitui, antes de mais, uma técnica de afectação do valor da empresa ou património social e constitui, assim, um direito-valor (hoc sensu).

9 - Mas o seu conteúdo é ainda integrado por poderes ou faculdades de carácter orgânico ou administrativo.

10 - Ela forma, na complexidade dos elementos (posições jurídicas simples) de que se compõe, um todo incindível.

11 - (Tal como acontece noutros casos: propriedade, locação, etc.) ela constitui uma posição jurídica fundamental que não se confunde com os direitos que dela se vão autonomizando, como o direito ao dividendo deliberado ou o direito de preferência na subscrição de novas acções correspondentes a aumento de capital também já deliberado.

12 - Estes podem ser objecto de transacções inteiramente distintas das relativas à acção. Importa, no entanto, salientar que, quando eles aparecem como objecto dessas transacções na qualidade de direitos futuros, estão sujeitos às regras gerais de transmissão de bens ou direitos futuros emergentes de uma relação ou situação jurídica fundamental; nomeadamente, a sua aquisição só se dará se eles nascerem na esfera jurídica do disponente, o que pressupõe que este seja, nessa altura, titular da acção (ou tenha o poder de disposição da mesma).

13 - Questão que não tem merecido as atenções da doutrina e que, portanto, deve considerar-se como uma questão em aberto (ou por esclarecer) é a de saber se a acção, mesmo sendo entendida como posição jurídico-corporativa, esgota todo o conteúdo da relação sócio-sociedade ou se constitui apenas o seu núcleo, sendo ou podendo ser, nomeadamente, inerentes à qualidade de sócio ou accionista determinados direitos de carácter estritamente pessoal que dela não fazem parte e estão, portanto, fora do tráfico accionário.

14 - Outra questão que também não tem sido considerada é a que se traduz na possível conveniência em distinguir, no âmbito da transmissão, entre determinados direitos sociais, que compõem a MITGLIEDSCHAFT, em abstracto (v. g. o direito de impugnação de eventuais deliberações anuláveis, o eventual direito de exoneração ocorrendo justa causa, etc.) e em concreto (v. g. o direito de impugnar certa deliberação inválida ou o direito que possui um sócio de se exonerar por se verificarem determinadas condições). A transmissão da MITGLIEDSCHAFT abrange todos os direitos, abstractos e concretos?

15 - Esta concepção da acção não é, no entanto, a única possível, podendo ela ver-se, nomeadamente como uma posição jurídica de carácter patrimonial – tendo no seu núcleo um direito de participação no valor (substancial e de rendimento) da empresa e sendo composta ainda por outros direitos e poderes laterais ou acessórios e, eventualmente, pela obrigação de entrada – a cuja titularidade seria inerente a qualidade de membro, qualidade esta que, por sua vez, traria consigo um conjunto de direitos ou poderes no âmbito da corporação, que se adquiririam ou extinguiriam com a aquisição ou extinção daquela qualidade. Alguns deles (como o direito de voto) podem estender-se ou diminuir em função das acções em que esta qualidade assenta, ou depender da titularidade de certo número de acções (como o direito de convocar a assembleia geral).

16 - Variando o conceito de acção, variará, consequentemente, o quid que o título documenta e o objecto (possível) do tráfico jurídico.

III

17 - A transmissão da acção constitui uma verdadeira sucessão do adquirente na posição jurídica do alienante.

18 - A transmissão/aquisição (a título singular por acto entre vivos) realiza-se através das formas da cessão de direitos em geral (§§ 398/413 BGB) ou das formas de transmissão próprias do título, mas, neste caso, há que ter em conta as especificidades da transmissão cartular.

19 - Questão que não me parece ter merecido suficiente atenção da doutrina para se considerar esclarecida é a de saber qual o regime que se aplica à cessão da posição accionária, isto é, quais as disposições dos §§ 398 e seguintes do BGB são compatíveis com a sua natureza.

CAPÍTULO II

DIREITO PORTUGUÊS (*)

§ 1.º

O B J E C T O D A T R A N S M I S S Ã O

(A acção como PARTICPAÇÃO SOCIAL. Conceito e natureza)

79. Como se assinalou (cap. I), no âmbito societário, ao conceito de MITGLIEDSCHAFT corresponde, na terminologia jurídica portuguesa, em especial no CSC, o de participação social [clxxiii] . Nas associações, o mesmo conceito aparece traduzido pela expressão “qualidade de associado” [clxxiv] .

A participação social é também designada quota nas sociedades civis [clxxv] e nas sociedades por quotas [clxxvi] , chama-se parte social nas sociedades em nome colectivo [clxxvii] e identifica-se com a acção – num dos sentidos que esta palavra comporta – nas sociedades anónimas [clxxviii] .

80. A questão de saber se se justifica ou não a construção de uma teoria unitária da posição de membro de uma entidade privada de carácter associativo (cf., para esta, o cap. ant., § 1) pode ficar aqui em aberto. Com efeito, embora sejam feitas várias referências, ao longo deste trabalho, ao regime da posição de associado, directamente, interessa-nos apenas o direito societário e, em especial, o direito das sociedades comerciais, em que se enquadra o tema da transmissibilidade das acções.

A – A PARTICIPAÇÃO SOCIAL EM GERAL

1. Conceito de participação social

81. Tendo em conta o conceito de MITGLIEDSCHAFT apurado no capítulo anterior, a participação social pode ser definida como a posição jurídica ou cada uma das posições jurídicas existentes numa sociedade a cuja titularidade é inerente a qualidade de sócio ou, noutra perspectiva, mais descritiva, como o complexo de todos os direitos, vinculações, expectativas jurídicas, ónus, poderes e faculdades que compõem a posição ou cada uma das posições de membro dessa sociedade [clxxix] .

82. A participação accionária é a posição jurídica correspondente a cada uma das unidades em que o capital social, na sociedade anónima [clxxx] , se divide (cf. o art. 271 CSC), podendo, portanto, um sócio ter tantas participações sociais quantas as fracções de capital que subscreveu. Cada uma destas participações constitui uma posição jurídica autónoma, mesmo quando várias delas pertencem a uma mesma pessoa [clxxxi] .

83. Ela não se confunde com a qualidade de sócio, que, numa sociedade anónima perfeitamente constituída, é um atributo pessoal de quem é titular ou contitular - com eficácia perante a sociedade - de, pelo menos, uma acção [clxxxii] , e deve ser distinguida da posição jurídica global do membro da corporação, uma vez que esta não só não coincide tipicamente com a posição correspondente a uma das unidades em que o capital social de determinada sociedade se divide, como pode nem coincidir com a soma das participações de que uma pessoa é titular (cf. o Cap. I) [clxxxiii] .

84. Como se viu no capítulo anterior, a acção ou participação accionária deve também, tal como a participação societária em geral, distinguir-se com clareza de outras posições jurídicas, normalmente créditos, que, tendo nela a sua origem, dela podem vir a autonomizar-se no decurso da vida da sociedade, ou que absorvem ou representam (pelo menos em parte) o seu valor ou contravalor económicos, como acontece, nomeadamente, nos casos de dissolução da corporação ou de amortização [clxxxiv] . Esta questão será tratada no número a seguir.

2 - A participação social como posição numa relação jurídica fundamental e como unidade incindível. A questão da sua natureza jurídica, em especial, a questão da sua qualificação como direito subjectivo e como posição contratual

85. A participação social é - numa das perspectivas da figura - a posição jurídica complexa que tem o sócio numa relação jurídica fundamental, de carácter social ou corporativo, tendo como conteúdo aquele conjunto de posições jurídicas mais simples que lhe cabem enquanto membro da sociedade e que lhe asseguram, no essencial, uma certa medida de participação na fortuna, na vida e nos destinos desta, impondo-lhe, ao mesmo tempo, uma determinada medida de participação nas suas necessidades e nos riscos do empreendimento social (cf. também supra, 1).

Nas sociedades de pessoas, essa relação é uma só e constitui-se, originariamente, em consequência do acto constitutivo da sociedade ou de acto posterior de adesão. Nas sociedades por quotas e na sociedade anónimas, viu-se no capítulo anterior que, no direito alemão, a relação surge, originariamente, como consequência da subscrição de uma quota ou de uma unidade de capital, com a inscrição da sociedade ou de um aumento de capital no registo comercial [clxxxv] . Face ao direito português, esta doutrina é também de aceitar. Importa, no entanto, ver mais de perto a questão do momento em que nasce a posição jurídica accionária.

86. No direito anterior ao código das sociedades comerciais, podendo entender-se que a sociedade anónima como tal surgia com a respectiva escritura pública de constituição, a acção, como posição jurídica autónoma correspondente a uma das unidades em que o capital social se divide, também nasceria nessa altura [clxxxvi] . Hoje, porém, a situação alterou-se. De acordo com o art. 5 do código, a sociedade anónima (como as demais sociedades comerciais e tal como acontece no direito alemão) só existe como tal, isto é, de acordo com o art. 271, como sociedade com o capital dividido em acções, a partir da inscrição no registo comercial do seu acto constitutivo. É, portanto, a partir desta inscrição que o princípio da divisão do capital em unidades a que correspondem posições jurídicas autónomas (acções) se torna juridicamente eficaz. Isto não significa a negação, antes do registo, da existência de uma sociedade e de participações sociais. O próprio art. 274 CSC dispõe claramente que a qualidade de sócio surge com a outorga do contrato de sociedade ou da escritura de aumento de capital, o art. 88 determina que, para efeitos internos, as participações (de qualquer sociedade) se consideram constituídas a partir da celebração da escritura de aumento de capital e o art. 37.2 prevê a transmissão por acto entre vivos de participações sociais de sociedades não registadas (qualificáveis como SQ, SA, etc., em formação quando já existe um válido título constitutivo). O que parece não haver sem o registo é a participação accionária tal como tem vindo a ser caracterizada, susceptível de ser titulada (cf. o art. 304.6 CSC) ou registada em conta (cf. o art. 2 do DL 229-D/88, de 4 de Julho), e objecto autónomo do tráfico. Os arts. 5 e 304.6 CSC [correspondentes ao § 41 (1) e (4) AktG, que baseia idêntica conclusão por parte da doutrina germânica], interpretados à luz do art. 271 CSC (correspondente ao § 1 AktG), apontam nesse sentido, e o regime de transmissão estabelecido pelo art. 37.2, juntamente com o facto de o art. 88 se referir apenas à eficácia interna do aumento do capital, parecem confirmar esta conclusão [clxxxvii] .

a) A participação social como posição jurídica fundamental, distinta dos direitos que têm nela a sua fonte e daqueles que lhe podem «suceder»

aa) 87. Tal como os direitos que incidem sobre os frutos de um prédio rústico ou os relativos às rendas (também elas frutos, embora frutos civis, cf. o art. 212 CC) de um prédio urbano arrendado não se confundem com a propriedade do imóvel nem com a posição de locador na relação locatícia, assim também são realidades distintas a participação social e os direitos que o legislador designa como seus «rendimentos» (cf. o art. 6.1 do DL 408/82, de 29 de Set.).

I. Na verdade, o direito de propriedade constitui uma situação jurídica complexa e final de protecção acordada, de forma directa e especial, pela ordem jurídica a um sujeito, que lhe permite o aproveitamento pleno e exclusivo de uma coisa corpórea [clxxxviii] . Esta tutela realiza-se, nomeadamente, através da atribuição ao proprietário da faculdade ou poder [clxxxix] de fruição da coisa, a que o código civil (art. 1305, cf. também o art. 2169 do CC de 1867) chama direito, mas que, na realidade, constitui uma posição não autónoma, instrumental relativamente à propriedade, integrante do seu conteúdo, e, como tal, dela indissociável. O proprietário, embora tenha o poder de dispor da sua propriedade (cf. o art. 1305 CC), não pode separar e transmitir autonomamente a sua faculdade de fazer frutificar a coisa e de perceber os seus frutos. Quando, porém, estes adquirem existência autónoma, passa a incidir sobre eles um direito de propriedade distinto da propriedade fundiária, de que o seu titular pode dispor. Além disso, o facto de a propriedade do imóvel incluir aquela faculdade de fruição traduz-se em que o seu titular já é, presentemente, detentor de uma “expectativa jurídica” relativa aos frutos futuros da mesma, expectativa que ele pode, igualmente, transmitir a terceiros. Mantendo-se a propriedade nas mãos do alienante, quando os frutos se autonomizam, a expectativa converte-se em direito de propriedade. Se, todavia, o alienante da expectativa transmite ou perde, entretanto, por outro modo, a propriedade do imóvel, a faculdade de fruição passa a pertencer ao novo titular e, no conflito que se gera entre o direito de propriedade e aquela expectativa, deve prevalecer o primeiro.

Ao mesmo resultado se chega através da perspectiva clássica do fenómeno. O proprietário do prédio pode dispor dos frutos deste relativos, por exemplo, aos anos X, Y e Z, que hão-de vir. De acordo com o art. 408.2 CC, o efeito translativo do contrato de alienação de coisa futura dá-se quando o alienante se torna seu proprietário, o que, no caso dos frutos, acontece no momento da sua colheita, isto é, quando eles adquirem existência jurídica autónoma. Mantendo o transmitente a titularidade do prédio, no momento da colheita, surge na sua esfera jurídica um direito novo sobre os frutos que, por força do contrato de alienação, se transmite para a pessoa neste indicada. Se, porém, a propriedade do imóvel é, entretanto, alienada, os frutos já nascem na titularidade do adquirente desta e o pressuposto geral de que depende a produção pelo contrato de alienação do seu efeito translativo – o do aparecimento do direito objecto deste contrato na esfera jurídica do alienante – deixa de se verificar. A falta desse pressuposto impede o contrato de actuar. No conflito entre o direito actual do novo proprietário e o direito futuro do «adquirente» dos frutos, o primeiro prevalece. A lei confirma expressamente este entendimento em caso de penhora, dispondo o art. 842.1 CPC (hoje, 758.1) que a penhora do prédio abrange os seus frutos, naturais ou civis, nada indicando que esta disposição deva ser interpretada com a ressalva de anterior cessão dos frutos, uma vez que o mesmo princípio resulta também dos arts. 821, 1058 - este relatvo à locação - e, ainda, 408.2 do CC (cf., ainda, o n.º 2 daquele art. 842 CPC, a respeito dos frutos pendentes).

II. 88. Vejamos a situação no caso da locação. O proprietário do prédio “onerado” com um direito de arrendamento [cxc] tem um «direito» ao pagamento das rendas respectivas, isto é, de perceber estes frutos civis da sua propriedade. O direito ao pagamento da renda correspondente ao período de tempo já decorrido é um direito actual, vencido ou não, que, obviamente, não se confunde com a propriedade nem tão pouco com a relação locatícia em si, que constitui a sua fonte, sendo objecto autónomo de negócios jurídicos (cf. os citados arts. 1058 e 821 CC, in fine). Mas o locador pode também “alienar a sua expectativa de rendas futuras” ou, na construção dominante do fenómeno, pode dispor dela na qualidade de direitos futuros. Mantendo ele esta sua qualidade de locador no momento em que estes se tornam actuais, o contrato de alienação opera a transmissão de tais direitos. Se, porém, a perder, entretanto, os direitos nascem na esfera jurídica do novo locador, o que impede aquele contrato de actuar a transmissão (cf. o art. 1058 CC). Situação semelhante se verifica em caso de penhora (arts. 821 CC e 842 CPC) [cxci] .

III. 89. Observemos agora a situação do titular de participação social. Uma sociedade comercial é, tipicamente, titular - ou beneficiária - de uma posição no mercado de um determinado bem ou serviço, normalmente conquistada ao longo de anos, à custa de importantes investimentos, e assente numa organização de factores de produção mais ou menos importantes. A esta organização de mercado chama-se estabelecimento ou empresa, num dos sentidos em que esta palavra é usada [cxcii] .

Apesar de o titular da empresa ser a sociedade, o seu valor económico, e nomeadamente o rendimento que ela produz, é – ou está na disponibilidade, em certos termos – dos sócios que nela investem o seu capital e, porventura, o seu esforço, conhecimento e engenho, chegando mesmo, em muitos casos, a empenhar o seu crédito pessoal. A participação social traduz-se numa forma especial de afectação deste valor. Ela é, portanto, uma situação jurídica final e complexa de protecção acordada pela ordem jurídica a quem é membro de uma sociedade (e reforçada, eventualmente, com disposições especiais do contrato de sociedade), que lhe permite participar, em determinada medida, no aproveitamento do valor da empresa social (e, mais latamente, no valor do património social, típica e essencialmente empresarial).

90. Esta protecção dá-se - ou efectiva-se - através da atribuição ao sócio de um conjunto de faculdades e poderes instrumentais a que a lei, tal como acontece no caso da propriedade, chama direitos (direito ao lucro, direito ao voto, etc.), mas que, na realidade, não têm mais autonomia do que a faculdade de fruição ou outras faculdades e poderes do proprietário. Por outro lado, tal como no caso da propriedade, embora a posição de sócio seja essencialmente activa, inclui também posições passivas: eventuais vinculações (obrigação de entrada, «obrigação» de efectuar prestações suplementares, etc.), ónus e sujeições (pense-se, por exemplo, no poder de amortização de participações sociais atribuído pelo pacto social à sociedade). Também estas são indissociáveis daquela situação jurídica final e complexa.

No que se refere aos poderes de fazer «frutificar» e de perceber os rendimentos do objecto da afectação legal, a situação do sócio é muito menos forte do que a do proprietário, uma vez que a sua posição jurídica é de simples participação, no quadro de uma organização societária mais ou menos dominada por princípios corporativos. E, mesmo que o sócio tenha, eventualmente, um direito estatutário ao lucro, a sua posição, no que se refere à percepção de rendimentos, é também menos segura do que a do locador. Em qualquer caso, porém, é manifesto que, uma vez colhidos os frutos, decorrido o prazo correspondente às rendas, deliberada a distribuição de lucros ou aprovado o balanço que atesta a existência de lucros disponíveis no caso referido em último lugar, o proprietário, o locador e o sócio têm um direito novo, autónomo relativamente à propriedade, à relação locatícia e à participação social. E é também evidente que, antes de estes factos ocorrerem, todos eles têm (quando muito) uma simples expectativa jurídica ou, dito de outro modo, relativamente aos rendimentos ainda não presentes, pode haver um tráfico jurídico, mas apenas de direito futuros, emergentes de uma relação jurídica fundamental cujo desaparecimento, entretanto, fará com que deixe de existir um pressuposto geral de aquisição desses direitos por quem os «adquiriu» na qualidade de direitos meramente futuros.

91. Deixando agora de lado os lugares paralelos e centrando a análise na participação social, observa-se, ainda, o que se segue. Em primeiro lugar, tendo havido uma deliberação de distribuição de lucros, o sócio tem um direito actual, de crédito, relativo à parte que lhe cabe nesses lucros. Este direito não se confunde com a participação social que constitui a sua fonte. Ele tem uma existência autónoma. Como direito de crédito que é, está, no entanto, sujeito ao regime geral deste tipo de direitos, nomeadamente à regra da oponibilidade de excepções pessoais pela sociedade (v.g. a excepção de compensação) tanto ao sócio, como a eventual cessionário do crédito (cf. o art. 585 CC). A sua transmissão por acto entre vivos está sujeita ao regime dos arts. 577 e seguintes do CC (ou, eventualmente, ao do título, se o direito for titulado) e não ao regime de transmissão próprio da participação social (ainda que o desta possa compreender em boa medida regras semelhantes - cfr. o art. 588 CC e o que se viu a respeito do direito alemão). A lei reconhece expressamente a natureza creditícia e a autonomia deste direito no art. 239.1 CSC, embora a sua expressão não seja feliz (cf. também os arts. 217.2, 294.2 e 301 CSC e o art. 6.1 do DL 408/82).

92. Na verdade, o legislador não se exprime com propriedade ao incluir o direito ao dividendo deliberado naquilo a que chama os «direitos inerentes» à participação social, categoria que abrange também aquele conjunto de faculdades, poderes e expectativas jurídicas que integram o conteúdo desta (cf., igualmente, os art. 23.4 e 302 CSC). Com efeito, quer se qualifique a participação como um direito, quer se considere que ela é uma simples posição contratual (ou uma posição jurídica de natureza especial, cf. infra), o direito ao dividendo deliberado deve considerar-se como um direito autónomo em relação à posição jurídica fundamental que constitui a sua fonte, podendo o titular da participação dispor dele mantendo esta e vice-versa, e constituindo as duas realidades objectos distintos de penhora (cf., ainda, os arts. 239.1 e 301 CSC e 6.1 DL 408/82). Por outro lado, o chamado direito ao lucro ainda não deliberado (salvo o caso acima referido de já haver uma afectação estatutária de lucro actual) não é mais do que uma simples faculdade indissociável da participação de cujo conteúdo faz parte. Tanto quanto se pode afirmar é que ele fundamenta a “existência de uma expectativa jurídica” de que o titular pode dispor, ou, noutra perspectiva, que o sócio pode alienar o seu eventual direito ao lucro relativo a um ou mais anos determinados na qualidade de direito futuro. Neste caso, mantendo o sócio a titularidade da participação, ao tempo da deliberação de distribuir os dividendos objecto da transacção, aquela expectativa jurídica converter-se-á em direito, ou dar-se-á a aquisição (originária) de um autónomo direito ao dividendo pelo sócio que, por força do contrato de alienação, será (derivadamente) adquirido por aquele a quem este contrato o atribui. O regime desta alienação é o da cessão de créditos (arts. 577 e ss CC; no caso da compra e venda, cf. também o art. 880).

93. Especiais problemas podem levantar-se se o direito estiver documentado por título ao portador, nos termos do art. 301 CSC. O seu tratamento já extravasa, no entanto, largamente o âmbito deste trabalho. Em todo o caso, é de referir que tal título parece dever ser considerado como meramente declarativo e casual, o que poderá ser importante para a resolução da questão da oponibilidade ou não, pela sociedade, de eventuais excepções fundadas na relação jurídico-societária. Em muitos casos, porém, a oponibilidade de tais excepções esbarrará com a impossibilidade prática de determinar a precedência na titularidade.

94. Caso o sócio perca, entretanto, a titularidade da participação social, de acordo com o regime dos direitos futuros que se extrai dos arts. 408.2, 1058 e 821 CC e também, de certo modo, dos arts. 239.1 CSC e 842/863 [hoje, 758/783] CPC, os seus eventuais actos de disposição relativos a direitos dessa natureza tornam-se, no que se refere à transferência (ou oneração) destes, definitivamente ineficazes.

95. Também aqui podem surgir problemas especiais se as acções estiverem munidas de cupões ao portador relativos ao pagamento de dividendos, que o sócio entregou ao seu “transmissário”, e se, posteriormente, a acção for alienada, sem se perceber que tinha cupões, ou for objecto de penhora. No primeiro caso, o direito de crédito que o cupão deveria representar já nasce na esfera jurídica do novo titular da participação, e, no segundo, é compreendido pela penhora (cf. os arts. 239.1 CSC, embora relativo às SQ e os arts. 821 CC, embora relativo às rendas ou alugueres, e 842/863 CPC). O aprofundamento deste tema não cabe aqui fazê-lo. É de referir, em todo o caso, que a lei contém elementos para considerar que a emissão e negociação do título só se dá validamente com o nascimento do direito (cf. os termos do art. 301 e o caso do título accionário: art. 304.6).

96. É altura de resumir as principais conclusões que se extraem desta exposição. Em primeiro lugar, a participação social deve ser claramente separada do direito ao dividendo deliberado, que, embora se funde na participação social, dela foi autonomizado (a sua fonte jurídica é a deliberação de distribuição de lucros), tendo um regime autónomo de circulação e constituindo um objecto penhorável distinto daquela.

Em segundo lugar, é de notar que, quando o legislador fala em direitos inerentes à participação social, está, na realidade, a referir-se, por um lado, a direitos patrimoniais desta índole - que são créditos juridicamente autónomos e não “inerentes” a essa participação - e, por outro lado, a direitos que integram o seu conteúdo, pertencendo ao sócio enquanto sócio, e outras realidades (situações jurídico-sociais) que nem são qualificáveis como direitos, estando em causa, nestes casos, simples componentes não autónomas da mesma e dela indissociáveis, por razões organizativo-funcionais e relativas ao tráfico (mormente tráfico accionário), ainda que se entenda a participação social como mera posição contratual [cxciii] .

Em terceiro lugar, o sócio, tal como o proprietário rural, o locador, etc. (imagine-se também, por exemplo, um licenciador de patente ou de marca por cuja licença são devidos “royalties”, a pagar periodicamente pelo licenciado), pode dispor dos rendimentos (esperados) da sua participação social na qualidade de direitos futuros (ou da expectativa jurídica àqueles relativa, admitindo-se que ele tem uma verdadeira expectativa jurídica e que esta pode ser objecto de transacções). Esta disposição fica, no entanto, sujeita às regras gerais da transmissão dos direitos desta natureza, nomeadamente ao princípio que se extrai dos arts. 408.2, 1058 e 821 do CC.

97. Resta acrescentar que o eventual conflito de adquirentes de um direito alienado como direito futuro se resolve, na falta de disposição especial da lei, de acordo com a regra geral da prioridade temporal [cxciv] .

IV. 98. Tendo presentes estes princípios, vejamos, finalmente, o que poderá acontecer se o art. 183 CSC (correspondente ao art. 999 CC e aos §§ 135 HGB, 725 BGB e 759 I ZPO, de que se tratará no título seguinte) - reflexo do carácter pessoal da SNC e da correspondente participação social, que obsta a uma normal execução desta, com possível aquisição por um terceiro da qualidade de sócio (envolvendo em regra a própria qualidade de gerente) - for literalmente interpretado. A execução do direito aos lucros nele referida (e também da quota de liquidação), por um credor particular do sócio, abrange, naturalmente, um eventual direito de crédito já existente. Mas é notória a intenção do legislador de abranger também os direitos futuros. Considere-se, quanto a estes, em primeiro lugar, que o sócio dispôs antecipadamente dos mesmos. Pelo princípio da prioridade temporal, a cessão será oponível ao credor exequente. Em segundo lugar, admita-se uma penhora eficaz de tais direitos e uma alienação subsequente da parte social (ou quota, na sociedade civil). Esta tornará [abstraindo das regras do registo – cf. o art. 3e) CRCom] a penhora sem objecto.

99. Este resultado é manifestamente contrário à própria letra (que fala num direito aos lucros) e ao espírito da lei, pelo que, em meu entender, o art. 183 deverá ser interpretado no sentido de que o credor pode penhorar a própria participação social (como acontece no art. 239.1), mas para os efeitos limitados da realização executiva do seu valor de liquidação e de rendimento, mantendo, entretanto, o sócio a sua posição de sócio, com os direitos inerentes, mas onerada com a penhora. É de referir, aliás, que o correspondente art. 999 CC não levanta qualquer dificuldade, mesmo literal, a esta interpretação. O credor tem, na hipótese do n.º 1 (suficiência de outros bens do sócio devedor), o direito de penhorar apenas o direito aos lucros e à quota de liquidação. No caso do n.º 2 (insuficiência de outros bens penhoráveis), ele deverá ter a opção: ou por uma penhora com este objecto, ou pela penhora da própria quota para efeitos de liquidação da mesma [cxcv] .

100. Lendo literalmente os preceitos, no caso do art. 183, importa ter presente, por um lado, que a penhora do direito aos lucros e à quota de liquidação está sujeita a registo [art. 3.1e) do CRCom]; por outro lado, que, na venda executiva de tais direitos - sendo ela necessária por o sócio executado não ter outros bens suficientes para satisfazer o exequente e por impossibilidade legal de liquidação da parte social (por força das regras da intangibilidade do capital social) - há preferência dos demais sócios (n.º 5), tendente a minorar os inconvenientes de uma dissociação entre a titularidade da participação social /qualidade de sócio e da respectiva componente patrimonial (direito aos lucros e à quota de liquidação). Mas existirá, realmente, uma (excepcional) dissociação, oponível a quem venha eventualmente a adquirir a parte social: seja uma dissociação plena (desmembramento da participação social, que fica amputada da componente patrimonial), seja uma dissociação apenas material, se entender que a penhora e a venda executiva, oponíveis erga omnes, incidem sobre créditos futuros.

Entendendo-se que a penhora deve incidir sobre a própria participação, com efeitos circunscritos à realização executiva do seu valor, haverá uma espécie particular de oneração desta, semelhante a um usufruto limitado à componente patrimonial (acerca deste em geral, cfr. o art. 1467 CC), em linha com o usufruto de participações sociais admitido nalguns outros ordenamentos jurídicos.

bb) 101. Outro direito que a lei reconhece expressamente como autónomo relativamente à participação social é o direito de subscrição preferencial de novas quotas ou acções em caso de aumento de capital (ou, mais genericamente, de participação preferencial em aumentos de capital que venham a ter lugar) – cf. os arts. 267 e 458.3 do CSC.

O direito nasce com a deliberação de aumento do capital, podendo ser objecto de alienação pelo seu titular, quer como direito já actualmente existente, quer como direito futuro. A lei, no caso das quotas, sujeita-o, no entanto, a um regime de alienação, substancialmente, coincidente com o da cessão da quota a que ele se refere (art. 267) e, no art. 239.1, considera (implicitamente) que, mesmo quando já concretizado, a penhora da quota o abrange (embora este segundo caso tenha uma importância prática pequena face ao disposto no art. 266.5 e só possa ocorrer, naturalmente, se existir na titularidade do executado ao tempo em que a penhora começar a produzir os seus efeitos).

I. 102. O mesmo não acontece, como se viu, com o direito ao lucro. Quanto a este, tratando-se de um direito já existente ao tempo da penhora da quota, a consequência lógica da sua autonomia é, na verdade, a de que tal penhora não o abrange; ele constitui um objecto de penhora distinto da participação social (art. 239.1 CSC). Por outro lado, ele é um puro “rendimento” da posição de sócio (um seu “fruto”civil [cxcvi] ), um crédito de carácter exclusivamente patrimonial, não havendo razão para ter um regime de circulação diferente do dos créditos em geral (arts. 577 ss CC) [cxcvii] .

II. 103. A razão de ser desta diferença de regimes deriva do facto de que, sendo embora um “direito” de carácter essencialmente patrimonial, uma posição jurídica autónoma em relação à participação social, o direito de preferência tem uma função instrumental relativamente a esta e participa, por isso, de uma certa dimensão pessoal que, no caso das sociedades por quotas, ela tem e, no caso das sociedades anónimas, lhe pode ser conferida pelos estatutos.

O seu exercício não se traduz, na verdade, na simples obtenção de uma soma pecuniária, mas, em regra, na conservação da medida da participação do sócio na sociedade – fim principal da atribuição do direito – e, no caso de ser alienado, na possível entrada de estranhos para esta ou numa ruptura do equilíbrio nela existente. A sociedade por quotas tem, tipicamente, um interesse legítimo, reconhecido expressamente pelo legislador (em especial, arts. 228 ss), em evitar a produção deste resultado, pelo que, mesmo na ausência de uma disposição especial (que, de facto existe, art. 267), deveria entender-se que, sendo vinculada a quota, também o deverá ser este direito [cxcviii] (26).

Quanto à sua inclusão no objecto da penhora de quota mesmo quando já é um direito actual, é de notar, antes de mais, que, na realidade, tal penhora incide sobre duas realidades distintas: a quota e o direito de subscrição preferencial. A extensão legal do seu objecto não tem, nesta medida, uma justificação totalmente evidente, podendo para o credor ser suficiente a execução da quota. O legislador parece, no entanto, ter partido do pressuposto de que, dada a referida função instrumental do direito, é de crer que, na falta de elementos interpretativos capazes de levar a outra conclusão, o credor, ao executar a quota, queira também abrangê-lo no objecto da execução.

cc) 104. Resta acrescentar que outros direitos como o direito à quota de liquidação ou os direitos que o sócio venha a ter em caso de exoneração (cf., nomeadamente, os arts. 105, 185 e 240 CSC), de exclusão (arts. 186 e 241 s), de amortização de quotas ou acções (arts. 232 ss, 347), etc., também não se confundem com a participação social em si. O problema da sua transmissão enquanto direitos futuros (e eventuais) põe-se em termos análogos aos que foram vistos para o direito ao lucro. Diferentemente, porém, do que acontece com este, tais direitos atribuem ao sócio o valor (substancial, não apenas de rendimento) que no seu património era representado pela participação social, formam-se à custa do valor económico desta, devendo aplicar-se-lhes o regime de sub-rogação previsto nos arts. 823 e 692/678 CC (cf. o art. 235.2 CSC).

105. No que se refere ao chamado direito à quota de liquidação, em especial, é de notar que, ocorrendo a dissolução da sociedade, o sócio mantém a sua participação social, agora numa sociedade em liquidação, até ao encerramento desta (cf. os arts. 146, 304.7 e também 161 e 160 CSC). Com a deliberação que aprova o projecto de partilha do activo de liquidação (cf. o art. 157), ela fica, porém, em geral, sem o objecto de afectação que tinha até aí, é esvaziada do seu valor económico, que passa para os novos direitos (que então se constituem) relativos aos bens que integram aquele activo ou ao seu contravalor.

A participação mantém-se ainda, até ao encerramento da liquidação, e pode ser negociada, se houver algum interesse nisso. No património do sócio existem, no entanto, novos direitos, ou um novo direito, que atribuem ao sócio o valor económico anteriormente representado por ela e que constituem, naturalmente, objecto(s) autónomo(s) do tráfico. Uma eventual transmissão daquela não afecta a sua titularidade.

b) Natureza corporativa da participação social. A questão da sua qualificação como direito subjectivo e como posição contratual

106. Como se viu amplamente no capítulo anterior, a questão da qualificação da MITGLIEDSCHAFT como direito subjectivo não é pacífica na doutrina alemã. Há, no entanto, um sector favorável a tal qualificação, podendo esta considerar-se mesmo doutrina geral no caso das acções e das quotas de sociedade por quotas. É também opinião geral – embora com algumas vozes discordantes no que se refere às sociedades de pessoas – a de que a MITGLIEDSCHAFT constitui uma posição jurídica de carácter corporativo, isto é, de uma natureza especial, não recondutível aos direitos reais nem aos direitos de crédito, nem identificável com uma simples posição contratual [cxcix] .

O problema não tem, que eu saiba, sido objecto de atenção especial por parte da doutrina helvética, podendo, no entanto, dizer-se que o panorama não é muito diferente daquele que existe na Alemanha [cc] .

107. Na Itália, há um grande número de autores que qualifica pelo menos o conjunto das faculdades patrimoniais do sócio ou a “qualidade de sócio em si” como um direito subjectivo [cci] . A doutrina actualmente dominante considera, no entanto, que estamos perante uma simples “posição contratual” [ccii] .

Há também quem considere a posição de sócio (ou de accionista em especial) como um status [cciii] , uma qualidade jurídica da qual derivam sucessivos direitos, e quem lhe atribua uma dupla natureza, de posição de parte num contrato de organização e de status, entendido este como a posição de “contraente nell ordenamento giuridico privato-società, la relazione intercorrente fra il singolo e il grupo personificato” [cciv] [ccv] .

108. Em França, a doutrina tradicional, movendo-se no quadro restrito do direito real e do direito de crédito, qualifica, pelo menos a posição activa do sócio, como direito de crédito, enquanto alguns autores mais modernos consideram que estamos perante um direito sui generis [ccvi] .

109. Em Portugal, não há, nesta data (1989), estudo sobre o assunto digno de nota. Abstraindo deste facto, a situação doutrinal aproxima-se, de certa forma, da existente em Itália, notando-se, todavia, uma certa influência do pensamento jurídico germânico. Assim, a participação social – ou, pelo menos, a posição activa que lhe corresponde, única que parece estar presente no espírito dos autores mais antigos – é correntemente qualificada como um direito subjectivo, de natureza social ou corporativa [ccvii] , embora, por vezes, isso não pareça significar mais do que uma mera fórmula sintética de referir uma posição jurídica complexa de carácter unitário, composta por elementos de natureza variada. Mas, em especial, a posição de sócio nas sociedades de pessoas e a quota nas sociedades por quotas aparecem também qualificadas por alguns autores como posições contratuais [ccviii] .

aa) 110. Uma apreciação em profundidade da situação doutrinal relativa a esta questão não cabe nos limites deste trabalho. Importa, no entanto, traçar brevemente o panorama existente.

Os resultados da doutrina germânica e da doutrina suíça (em parte), com as ressalvas acima feitas, podem, em larga medida, considerar-se conclusivos, uma vez que a questão da qualificação é por elas referida à “participação social” tal como foi acima caracterizada.

Como tendência geral, pelo menos, pode, pois, afirmar-se que, para os autores germânicos e hevéticos, a participação social é uma posição jurídica complexa de carácter corporativo, não recondutível, portanto, às situações jurídicas reais e obrigacionais, e susceptível de ser qualificada como um direito subjectivo.

Quanto à doutrina francesa, a única conclusão útil que pode tirar-se é a de que há modernamente uma tendência para superar a concepção tradicional da participação social como puro direito de crédito, concepção manifestamente insuficiente para explicar todo o seu contudo (activo e passivo).

Na doutrina italiana, nota-se também uma tendência, entre os partidários da qualificação da participação social como direito subjectivo, para o reconhecimento de que este não é recondutível ou, pelo menos, redutível a um direito de crédito ou a um direito real. Na medida, porém, em que o verdadeiro objecto da qualificação é apenas a posição activa do sócio ou, mesmo, tão só o conjunto formado pelos chamados direitos patrimoniais, o resultado a que se chega é, para a determinação da natureza da própria participação, limitado. Verdadeiramente, este estado de coisas reflecte a impossibilidade de qualificar como direito subjectivo uma realidade complexa como a participação social sem rever a concepção que dele tem a doutrina tradicional dominante. O problema não é especificamente italiano, pondo-se nos mesmos termos entre nós. Não creio, no entanto, ser necessário, para os fins deste trabalho, tratar aqui da questão. Para determinar o objecto da transmissão das acções é, sem dúvida, importante definir o conteúdo e a natureza da participação social e, em particular, da participação accionária, mas o problema não reside verdadeiramente na sua qualificação ou não como direito subjectivo, como se verá.

111. Deve, em todo o caso, referir-se que as novas concepções do direito subjectivo como situação jurídica final e complexa, essencialmente activa mas podendo incluir também elementos passivos, permitem uma qualificação da participação social como direito subjectivo, o que é, aliás, demonstrado pela análise, em especial, da doutrina germânica. É possível também considerar a própria qualidade de sócio como um bem ao qual são inerentes todas as posições activas e passivas que formam o conteúdo da participação social, mas, no caso da participação accionária, esta esta construção pode tornar-se inutilmente complicada ou divorciada dos textos legais, na medida em que o objeto da atribuição jurídica parece ser, directamente, a própria ação - unidade de valor - e não a qualidade de sócio que lhe é «inerente».

112. Finalmente, poderia ainda considerar-se que, verdadeiramente, pela sua função instrumental, a sociedade-pessoa jurídica é simultaneamente sujeito de direito e objecto de um direito de “domínio” de que são titulares os sócios e que a participação social é uma quota do mesmo ou, evocando a SAVIGNY (supra, n.º 54), uma quota de compropriedade, não da empresa social, como este autor defendia, mas da própria sociedade com a respetiva empresa. Esta perspectiva teria a vantagem de contribuir para esclarecer a natureza de tal direito – manifestamente de carácter não meramente relativo, dando a esta palavra o sentido de que ela tem para a doutrina tradicional -, para compreender o fenómeno da unipessoalidade, etc., mas, para além de que só nas sociedades de capitais ela é susceptível de captar realmente o fenómeno, a sua eventual adopção passaria por um tratamento da natureza da personalidade jurídica das sociedades em termos inteiramente novos, o que não pode aqui ser feito. N.A.: Acerca deste ponto de vista, entretanto adoptado também por um conhecido economista (K. IWAI, 1999), veja-se Evaristo MENDES, «Governança societária e justiça intergeracional», in Justiça entre Gerações, coord. de J. P. Silva e G. A. Ribeiro, Lisboa (UCE) 2017, p. 544 e s, e «Aquisições potestativas no artigo 490 do CSC», V Congresso DSR, Coimbra (Almedina) 2018, p. 349. Se bem compreendemos o pensamento do autor, PAIS DE VASCONCELOS defendeu, igualmente, em tempos mais recentes, ideia semelhante (cf. A participação social (2006), cit., p. 370 e ss). Já antes, pode ver-se o curto escrito de BUCHWALD, «Zum Wesen des GmbH-Geschäfstanteils», GmbH-Rundschau 2/1962, p. 25 e s, de que, no entanto, só tivemos conhecimento alguns anos depois da entrega da presente dissertação.

bb) 113. A estreiteza do conceito tradicional do direito subjectivo e os resultados pouco satisfatórios a que conduziu a análise da natureza da participação social utilizando este conceito levaram a doutrina italiana hoje dominante e parte da doutrina portuguesa a dar à participação um novo enquadramento dogmático, reconduzindo-a, pelo menos nalguns tipos sociais, à figura da posição contratual, cuja cessão é regulada nos arts. 1406 e seguintes do CCit e 424 e seguintes do CC.

I. 114. Este novo enquadramento tem, sem dúvida, o mérito de traduzir de forma clara a superação das concepções que reduzem a participação ao direito ao lucro e à quota de liquidação ou a um simples direito de crédito. Em termos práticos, ele significará, nomeadamente, que, em caso de cessão, a regra relativa à oponibilidade de excepções por parte da sociedade não será, no caso português, a do art. 585 do CC, mas a do art. 427 do mesmo código [ccix] .

115. Ao mesmo resultado se pode chegar, porém, por outras vias. Em primeiro lugar, partindo de uma noção mais abrangente do direito subjectivo e considerando a participação social como um direito de natureza especial, não creditícia, nomeadamente, um direito corporativo (cf., neste caso, o art. 588 CC) [ccx] . Em segundo lugar, vendo nela, simplesmente, uma posição fundamental de carácter corporativo, correspondente, no domínio das obrigações, à figura da posição contratual, mas distinta desta porque os fenómenos associativos constituem uma realidade com características próprias, como o demonstra a existência de um direito associativo privado distinto do direito das obrigações [ccxi] .

116. Vejamos, no entanto, as demais disposições legais que compõem o regime da cessão da posição contratual. Os arts. 425 e 426.1 do CC não contêm normas verdadeiramente específicas da cessão da posição contratual (cf., em especial, os arts. 578.1 e 587.1 CC [ccxii] ). A norma do art. 426.2 é sem interesse. Fica-nos, portanto, o art. 424. Comecemos pelo n.º 2. Como se pode ver pelo seu confronto com os arts. 583 CC, 228.3 e 182.4 CSC, também a norma nele contida tem um conteúdo comum à cessão de créditos – e outros direitos nos termos do art. 588 CC – e à cessão da participação social. Isto só não será assim se se entender que, no art. 424.2, a cessão é ineficaz mesmo inter partes, mas, em tal caso, será o regime da posição contratual que se afastará da regra geral contida nos restantes preceitos. Há, no entanto, uma diferença entre o direito societário, por um lado, e o regime da cessão de créditos e do contrato, por outro: enquanto neste a notificação está sujeita à regra geral da liberdade de forma, no direito societário exige-se a forma escrita. O legislador reconheceu, portanto, expressamente, que, neste aspecto, o regime geral da cessão civil é inadequado para a cessão da participação social (pelo menos numa sociedade regulada pelo CSC).

Na verdade, o legislador não regula a transmissão da participação accionária não titulada nem registada em conta nos termos do DL 229-D/88, de 4 de Julho. Do ponto de vista do direito societário, não há, no entanto, razões para não a admitir [ccxiii] e, sendo este o caso, as mesmas razões de certeza e segurança que ditaram a norma dos arts. 182.4 e 228.3 justificam que esta se lhe aplique também a ela. Nas sociedades civis, a solução é duvidosa, mas, mesmo que se conclua pela não aplicação da regra do CSC, não se estará a afirmar a aplicação de qualquer norma específica da cessão do contrato.

117. A norma mais importante é, porém, a do art. 424.1 (correspondente ao art. 1406 CCit), que faz depender a cessão da posição contratual do consentimento do cedido. Terá ela aplicação à cessão da participação social? No que se refere às acções, a regra é a oposta, isto é, em princípio, a sua transmissão é livre (art. 328.1 CSC) o que exclui, naturalmente, a sua aplicação [ccxiv] . Nas sociedades por quotas, a regra era, no domínio da lei das sociedades por quotas, de 1901, idêntica à das sociedades anónimas (art. 6) [ccxv] . O art. 228.2 CSC consagra agora, no entanto, como regra geral, a de que a eficácia da transmissão face à sociedade depende do consentimento desta. O legislador regula, portanto, especificamente a matéria, o que também exclui a aplicação do art. 424.1 CC. A única utilidade que este pode ter é a de esclarecer que o consentimento também pode, no caso da cessão de quotas, ser dado antes ou depois da cessão. Situação semelhante se verifica no caso da cessão de quotas de sociedade civil (art. 995.1 CC) e de partes sociais de sociedade em nome colectivo (art. 182.1 CSC), onde a cessão e a regra da necessidade do consentimento são muito anteriores ao próprio reconhecimento legal e doutrinal da cessão da posição contratual (cf. o art. 161 CCom).

II. 118. Se deixarmos o plano legal e nos colocarmos no da construção doutrinal da cessão do contrato, por um lado, e da participação social legal ou estatutariamente (cf. os arts. 229.3 e 328.2 (CSC) dependente do consentimento da sociedade ou dos sócios, por outro, a utilidade da recondução da cessão da participação a uma cessão do contrato também é, pelo menos, duvidosa.

O art. 1379 CCit, consagra o princípio, comum também a outros ordenamentos jurídicos [ccxvi] , de que uma convenção de inalienabilidade (de bens ou direitos) tem eficácia meramente relativa e só é válida se a indisponibilidade se limitar a um período de tempo razoável e se corresponder a um interesse digno de ser considerado.

O art. 1260 CCit permite, por seu turno, a exclusão convencional da cedibilidade de créditos, embora, diferentemente do que acontece no direito alemão [ccxvii] , ela só seja oponível ao cessionário que dela tenha tido conhecimento ao tempo da cessão. Dispõe também o art. 2355 III CCit que o acto constitutivo das sociedades anónimas pode submeter a alienação de acções nominativas a “condições particulares”, sem esclarecer, no entanto, qual o tipo de eficácia de eventuais cláusulas restritivas [ccxviii] . Em face destas disposições, põe-se na doutrina italiana a questão de saber se às restrições à livre transmissibilidade das acções deveria ser reconhecida eficácia erga omnes ou mera eficácia relativa. Alguns autores pretenderam justificar o primeiro tipo de eficácia, no que se refere à cláusula de consentimento (cf. o art. 328.2 a) CSC), argumentando que esta operaria uma reposição (ainda que de forma atenuada) do princípio estabelecido no art. 1406 do código civil italiano para a cessão da posição contratual, reposição esta permitida pelo art. 2355 III do mesmo código [ccxix] . Esta explicação não é, no entanto, inteiramente convincente.

119. Em primeiro lugar, o art. 2355 III CCit permite outro tipo de cláusulas restritivas, como a cláusula de preferência – cuja eficácia “real” é reconhecida por um sector crescente da doutrina e pela jurisprudência [ccxx] – e a cláusula de restrição do universo de potenciais adquirentes; e para estas a explicação é pelo menos duvidosa [ccxxi] .

Mas, mesmo no que se refere à cláusula de consentimento, pelo menos numa sociedade anónima (ou por quotas) de carácter capitalístico [ccxxii] , não há, verdadeiramente, uma reposição do princípio do art. 1406 CCit (ou do art. 424.1 CC). Com efeito, na cessão prevista neste preceito, o interesse do cedido em que a outra parta seja solvente e dê “garantias” de boa execução do contrato é justificação suficiente para ele não dar, pura e simplesmente, o seu consentimento à modificação subjectiva da relação contratual. No direito societário, tratando-se de acções (ou quotas) não integralmente liberadas, a lei tutela o interesse da sociedade de modo diferente, isto é, considerando o alienante como garante do pagamento das somas em dívida (cf. os arts. 2356 CCit e o art. 286 CSC, e, para as SQ, cf. também os arts. 206 s CSC) [ccxxiii] .

120. Todavia, mesmo estando as acções já pagas, o facto de a cláusula de consentimento puro e simples ser hoje considerada nula [ccxxiv] afasta a ideia de um retorno ao princípio do art. 1406 CC (e do art. 424.1 CC). Este é incompatível com o significado que a transmissibilidade tem, como se verá, na sociedade anónima [ccxxv] . As cláusulas restritivas desta transmissibilidade têm eficácia erga omnes porque representam o exercício o de uma autonomia conformadora da organização societária legalmente reconhecida e estão sujeitas a uma publicidade equiparável à das leis.

Por outro lado, a doutrina italiana – que, a partir do CC de 1942, é praticamente unânime [ccxxvi] no sentido do reconhecimento da posição contratual como categoria jurídica autónoma e como objecto unitário do tráfico [ccxxvii] – constrói o fenómeno da cessão da posição contratual como um negócio trilateral [ccxxviii] , enquanto que a doutrina dominante (incluindo destacados defensores da tese da participação-posição contratual) e a jurisprudência consideram a transmissão não consentida de acções como meramente inoponível à sociedade [ccxxix] . Situação semelhante ocorre entre nós [ccxxx] .

III. 121. Se se considerar, finalmente, o regime da participação social não relativo à sua circulação, notar-se-á também a existência de institutos próprios do direito societário que, ou não têm correspondência no regime da posição contratual, ou correspondem-lhes institutos com significados e características diferentes. Pense-se, nomeadamente, na exoneração e exclusão de sócios e na amortização de quotas e acções, por um lado, e no direito de denúncia de relação jurídica obrigacional duradoura e no direito de resolução, por outro lado. Como se verá, a doutrina alemã reconhece, hoje em dia, a existência de um princípio do direito associativo privado segundo o qual ninguém pode ficar indefinidamente “prisioneiro” da sociedade ou associação a que pertence [ccxxxi] . Este princípio tem um correspondente no direito das relações obrigacionais de carácter duradouro, mas o seu significado e conteúdo não são os mesmos nos dois casos.

IV. 122. Esta análise mostra, segundo creio, que o próprio regime jurídico existente apresenta uma profunda diferença entre a posição contratual e a participação social. O reconhecimento da existência de uma figura ampla chamada posição contratual só não terá inconvenientes práticos de maior se se tiver presente que, tal como há direitos reais, de crédito o sobre bens imateriais (para referir apenas a classificação mais vulgarizada), assim também é preciso distinguir a posição contratual emergente de um contrato obrigacional, regulada pelos arts. 1406 e seguintes do CCit e 424 e seguintes do CC, e a posição “dita contratual” emergente de um contrato associativo, regulada, para cada tipo social, pela respectiva lei. Deve, aliás, ter-se presente que o regime de circulação da participação social é muito mais desenvolvido do que o da posição contratual e que ela foi reconhecida como objecto do tráfico muito antes de a doutrina e o legislador terem feito o mesmo em relação a esta.

Em qualquer caso, mesmo querendo ver-se o regime da posição contratual estabelecido nos arts. 1406 e seguintes do CCit e 424 e seguintes do CC como o direito comum da figura, ele sempre terá uma aplicação meramente subsidiária em relação ao direito societário.

V. 123. No plano teórico a inclusão da participação social numa figura ampla de cessão da posição contratual pressupõe, por um lado, a qualificação do contrato de sociedade como um contrato com prestações recíprocas – ou a interpretação dos arts. 1406 CCit e 424.1 CC como referindo-se apenas a um dos casos possíveis da cessão – e, por outro, que o fenómeno societário seja redutível a uma simples relação contratual. Ora nenhum destes pressupostos é incontestado. E, se os dois primeiros podem ficar por analisar, o terceiro requer uma breve reflexão, porque me parece que ele não se verifica [ccxxxii] .

124. Na verdade, enquanto um contrato obrigacional (não duradouro) dá origem a uma situação meramente estática, em que a posição das partes está juridicamente pré-definida, devendo cada uma cumprir aquilo a que se obrigou, o contrato de sociedade dá origem a uma organização dinâmica cujo funcionamento é garantido por princípios mais ou menos acentuadamente corporativos consoante o tipo social (em especial, o princípio maioritário). A participação social representa uma posição jurídica nesta organização social de carácter corporativo, da qual depende a satisfação do interesse individual do sócio, organização essa que, pelo menos numa sociedade de capitais, pode, no decurso da vida da sociedade, tornar-se inteiramente diferente daquilo que era no início e passar a reger-se por regras igualmente diversas.

125. Isto determina uma diferença fundamental da posição social em relação a uma simples posição contratual (comum). A primeira, embora tenha, tipicamente, a sua origem num contrato, não é regida (a não ser numa medida limitada) pelos princípios comuns dos contratos, mas pelos princípios que regem a organização societária, no quadro da qual, em vez da paridade da relação obrigacional, se formam, em especial nas sociedades de larga base social, verdadeiras relações de poder. A satisfação do interesse de uma das partes num contrato obrigacional depende apenas do cumprimento deste pela outra. A recuperação pelo sócio do valor do seu investimento na empresa social depende da corporação: ele tem apenas o direito de participar no aproveitamento do valor daquela empresa no quadro da organização corporativa, dentro dos princípios que a regem. Além disso, porque ele tem apenas uma situação de participante, a consistência económica da sua participação está sujeita a um risco (de boa ou má fortuna e de boa ou má gestão da empresa social) que ele não controla.

126. O fenómeno sócio-participativo é, na verdade, um fenómeno complexo e multifacetado. Em primeiro lugar, a participação é uma forma especial de afectação do valor da empresa social (e também dos encargos que a sua constituição e desenvolvimento envolve). No seu conteúdo há, portanto, um núcleo de poderes ou faculdades que garantem ao seu titular uma determinada medida de participação na fortuna social (e, simultaneamente, uma obrigação de contribuir para a sua formação, que pode, porém, estar cumprida). Ela tem, assim, uma dimensão patrimonial, que lhe dá um valor de mercado, de rendimento e de liquidação. Tipicamente ela gera, periodicamente, riqueza para o seu titular que lhe é, juridicamente, atribuída através de direitos de crédito, autónomos em relação a ela. Em segundo lugar, ela tem uma dimensão corporativa, no sentido de que ao sócio é também atribuído um conjunto de poderes e faculdades de carácter administrativo. Esta dá-lhe um certo carácter pessoal, na medida em que, por causa deste seu conteúdo, a pessoa do sócio adquire uma relevância maior ou menor na organização societária (intuitus personae). É esta dimensão que explica os regimes, legal ou convencional, de transmissibilidade restrita.

127. Mas a participação tem também uma dimensão corporativa noutro sentido. O sócio tem apenas uma posição de participante no quadro da organização corporativa. Tratando-se de uma sociedade de pessoas – assente na confiança pessoal recíproca dos sócios, no seu crédito (que os torna pessoalmente garantes da satisfação dos encargos sociais) e no exercício em comum da actividade social, na típica solidariedade dos interesses dos seus membros – e vigorando em questões fundamentais o princípio da unanimidade, o sócio não necessita, em geral, de uma tutela especial. Ele pode transmitir a sua participação se encontrar um adquirente que possa vir, na opinião dos que ficam, a ocupar o seu lugar na organização pessoalizada de que faz parte, mas não tem o poder de impor aos demais a realização do seu eventual interesse em dispor da sua parte social. Prevalece aqui a segunda dimensão desta de que se falou. Mas, apesar da típica solidariedade de interesses, podem gerar-se situações que justificam a atribuição ao sócio de um direito de sair, recebendo o valor do seu investimento na empresa social (direito de exoneração). Estas podem ser externas (v.g., retracção do mercado) ou internas (v.g., marginalização do sócio pelos demais) à organização societária e pode estar em causa simplesmente a perda do interesse do sócio no exercício da empresa comum ou a necessidade de liquidar o investimento que nela tem. Confrontando os fundamentos possíveis, as consequências e o regime do direito de exoneração com os direitos de resolução e denúncia legalmente reconhecidos às partes num contrato obrigacional, as diferenças são evidentes e resultam, essencialmente, do facto de que a uma relação estática (ainda que não imutável), definida por um contrato obrigacional, se contrapõe, na sociedade, uma relação dinâmica e mutável no quadro da organização societária, isto é, a uma pura relação contratual, contrapõe-se uma relação social ou corporativa.

128. Contudo, a relação “corporativa” tem ainda gradações. Numa sociedade de pessoas, embora se distinga duma pura relação estática cujos termos têm uma definição contratual rígida, ela aproxima-se de certo modo desta. O carácter corporativo acentua-se, no entanto, nas sociedades de capitais até ao ponto de a relação sócio-sociedade deixar de ser de colaboração para se transformar numa relação de poder, como acontece, em grande parte e tipicamente, nas sociedades anónimas de larga base accionária. A esta acentuação do carácter corporativo da relação societária corresponde uma intensificação da tutela do sócio. No modelo legal, o direito de exoneração – como ser verá no título seguinte – é, em grande medida, substituído pelo direito do sócio de realizar o valor de mercado da sua participação. Como consequência desta substituição e da acentuação do carácter corporativo da relação societária, a lei garante de forma especial este direito, peça fundamental no desejável equilíbrio de poder no interior da sociedade e na protecção da liberdade individual do sócio de gerir o seu património, na medida em que este contém um valor que pode ser de grande importância e cuja consistência económica escapa ao seu poder de controlo [ccxxxiii] .

VI. 129. Em conclusão, pode dizer-se que a participação social é uma posição jurídica fundamental de carácter corporativo, direito subjectivo ou não, distinta da mera posição contratual, como não deixou de o reconhecer a doutrina alemã, que, como se viu, construiu uma teoria unitária da MITGLIEDSCHAFT e da sua circulação, autónoma em relação à cessão do contrato. À participação social aplicam-se também normas idênticas àquelas que estão contidas nos arts. 425 e 426.1 CC, mas isso já era assim antes de o código civil as consagrar. Elas não são, na verdade, específicas da posição contratual; apenas afloram, nomeadamente, nesses artigos. O mesmo deve valer para o art. 427 CC: este também não é de aplicar à participação social, directamente, a título subsidiário, constituindo um mero aforamento de um princípio igualmente aplicável a esta [ccxxxiv] . A aplicação do art. 424 CC, por sua vez, está excluída, não só porque a participação social é uma categoria jurídica distinta da posição contratual, mas também porque o CSC regula a matéria.

130. A questão de saber se o fenómeno da cessão de quotas ou partes sociais de uma sociedade de pessoas e o da cessão do contrato devem construir-se da mesma maneira ou de modo distinto e se esta construção há-de consistir num negócio trilateral ou num negócio bilateral sujeito a condicio iuris de eficácia pode ficar aqui em aberto; tal como o pode ficar, neste caso, a questão de saber se uma cessão não consentida é absoluta ou apenas relativamente ineficaz. O problema é, aliás, mais geral, pois coloca-se também, nomeadamente, a propósito da cessão de crédito configurado contratualmente como incedível ou de credibilidade condicionada (art. 577 CC [ccxxxv] ).

Mas não pode aceitar-se que, com base em construções meramente teóricas acerca da figura da posição contratual, se interprete o regime da participação social em termos que não são adequados ao seu espírito, ou se modifique mesmo esse regime.

B - A ACÇÃO COMO DIREITO CORPORATIVO E COMO DIREITO-VALOR

1. Conceito de acção. A participação accionária não titulada nem registada em conta

131. Como se viu no capítulo anterior, é corrente a utilização da palavra acção para designar três realidades distintas: cada uma das partes, fracções ou unidades em que idealmente se divide o capital das sociedades anónimas; a participação accionária, isto é, a posição jurídica correspondente a cada uma destas unidades (participação social, em sentido objectivo, distinta da posição jurídica global do acionista/sócio); e o título accionário, ou seja, o documento representativo desta posição jurídica [ccxxxvi] (64). Com o aparecimento das acções escriturais (ações registadas em conta), torna-se mais claro, no entanto, um outro sentido, já implícito na lei - o da acção como valor mobiliário, titulado ou escritural, entidade complexa, constituída pelo quid representado e a respectiva forma de representação (e não apenas por esta). Sendo os conceitos fundamentais agora o de ação participação - unidade de valor (ou de capital) e de participação social (unidade elementar de participação social) -, e o de ação valor mobiliário: unidade de valor e de participação social representada cartular ou escrituralmente.

a) Conceito de acção. As acções como participações e como valores mobiliários

132. De acordo com a doutrina que vê no termo aquele tríplice significado originário, teríamos como exemplos do seu emprego: no primeiro sentido, o art. 271 CSC [cf. o § 1 (2) AktG] (na SA, o capital é dividido em acções); no segundo sentido, o art. 304.4 do CSC [entretanto revogado, na Reforma de 2006, mas que dispunha: «Os títulos de acções, quer definitivos, quer provisórios, podem incorporar mais de uma acção»] e o DL n.º 229-D/88, de 4 de Julho (relativo às acções escriturais); e, no terceiro, o art. 299 CSC (cf. o § 10 AktG) (respeitante às acções nominativas e ao portador, hoje apenas acções nominativas).

133. Verdadeiramente, porém, os arts. 271 e 299 CSC limitam-se a utilizar fórmulas elípticas para dizer, no primeiro caso, que o capital social se divide em unidades a que correspondem outras tantas posições jurídicas autónomas, designadas acções; e, no segundo, que a participação é susceptível de ser documentada por título que indique o nome do seu titular ou por título ao portador. O CSC configura, na verdade, a participação ou posição accionária como titulável (cf., em especial, os arts. 272 d), 299 ss e 304 s) e, partindo do pressuposto da sua normal titulação, a generalidade das suas normas relativas às acções tem por objecto a participação titulada, como acontece, nomeadamente, nos arts. 326 e seguintes. Ou as mesmas tanto se aplicam às acções participações, sem mais, como às acções participações tituladas (e, agora, também escriturais) [cf. ainda, por ex., os arts. 276 (acções com e sem valor nominal, indivisibilidade) e 303 (contitularidade de ações com direitos inerentes)].

134. O título, tendo natureza simplesmente declarativa [ccxxxvii] (65), cumpre uma função (limitada) de qualificação da posição jurídica accionária: o que se pretende com a documentação cartular desta é, essencialmente, tornar possível a sua circulação segundo o regime próprio dos títulos de crédito, de que faz parte, em especial, uma particular tutela do adquirente de boa fé [ccxxxviii] (66). Adicionalmente, no caso dos títulos ao portador [hoje, extintos - Lei 15/2017 e DL 123/2017], o título cumpre, ainda, uma função legitimadora, quanto ao exercício dos direitos sociais, função que, no caso das acções nominativas é cumprida pelo livro de registo das acções.

135. Às acções tituladas, veio o DL 229-D/88 acrescentar as acções escriturais, isto é, acções registadas em conta (cf. os arts. 1 e 2 deste diploma). A matéria encontra-se hoje regulada no CVM, quer no que toca a estas, quer no que tange às acções tituladas (cf. infra).

136. A lei é omissa sobre o fenómeno da participação accionária não representada cartular ou escrituralmente. Mas, como se viu anteriormente, esta surge com a inscrição da sociedade ou do acto de aumento de capital no registo comercial; antes, portanto, e independentemente da emissão de títulos ou do seu registo em conta. Pode, assim, haver – e há, efectivamente, na prática – acções não tituladas nem escriturais.

137. Em suma, a acção ou participação accionária pode, essencialmente, definir-se como a posição jurídico-social correspondente a cada uma das unidades em que o capital das sociedades anónimas se divide - ou como uma unidade de valor e de participação social - e susceptível de ser representada por títulos ou de forma escritural. E a acção valor mobiliário é essa unidade de valor e de participação social representada cartular ou escrituralmente.

138. Justifica-se uma breve nota de actualização. Numa opção muito discutível, com o CVM de 1999, o legislador concentrou a regulação das acções enquanto valores mobiliários neste Código e, embora a realidade subjacente ao regime instituído, que serviu de modelo ao legislador na definição deste, sejam sobretudo as acções (e as obrigações), a regulação respeita aos valores mobiliários em geral, não às acções em especial.

Assim, as acções são qualificadas como valores mobiliários, a par de outros instrumentos financeiros, no art. 1; e objecto de regulação geral, como tais, nos arts. 39 a 107. Salienta-se o seguinte: (i) a forma de representação pode ser titulada ou escritural, sendo com ela que as acções surgem como valores mobiliários, adquirindo uma condição jurídica especial (art. 46); (ii) após a extinção dos títulos ao portador, as acções passaram a ser necessariamente nominativas, revelando o nome do titular (art. 52); (iii) as acções escriturais são registadas em conta (arts. 46.1, 61 e ss) e possuem uma específica forma de transmissão condizente, mediante registo na conta do adquirente (art. 80.1); o exercício dos direitos é levado a cabo com base no registo legitimador (arts. 55 e 56) mas, quando a entidade registadora não é a própria sociedade mas um intermediário financeiro, cabe a este emitir um certificado comprovativo da situação registal (arts. 78 e 82); existem especificidades quando as ações são inseridas em sistema de administração centralizada, o que sucede necessariamente com as ações admitidas à negociação em mercado regulamentado (máxime, bolsa de valores) (arts. 62, 88 e ss); iv) as acções tituladas são objecto de representação através de um documento em papel (arts. 46.1, 95 e ss; cf. o art. 304 do CSC); mas são, na realidade, valores mobiliários híbridos, cartulares e registados (na sociedade emitente ou em intermediário financeiro que a represente), cumprindo o título uma função circulatória e tendo o registo o duplo papel de instrumento necessário para o exercício dos direitos sociais, salvo na medida em que haja cupões para o efeito (art. 104), e legitimador (arts. 55 e 56); a transmissão com eficácia plena dá-se, em geral, mediante a entrega do título ao transmissário, com aposição no mesmo de uma declaração de transmissão a seu favor, seguida de registo (art. 107); v) o titular de acções registadas pode depositá-las em intermediário financeiro autorizado, o que permite uma subsequente transmissão escritural das mesmas, sem mobilização dos títulos [arts. 99 e ss, antigo art. 101.2 e art. 102.2a)]; pode também haver um depósito em sistema centralizado, caso em que os títulos ficam imobilizados e as ações passam a comportar-se como valores mobiliários escriturais (arts. 99, 105 e ss); vi) as ações liberadas, livremente transmissíveis e não oneradas podem ser admitidas à negociação em mercado regulamentado (arts. 204 s) e transaccionadas neste (arts. 80.2, 206 ss); vii) as acções podem, ainda, ser objeto de negociação mediante ofertas públicas, de venda, aquisição e troca (arts. 108 e ss); viii) a transmissão cartular e escritural das ações beneficia de um regime especial de tutela, estando o adquirente de boa fé (art. 58); ix) as acções são em princípio livremente transmissíveis (mesmo se não liberadas), mas os estatutos podem configurá-las como acções vinculadas, isto é de transmissibilidade restrita, permanecendo a matéria regulada no CSC (arts. 328 e 329).

139. A titularidade (ou contitularidade) de uma ou mais acções, com eficácia face à sociedade, confere ao respectivo beneficiário a qualidade de sócio. Assim, a par da ação participação - participação em sentido objectivo - temos a concreta posição jurídica de cada sócio (ou accionista), que podemos designar como participação social (ou accionária) em sentido subjectivo. Aqui assume especial relevância a titularidade de participações qualificadas, mormente de controlo, real ou presumido, que justificam especiais normas de transparência, com associados deveres de informação por parte dos titulares, bem como deveres de lealdade societária, de lançamento de oferta pública de aquisição, etc., e a instituição recente de um registo central de beneficiário efectivo (RCBE). Cf., no CSC, os arts. 481 e ss e o originário art. 448; no CVM, a respeito das sociedades abertas ao investimento público, os deveres de informação e transparência e de lançamento de oferta pública de aquisição constantes dos arts. 16 e ss e 187; e, quando ao beneficiário último do controlo da sociedade, a Lei 89/2017 e a Portaria 233/2018.

b) A participação accionária não titulada nem registada em conta

140. A acção pode manter-se sem qualquer tipo de representação por tempo mais ou menos longo, uma vez que nem a titulação nem o seu registo em conta são impostos por qualquer norma de interesse e ordem pública [ccxxxix] . A representação, cartular ou escritural, é um mais que se lhe acrescenta, destinado a melhorar a condição jurídico-prática da mesma, havendo interesse nisso, mormente tornando-a apta para ser negociada em mercado.

141. É certo que, como acontecia no domínio do código comercial e acontece, nomeadamente, na Alemanha, o accionista tem, no sistema do CSC, um direito ao título [ccxl] (68) e que, com a entrada em vigor do DL 229-D/88, se deve entender que ele tem um direito à representação cartular ou escritural das suas acções (cf. o art. 1, nºs 1 e 2 deste diploma). Nada obsta, porém, a que haja uma inacção ou renúncia ao exercício deste direito. Dúvidas podem levantar-se apenas quanto aos termos em que esta pode dar-se.

142. Como se verá mais tarde, a participação titulada ou registada em conta tem um regime de transmissão que facilita a sua circulação e, portanto, a realização do seu valor de troca. Aquela representação visa, assim, dotar a participação de uma maior aptidão para o tráfico e, em especial, torná-la um valor mobiliário, susceptível de ser transaccionado na bolsa. Ela corresponde, por isso, a um direito do accionista.

143. Mas é perfeitamente compreensível que os membros de sociedade de restrita base accionária (v.g. uma pequena ou média sociedade familiar), sobretudo na fase de organização e consolidação da empresa social no mercado, não tenham qualquer intenção de alienar as suas acções, sendo, portanto, para eles, a emissão de títulos ou a manutenção de um serviço de acções escriturais uma inutilidade e uma fonte de encargos injustificada. Para evitar este resultado, são concebíveis, pelo menos, três vias de solução.

A primeira consiste em configurar a participação accionária como susceptível de ser representada cartular ou escrituralmente [ccxli] e, estando os sócios de acordo, pura e simplesmente, não emitir títulos nem efectuar qualquer registo em conta.

Para evitar os inconvenientes que resultam do facto de esta solução ter carácter precário – uma vez que um ou alguns dos sócios poderão reclamar, a todo o tempo, a representação a que, de acordo com a lei ou os estatutos, têm direito -, podem também os interessados celebrar entre si um acordo parassocial que, sem pôr em causa a configuração legal ou estatutária da participação como susceptível de ser representada cartular ou escrituralmente e, portanto, o direito dos sócios à sua representação, regulará o exercício deste. Esta regulação pode ir mesmo ao ponto de excluir tal exercício. É de notar, no entanto, que uma eventual exclusão, para além de, nos termos gerais, dever corresponder a um interesse digno de protecção legal, dve também estar compreendida dentro de limite temporal razoável.

144. Um acordo deste tipo é, no entanto, eficaz apenas inter partes . Poderá haver ainda uma regulamentação da matéria com eficácia estatutária? A lei não permite a configuração da participação social como insusceptível de ser representada por títulos ou de forma escritural. Isso significaria a sua descaracterização e, traduzindo-se, em última análise, na exclusão de um regime de transmissão especialmente favorável ao accionista (e à segurança do tráfico accionário), constituiria uma restrição (formal) à sua transmissibilidade não prevista por lei (cf. o art. 328.1 CSC) [ccxlii] . Mas poderão os estatutos conter uma cláusula de renúncia ao exercício do direito ao título ou à sua representação escritural? Em caso afirmativo, qual a sua eficácia?

A resposta à primeira questão é afirmativa. O acordo de renúncia pode integrar o conteúdo do contrato de sociedade. O problema está, portanto, em saber se a cláusula em questão, apesar de, formalmente, constar dos estatutos, tem verdadeira natureza estatutária, isto é, é oponível a quem quer que seja o titular das acções, ou tem simples natureza contratual e, portanto, a sua eficácia é, pelo menos em princípio, circunscrita àqueles que a subscreveram. Em causa está, sobretudo, o valor da tipicidade do regime da sociedade anónima e do conteúdo da participação accionária. O tráfico accionário assenta num mínimo de tipicidade que os subscritores do contrato de sociedade não podem pôr em causa senão na medida em que a lei os autorize a fazê-lo [ccxliii] . Ora, no caso presente, não há qualquer autorização legal, pelo que aquela cláusula vincula apenas aqueles que a aceitarem. Além disso, está ainda sujeito aos limites gerais que teria uma convenção parassocial.

2. A acção como direito corporativo e como direito-valor

a) A acção como direito corporativo

145. Viu-se anteriormente que a participação social é uma posição jurídica de carácter social ou corporativo e que a questão da sua qualificação ou não como direito podia, para os fins deste trabalho, ficar em aberto. Esta está, no entanto, no caso da participação accionária, de tal forma generalizada, que, por comodidade de expressão, passarei também a adoptá-la [ccxliv] .

b) A acção como direito-valor

146. Com a entrada em vigor do DL 229-D/88, passou a haver, ao lado dos tradicionais valores mobiliários titulados, uma nova categoria, a dos valores mobiliários escriturais. Em ambos os casos, estamos perante direitos-valores, isto é, direitos sujeitos a um regime especial de circulação: o dos títulos de crédito [ccxlv] .

Esta afirmação é evidente quando estão em causa acções (ou outros valores mobiliários) representados por títulos, uma vez admitida, como se verá, a qualificação destes como títulos valores. Em relação às acções escriturais, regulando o art. 5 do DL 299-D/88 a forma de transmissão deste tipo de acções, o art. 1, nº 3, não pode querer referir-se a esta, quando manda aplicar o regime das acções nominativas ou ao portador [ccxlvi] . Importa, no entanto, ter aqui presente a perspectiva do fenómeno accionário que ao longo de todo este trabalho se procura pôr em evidência. O título é um mero instrumento de publicidade do direito accionário que permite dar a este um regime de circulação caracterizado por uma especial tutela da segurança do seu tráfico. No centro do fenómeno circulatório, está o direito e não o documento. Este tem apenas uma função qualificadora daquele. O sistema instituído pelo DL 229-D/88 substitui o título e, às formas de circulação próprias do direito titulado, corresponde, nas acções registadas em conta, a forma prevista no art. 5 deste diploma. Estas formas equivalem-se e, por isso, a lei determina, e bem, que o regime do direito representado escrituralmente seja o mesmo que ele tem quando titulado, com as especificidades resultantes do mesmo diploma. Isto significa, em especial, que à transmissão prevista no art. 5 se aplicará o mesmo regime material de circulação dos títulos de crédito [ccxlvii] .

147. É esta, aliás, a lição que se retira da experiência de outros países [ccxlviii] . O caso não é, na verdade, substancialmente diferente daquele que ocorre quando há emissão de títulos mas estes são depositados e os direitos assim representados constituem ou são tratados como valores mobiliários fungíveis, transmissíveis por transferência de conta a conta, como acontece, entre nós, no sistema do DL 59/88, de 27 de Fevereiro. O tráfico dos direitos é, então, desmaterializado, como nas acções escriturais, e, tal como nestas, processa-se através de meras operações escriturais ou contabilísticas [ccxlix] . E em países onde existem sistemas semelhantes - como acontece, nomeadamente, na Alemanha e na Itália - considera-se que o regime material de circulação dos direitos se mantém [ccl] .

Creio, portanto, que o sistema da representação escritural, mantendo os direitos assim representados a natureza de direitos-valores que têm quando estão titulados, substitui, com vantagem, o sistema tradicional. O exemplo francês é prova disso [ccli] (79). O título, que nasceu para favorecer a circulação dos direitos, tem vindo, na verdade, a perder a sua função e a aparecer, cada vez de forma mais evidente, como um obstáculo ao funcionamento dinâmico do mercado de capitais. Daí o movimento de desmaterialização em curso.

3. As acções tituladas

148. A participação accionária é, como se disse, configurada pelo CSC como um direito susceptível de ser representado por um título emitido em nome do respectivo titular (acção nominativa) ou ao portador (acção ao portador) – cf., nomeadamente, o art. 299.

A nossa doutrina dominante é, à semelhança do que acontece noutros países, no sentido de que, em ambos os casos, o documento representativo do direito é um título de crédito [cclii] causal [ccliii] e meramente declarativo [ccliv] . O título pode ser relativo apenas a uma ou representar uma multiplicidade de acções (art. 304.4 CSC; cf. o art. 166 CCom).

a) Acções ao portador

149. As acções ao portador são reconhecidas como títulos ao portador nos ordenamentos jurídicos de todos os países por mim considerados (Alemanha, França, antes da desmaterialização dos valores mobiliários, Itália e Suíça). No nosso anterior direito, o legislador falava, aliás, expressamente, em título ao portador (cf. o art. 544 do C. Com de 1833, o art. 7º , § 2º, da lei das sociedades anónimas de 1867, e o art. 166, § 2º, do CCom).

N.A: Como já se assinalou, em Portugal, as acções ao portador foram extintas pela Lei 15/2017 e pelo DL 123/2017.

b) Acções nominativas

150. As acções nominativas eram, no nosso antigo direito, tal como em França até à desmaterialização dos valores mobiliários, acções simplesmente registadas (cf. o art. 545 CCom de 1833) no livro detido para o efeito pela sociedade emitente. Diferentemente, porém, do que aconteceu neste país – onde o verdadeiro título do direito foi sempre considerado a inscrição no registo e não o documento certificativo dessa inscrição [cclv] -, entre nós, deu-se uma evolução no sentido da identificação da acção nominativa com o título representativo do respectivo direito, facto que já é notório em SAMPAIO PIMENTEL [cclvi] e no relatório do Governo relativo à lei das sociedades anónimas de 1867 [cclvii] . A nossa doutrina considera-o um título de crédito nominativo [cclviii] . No actual direito, o art. 304.1 (embora se refira aos títulos provisórios) e o art. 326.1 CSC (se se tiver em conta a caracterização doutrinal dos títulos corrente entre nós [cclix] ) fornecem algum apoio a esta classificação.

151. O modelo inspirador desta concepção da acção nominativa é o italiano, sendo também, a teoria transalpina clássica dos títulos de crédito, com destaque para os nomes de VIVANTE e ASCARELLI, aquela que é seguida pela generalidade dos autores portugueses [cclx] . De acordo com esta, tanto os títulos ao portador e os títulos à ordem, como os títulos nominativos, são títulos circulantes, incorporando um direito literal e autónomo [cclxi] . A autonomia, em matéria de títulos de crédito, traduz-se, nomeadamente, no afastamento da regra da oponibilidade de excepções pessoais previstas no art. 585 CC (a chamada autonomia do direito cartular) e no princípio da tutela do adquirente de boa fé beneficiário de uma transmissão cartular (a chamada autonomia do direito sobre o título) [cclxii] .

152. Diferente é, como se viu no capítulo anterior, a concepção germânica da acção nominativa. Com efeito, na Alemanha (e o mesmo acontece na Suíça), em geral, os autores dividem os títulos de crédito em circulantes e não circulantes e incluem na primeira categoria apenas os títulos ao portador e à ordem [cclxiii] . Só estes cumprem uma função circulatória, isto é, só o direito documentado por eles fica com uma lei de circulação especial, em relação ao direito comum. Os títulos nominativos (ou de legitimação directa) não são, utilizando a linguagem corrente, “veículos” da transmissão do direito cartular; não actuam sobre esta. A sua função circunscreve-se ao momento do exercício do direito. E, como a sociedade anónima só cumpre verdadeiramente a sua função de captação de capitais para a actividade produtiva se o tráfico das acções se processar com rapidez e segurança, o título accionário foi incluído nos títulos circulantes. As acções ao portador são, por isso, direitos documentados por títulos ao portador e as acções nominativas, direitos representados por títulos à ordem, transmissíveis por endosso ou por cessão, nos termos gerais (salvo no que se refere à necessidade de tradição do documento, de acordo com a doutrina tradicional). Mas o título accionário à ordem tem características próprias. O instituto da acção nominativa é, na verdade, constituído pelo título e pelo livro das acções. A legitimação para o exercício dos direitos sociais é dada (exclusivamente) pela inscrição do respectivo titular neste livro. O título permite que a acção nele documentada circule, à margem desta inscrição, segundo os princípios cartulares, nomeadamente o da tutela do adquirente de boa fé, e que a inscrição como sócio naquele livro se dê também segundo o regime próprio dos títulos à ordem. A questão da titularidade do direito (e do respectivo título) decide-se, assim, de acordo com o regime de circulação própria deste ou do título e não pela inscrição no livro das acções, que, sendo um acto interno da sociedade, não tem publicidade (sequer) comparável à do título.

153. Como é evidente (mas parece ser, por vezes, esquecido pela doutrina) as acções nominativas do direito alemão (e suíço) são títulos à ordem, mas não são acções à ordem, uma vez que nestas últimas a legitimação para o exercício dos direitos sociais seria inerente à legitimação cartular.

Esta diferença de concepções acerca da acção nominativa tem sem dúvida importância prática, mas tal importância não deve ser exagerada. Com efeito, tanto em Portugal e na Itália [cclxiv] , como na Alemanha (e na Suíça), a representação cartular do direito accionário destina-se, essencialmente, a permitir a sua circulação segundo o regime próprio dos títulos de crédito circulantes, no qual sobressai a regra da tutela do adquirente cartular de boa fé. Para a doutrina deste(s) último(s) país(es), títulos circulantes são apenas os títulos à ordem e ao portador e, por isso, a acção nominativa é reconhecida como um título à ordem (embora no direito suíço os estatutos possam configurá-la como um título nominativo: cf. o art. 684 CO). Na literatura italiana e portuguesa [cclxv] , também se reconhece carácter circulante aos títulos nominativos (emitidos em massa), o que leva à inclusão do título accionário entre estes.

154. As consequências práticas destas diferentes construções acerca dos títulos nominativos e, consequentemente, das acções nominativas variam consoante se considere que esta espécie de títulos admite duas formas de circulação cartular, o chamado transfert e o endosso, ou apenas a primeira.

No direito italiano, em que ambas são admitidas (cf. os arts. 2022 e 2023 CCit.) e em que a corrente é a segunda, a situação não é, na realidade, muito diferente daquela que se verifica na Alemanha. Um título que circula, efectivamente, por endosso, segundo as regras de transmissão e legitimação próprias dos títulos à ordem, é, bem vistas as coisas, um título à ordem, mesmo quando é apelidado de nominativo porque também é (teoricamente) transmissível por transfert (ou devido à presença de um livro de registo das transmissões), e mesmo se, como acontece no direito italiano (e ao contrário do alemão), o endosso em branco é proibido (art. 2023 II CCit.).

No direito português, a situação, que já não era clara até à entrada em vigor do CSC, também não pode considerar-se definitivamente resolvida por este. Antes de tratar do problema, importa, no entanto, ver, sumariamente, qual o regime da transmissão estabelecido pelo art. 326 CSC [hoje, cfr. o art. 102 do CVM].

aa) 155. A forma de transmissão por acto entre vivos específica da acção nominativa (ou seja, a forma especial ou cartular de transmissão do direito accionário documentado nominativamente) consiste numa declaração do alienante (ou da entidade referida no nº 7 do art. 326) escrita no próprio título, com a respectiva assinatura reconhecida notarialmente (no título ou em modelo oficialmente aprovado, art. 326.2 e 3).

O significado jurídico do seu averbamento no livro das acções e da anotação do pertence no título não é claro. O mesmo acontece com a comunicação da transmissão à sociedade acompanhada do pedido de averbamento e do título, pressuposta pelo sistema. Não é possível tratar aqui desenvolvidamente do assunto, pelo que me limito a apresentar aquela interpretação da lei que me parece reflectir o estado da doutrina e da jurisprudência nacionais ao tempo em que o CSC foi feito (que corresponde também àquele que se verifica em Itália). A anotação do pertence no título representa a mera certificação pela sociedade de que lhe foi comunicada eficazmente uma transmissão a favor da pessoa nele indicada (ou de que tal transmissão já foi mesmo averbada). Ela tem, por isso, um mero significado legitimador: quem estiver munido de um título nestas condições está legitimado para o exercício dos direitos sociais, porque foi reconhecido pela sociedade como titular do direito respectivo. O mesmo se passa com o averbamento no livro de registo [cclxvi] . Mas, em contrapartida, o pertence e o averbamento são os únicos instrumentos de legitimação social legalmente previstos. Quem adquire uma acção nominativa nos termos dos nºs 1 (1ª parte) a 4 do art. 326 é seu titular não legitimado para o exercício dos respectivos direitos (e faculdades) face à sociedade (ou no âmbito da mesma). Ele é, na verdade, titular legitimado perante esta, porque a acção lhe foi alienada pela forma de transmissão própria do título; mas é um mero titular legitimado para exigir dela o transfert, que consubstancia o seu reconhecimento como accionista e lhe atribui a legitimação social (cf. os arts. 1490 ss CPC; arts. 1061 ss do CPC de 2013). Para obter este resultado, ele precisa, portanto, em primeiro lugar, de adquirir a acção ao seu actual titular em termos de poder opor à sociedade o seu direito; e, em segundo lugar, de comunicar a esta a sua aquisição, fazendo acompanhar essa comunicação do respectivo título e de pedido de transfert. Uma vez efectuado este, os seus efeitos deveriam produzir-se a partir do momento em que a transmissão foi eficazmente comunicada (cf. o art. 1492.1 CPC; art. 1063.1 do CPC de 2013). O CSC dá, no entanto, à sociedade uma espécie de “prazo de graça” de 5 dias (art. 326.5).

156. Três dúvidas podem aqui levantar-se. Admitindo que a forma de alienação prevista no art. 326.1 CSC exclui uma possível transmissão do direito accionário nominativamente documentado nos termos gerais de direito – para cuja perfeição ou eficácia, pelo menos inter partes, não é necessária qualquer declaração no título, nem a entrega deste ao adquirente, porque a lei em parte alguma o diz e porque não se vê justificação para tal (cf. infra, § 2) -, põe-se, em primeiro lugar, a questão de saber se o legislador pretendeu, com o art. 326.1, sujeitar o negócio de disposição deste tipo de acções à forma escrita. Como não se trata propriamente de um problema de direito societário, a sua solução pode ficar em aberto. Seguro é que não é possível transmitir tais acções com eficácia face à sociedade sem uma declaração escrita de transmissão. Mas levanta-se aqui uma outra questão: para alienar um direito accionário nominativamente titulado com eficácia face à sociedade (isto é, de tal modo que o adquirente possa opor a esta a sua titularidade e, portanto, exigir a execução do transfert que lhe dará a legitimação social) é necessário escrever a declaração de transmissão no próprio título, como prevê o art. 326.1, ou pode ela ser feita em documento à parte? Não vejo razão para não considerar plenamente eficaz uma transmissão extracartular que cumpra os demais requisitos de forma do art. 326, desde que o transmissário tenha a posse do título, necessário para poder exigir da sociedade a execução do transfert [cclxvii] . Pode, finalmente, ao adquirente de acção nominativa só interessar a realização do seu valor de mercado (não tendo qualquer intenção de participar na vida da sociedade nem de cobrar quaisquer dividendos), pelo que, tanto ele como para a sociedade, o transfert é uma inutilidade. E o mesmo pode acontecer a potenciais adquirentes seus. Ser-lhe-á lícito retransmiti-la através de nova declaração de transmissão sem previamente promover o averbamento da anterior? Uma resposta negativa parece-me economicamente sem sentido e contrária mesmo à função económica da acção. Quando muito, poderá justificar-se, para efeitos fiscais, a exclusão de transmissões em branco (cf. o art. 326.4).

N.A: Como já se assinalou, hoje rege o art. 102 do CVM, que eliminou a necessidade do pertence, mas, como o anterior art. 326 do CSC, suscita diversas questões interpretativas, algumas comuns a ambos os preceitos, incluindo a magna questão de saber se o título conserva uma função legitimadora quanto ao exercício do direito à inscrição da transmissão cartular no registo e a questão, mais geral, da admissibilidade da transmissão solo consensu (ou de direito comum), ainda que com efeitos limitados (sobre esta, cf. infra, § 2 B.1).

Interessam, ainda, os arts. 1061 a 1063 do CPC de 2013, relativos ao averbamento da transmissão no registo das ações. Salienta-se neles a (implícita) necessidade de os títulos serem apresentados, para o efeito, à sociedade (cfr. o art. 1063.1) e a possibilidade de os «interessados» exigirem o averbamento judicial se a sociedade não o realizar (cfr. o art. 1061.1). Note-se também que a inacção da sociedade pode levar ao lançamento de pertence judicial nos títulos, o qual equivale ao registo (art. 1062.2; cfr., a este respeito, o art. 102.7 do CVM).

bb) 157. É neste contexto que importa ver a questão da admissibilidade ou não da transmissão por endosso (e da conveniência prática deste tipo de transmissões).

Suponha-se que A transmitiu um lote de acções a B, que este as retransmitiu a C, e assim sucessivamente até F. Este pretende agora obter da sociedade o seu reconhecimento como titular das mesmas. Se a declaração de transmissão constante do título puder considerar-se como endosso, bastará à sociedade controlar a regularidade formal da cadeia de endossos e F, como portador endossado, também não precisará de apresentar outra justificação para o seu direito. Caso contrário, F terá que apresentar prova de todas as transmissões efectuadas desde aquele que consta do livro de registo das acções e a sociedade poderá e deverá fazer um controlo material da sua regularidade [cclxviii] . Além disso, sendo o título endossado, o seu adquirente será tutelado de acordo com um princípio de tutela da circulação cartular que aflora, nomeadamente, no art. 16 II da lei uniforme relativa às letras e livranças, o que não acontecerá na hipótese inversa.

Como se viu no capítulo anterior, o título visa criar condições para que o tráfico da participação accionária seja fácil e seguro. Se se quer promover o tipo de circulação acabado de referir (e a função económica da acção vai nesse sentido), a transmissão por endosso será a via indicada [cclxix] . A letra do art. 326.1 é, neste ponto, neutra: a declaração nele referida tanto pode ser um endosso como não. A intenção do legislador, como pode ver-se pelo título da subsecção em que o preceito está inserido, foi, aliás, apenas a de regular a forma da transmissão e não os seus efeitos, que é o que, no fundo, está aqui em discussão. O problema resolve-se, portanto, em última análise, por interpretação do pacto social e do concreto negócio de alienação.

158. De um ponto de vista mais geral, admitir-se a transmissão por endosso seria a forma de encontrar, no nosso ordenamento jurídico, um fundamento legal seguro para a desejável (e, porventura, mesmo imprescindível) tutela do adquirente de boa fé do direito accionário. Com efeito, diferentemente do que acontece noutros sistemas jurídicos (como o italiano, o francês e o alemão), não há no nosso nenhuma regra especial de tutela do adquirente empossado de coisas móveis, e também não há qualquer disposição legal em que se possa basear a chamada autonomia dos títulos de crédito nominativos, diferentemente do que acontece com os títulos à ordem e ao portador (cf., em especial, os arts. 16 II LULL e 21 LUCh). Não pretende com isto contestar-se que, qualificando-se determinados títulos como nominativos e considerando como sua única forma de transmissão cartular aquela que inclui o registo no livro do emitente, não se justifique aplicar-lhes um princípio de tutela do adquirente de boa fé. Essa justificação pode, com efeito, retirar-se da função que, nomeadamente no caso dos valores mobiliários, o título é chamado a desempenhar. Mas é forçoso reconhecer que uma construção do fenómeno accionário (ou dos valores mobiliários em geral) e dos títulos de crédito do género da alemã está mais próxima dos textos legais do que a da nossa doutrina tradicional [cclxx] (98).

159 . N.A: Como já se assinalou, hoje existe uma norma de tutela do adquirente cartular de boa fé de quaisquer valores mobiliários, titulados e escriturais, incluindo accionários, o art. 58 do CVM. O problema das transmissões cartulares não registadas subsiste em face do art. 102 deste Código. Uma forma possível de o resolver ou esclarecer será, porventura, regulando o assunto nos estatutos da sociedade. Note-se, contudo, que, admitindo tais transmissões, vale para elas o que acaba de referir-se a respeito do endosso, quer elas se qualifiquem como tais [o que é frequente suceder na doutrina, sendo de assinalar que o próprio legislador admite a existência de títulos nominativos endossáveis (mediante endosso nominativo) - cfr. o art. 2 do DL 372/91, relativo aos certificados de depósito], quer não, tendo aplicação, designadamente, quanto ao registo, o disposto nos arts. 55 e 56 do CVM.

c) Acções sujeitas a depósito nos termos do DL n.º 59/88, de 27 de Fevereiro

160. Com o intuito de facilitar a liquidação das operações da bolsa relativas aos valores mobiliários (nomeadamente às acções), o DL 59/88 instituiu um regime de depósito dos títulos como “coisas” fungíveis que torna possível o tráfico desmaterializado dos respectivos direitos, à semelhança do que acontece, por exemplo, no sistema alemão da Depotgesetz de 1937 e no da lei italiana de administração centralizada dos títulos de 1986.

Quanto à transmissão das acções, no âmbito deste sistema, o legislador limita-se a dizer que, sendo as acções nominativas, não se aplica o disposto no art. 326.1 CSC (art. 7.3) e que, estando registadas, se aplica o disposto no DL n.º 408/82, de 29 de Setembro. Não está nos limites deste trabalho fazer uma apreciação deste diploma, que, tecnicamente, fica muito aquém de outros congéneres estrangeiros e longe, mesmo, daquilo que seria de esperar, tanto mais que ele já substituiu um outro anterior sobre a mesma matéria (o DL 210-B/87, de 27 de Maio). A não definição clara da forma e do regime de alienação é apenas um exemplo. Importa, no entanto, reter que, de acordo com o sistema que o legislador teve em vista implementar, à transmissão cartular corresponderá neste uma forma de transmissão meramente contabilística, por transferência de conta a conta [cclxxi] , semelhante àquela que está prevista para as acções escriturais no art. 5 do DL 229-D/88, de 4 de Julho. Como se disse acima, parece dever entender-se que o regime material de circulação do direito accionário se mantém – isto é, deverá continuar a ser o de um direito-valor -, equiparando, para o efeito, as formas de transmissão contabilística e cartular, uma vez que estas se equivalem e a intenção do legislador foi a de favorecer a circulação dos valores mobiliários e não a de diminuir a segurança do seu tráfico. (Isto deverá ser assim pelo menos até que se demonstre que aquela nova forma de transmissão já fornece por si só uma segurança daquele tráfico equiparável à das transmissões cartulares.)

N.A: Entretanto, foram introduzidas as acções escrituais (cfr. a seguir) e, hoje, a matéria encontra-se regulada no CVM (cfr. supra).

4 . As acções escriturais (DL n.º 229-D/88, de 4 de Julho)

a) 161. Ao decidir criar as acções escriturais, o legislador poderia ter optado, basicamente, por uma de duas soluções: ou substituir o sistema existente dos valores mobiliários titulados por um novo sistema assente na representação meramente escritural da participação accionária, ou acrescentar-lhe, simplesmente, esta outra forma de representação. A França seguiu a primeira via [cclxxii] . Em Portugal preferiu-se operar uma desmaterialização daqueles valores por etapas. É de prever, no entanto, que, a prazo, a solução final seja aquela que já foi adoptada pelo legislador gaulês. Outra questão sobre a qual importava tomar posição era a da manutenção ou não, no âmbito do sistema de representação escritural, da distinção tradicional entre dois tipos ou modalidades de acções - nominativas e ao portador. Neste ponto, a nossa lei coincide com a francesa (art. 1.3 do DL 229-D/88, e art. 1 II do decreto francês).

No sistema tradicional, o direito accionário (estatutariamente) susceptível de ser representado por título ao portador tem, essencialmente, as seguintes características, que o distinguem da acção nominativa: é, por imperativo legal, livremente transmissível, não tem no seu conteúdo ou ligada a si qualquer obrigação (de entrada ou de efectuar prestações acessórias) e o seu titular pode manter-se anónimo (cf. os arts. 299, 328.1 e 2 CSC) [cclxxiii] . No meu ponto de vista, este sistema justifica-se plenamente: a manutenção da distinção entre acções nominativas e ao portador corresponde a um bom princípio de organização económica [cclxxiv] . Creio mesmo que o caminho acertado seria o de aprofundar a divisão existente, considerando, por exemplo, a acção ao portador insusceptível de ser amortizada compulsivamente.

Considerando, portanto, que a evolução provável será no sentido de as acções escriturais virem a substituir as tituladas, julgo acertada a opção do legislador de conservar a distinção tradicional.

162. É de notar, no entanto, que, por aquilo que se pode depreender do preâmbulo do DL 229-D/88, o respectivo projecto foi concebido – dentro da orientação governamental, já expressa no DL 58/88, de desmaterializar gradualmente os valores mobiliários – apenas para completar o sistema então existente com uma nova forma de representação nominativa da participação accionária, e o legislador parece ter-se limitado a introduzir no art. 1.3 a referência às acções ao portador. Isto explica que todas as características acima apontadas dos direitos documentáveis por título ao portador estejam ausentes do texto final: a livre transmissibilidade (cf. os arts. 2.2 l) e 6), a ausência de obrigações (cf. o art. 2.2 d)) e o anonimato (cf., nomeadamente, os arts. 3.4, 13.1 e 14). Na verdade, o regime instituído é de tal forma contrário à natureza da acção ao portador, que já se defendeu dever o art. 1.3, interpretar-se de acordo com o preâmbulo [cclxxv] , o que significaria considerar como não escrita a parte relativa a este tipo de acções. Julgo que o caminho dever ser outro, isto é, deve interpretar-se restritivamente o art. 2.2 d) e i) e o art. 6, considerando que eles só se aplicam às acções escriturais que, de acordo com os estatutos, seguem o regime das acções nominativas. A lei francesa conservou a distinção tradicional entre acções nominativas e acções ao portador, salvaguardando de certa forma a anonímia destas, na medida em que o seu titular pode manter-se desconhecido da sociedade [cclxxvi] . A questão da conveniência ou não de manter a terminologia existente para designar as duas formas de representação escritural das acções é secundária, não valendo a pena tomar posição sobre ela. Quanto ao problema do anonimato, não há razões suficientes para crer que o legislador, se o tivesse tido presente, o teria resolvido como o fez o seu congénere francês.

N.A.: A matéria é actualmente regulada pelo CVM. Note-se que, enquanto houve valores mobiliários ao portador, este Código manteve a distinção, baseada neste anonimato. Dispunha o art. 52.1: «Os valores mobiliários são nominativos ou ao portador, conforme o emitente tenha ou não a faculdade de conhecer a todo o tempo a identidade dos titulares». Seguiu-se, portanto, o modelo francês.

b) 163. A acção escritural é um direito fungível registado em conta (cf. o art. 2.1). A sua transmissão por acto entre vivos dá-se através de uma operação contabilística que consiste na inscrição da alienação na conta do alienante e da correspondente aquisição em conta do adquirente, já existente ou aberta para o efeito (art. 5.1) -, realizada pela entidade a quem está confiado o serviço das acções escriturais em causa (cf. o art. 3), com base em declaração escrita do alienante ou, sendo a operação realizada em bolsa, a apresentação pelo corretor dos documentos legalmente exigidos para ela, com identificação do adquirente (art. 5.4).

Esta forma de transmissão escritural corresponde à transmissão cartular das acções tituladas e, como se disse anteriormente, não parece haver razão para deixar de considerar o direito representado escrituralmente como um direito-valor, sendo-lhe aplicável, mutatis mutandis, o regime (material) de circulação que teria se estivesse documentado por título de crédito.

N.A: Actualmente, dispõe-se no art. 80 do CVM: «1 - Os valores mobiliários escriturais transmitem-se pelo registo na conta do adquirente. 2 - A compra em mercado regulamentado e em sistema de negociação multilateral ou organizado de valores mobiliários escriturais confere ao comprador, independentemente do registo e a partir da realização da operação, legitimidade para a sua venda nesse mercado». A instituição de um regime geral dos valores mobiliários confirmou a preconizada equiparação das formas titulada e escritural, mormente quanto à tutela da circulação (cf. o art. 58).

5. As acções registadas ou depositadas nos termos dos arts. 330 ss CSC e do DL nº 408/82, de 29 de Setembro

164. De acordo com o art. 331.1, as acções nominativas ou ao portador podem ser sujeitas, por diplomas especiais, ao regime de registo ou de depósito, regulado nos artigos seguintes e no DL 408/82, de 29 Setembro (cf. o art. 5 do DL. nº 262/86, de 2 de Setembro, que aprovou o CSC).

Diferentemente do que acontece com os DLs 59/88 e 229-D/88, que têm como objectivo facilitar o tráfico dos valores mobiliários, o regime de registo e depósito do DL 408/82 insere-se numa perspectiva mais ampla de intervencionismo económico e é determinado por razões de carácter essencialmente fiscal. Não pode dizer-se que as soluções nele consagradas – que se traduzem numa acentuada formalização e burocratização do tráfico accionário, sobretudo no caso das acções registadas – representam a forma mais feliz de conciliar os interesses do Fisco com os do mercado das acções. Não é minha intenção fazer uma apreciação do seu (de)mérito, já que esta envolveria uma análise do sistema por ele instituído que ultrapassa os limites deste trabalho [cclxxvii] . Importa, no entanto, salientar algumas ideias.

A primeira, já apontada, é a de que ele se coloca numa linha de orientação intervencionista do Estada na economia oposta àquela que tem levado praticamente todos os países desenvolvidos (que ainda não optaram pelas formas de representação meramente escriturais dos valores mobiliários) a instituir sistemas de depósito dos títulos. A segunda é a de que as formas de transmissão das acções registadas ou depositadas não têm o mesmo significado que as formas de transmissão cartulares. Com efeito, enquanto estas determinam apenas a aplicação de um regime especial de circulação do direito accionário, aquelas parecem constituir as únicas legalmente admitidas para as acções registadas ou depositadas, o que é importante no caso das acções nominativas, uma vez que para elas o regime instituído pelo DL 408/82 é obrigatório (art. 1.1). Finalmente, põe-se a questão de saber se este diploma, nomeadamente o art. 1.1, se deve ou não aplicar, mutatis mutandis, às acções sem qualquer tipo de representação, o que significará, nomeadamente, a obrigatoriedade de a sociedade ter um livro de registo das acções (não exigido na Alemanha, para este caso), no qual deverá inscrever as respectivas transmissões, e a necessidade de observar os requisitos de forma previstos no art. 26 (cf. também o art. 337 CSC). Estamos – segundo creio – perante uma lacuna do sistema que, de acordo com o espírito que presidiu à instituição do regime de registo ou depósito obrigatório das acções nominativas, deverá ser preenchida no sentido da sua aplicação.

N.A: Este regime foi revogado com o CVM de 1999.


§ 2.º

A PARTICIPAÇÃO ACCIONÁRIA

COMO “OBJECTO” TRANSMISSÍVEL

A – A PARTICIPAÇÃO ACCIONÁRIA COMO OBJECTO DO TRÁFICO JURÍDICO

1. A transmissão da participação accionária como fenómeno sucessório

a) Em geral

165. Quando a lei fala em cessão ou transmissão da participação social (cf., nomeadamente, os arts. 995 CC, 37.2, 182, 225 ss, 326 ss CSC, 5 s do DL 229-D/89), utiliza uma linguagem técnico-jurídica rigorosa: estamos perante um verdadeiro fenómeno de sucessão na titularidade de uma posição jurídica unitária.

Na verdade, como se viu no capítulo anterior (§ 2), o problema não é, em relação às sociedades de pessoas, inteiramente pacífico na Alemanha, mas a jurisprudência e a doutrina dominante vão nesse sentido. Em Portugal, os textos são suficientemente claros para que possa haver dúvidas sobre o assunto (cf. já o art. 161 CCom).

b) A questão da participação titulada

166. É certo que a chamada autonomia do direito cartular parece contrariar esta perspectiva das coisas [cclxxviii] . Não há, no entanto, verdadeira incompatibilidade entre a ideia de sucessão na participação social e o regime dos títulos de crédito que lhes é aplicável.

Com efeito, como se disse anteriormente, mesmo estando a participação accionária documentada por título de crédito, o verdadeiro objecto da transmissão é a própria posição ou direito social, como acontece quando não há qualquer forma de representação deste ou as acções são escriturais [cclxxix] . O título apenas opera uma qualificação do direito, permitindo, assim, em especial, que à circulação deste segundo as formas cartulares se aplique o correspondente regime de tutela do adquirente de boa fé. Havendo um válido negócio translativo, dar-se-á uma sucessão no direito (titulado), nos termos gerais; caso contrário, e verificando-se os pressupostos legais de tutela do adquirente, este sucede ope legis na titularidade da acção.

167. Por outro lado, viu-se também que a participação social deve ser distinguida dos eventuais direitos de crédito dela emergentes. A circulação destes estará, pelo menos em princípio, sujeito à regra do art. 585 CC. Não assim a daquela, como o demonstra o art. 427 CC. Na verdade, o regime de circulação “pessoalizada” previsto no primeiro artigo parece dever interpretar-se como um regime especial dos créditos - que são destacados de uma relação jurídica fundamental - e não de outros direitos não reais (cf. o art. 588) e de outras posições jurídicas em geral que não envolvem um destacamento semelhante quando se transmitem. O facto de a participação social não ser uma posição meramente contratual não permite uma aplicação directa do art. 427. Mas, mesmo quando não se queira ver nele um afloramento de um princípio geral, seria flagrante, neste caso, a analogia das situações, enquanto que a diferença de natureza existente entre uma posição jurídico-corporativa e uma creditícia não é de molde a justificar, in casu, a aplicação do regime próprio desta, mesmo considerando a primeira como um direito e tendo em conta o art. 588 CC. Tal como a posição contratual recebe uma determinada “identidade” do contrato no qual tem a sua fonte e com ela circula, assim também a participação social, que constitui uma posição com uma determinada configuração que lhe é dada pelo ordenamento corporativo (legal e estatutário), circula com essa configuração. Eventuais acordos à margem do contrato ou do ordenamento societário estão fora do “estatuto” contratual ou corporativo e têm natureza meramente pessoal, tal como acontece, por exemplo, no caso do comproprietário com as eventuais situações jurídicas que não integram o seu estatuto real.

Não me parece, portanto, que o título cumpra aqui qualquer função de “autonomização” da participação social, no sentido do afastamento da regra da oponibilidade de excepções pessoais previstas no art. 585 CC: tal não se mostra necessário. Posso, por isso, deixar em aberto a questão de saber se, nos títulos de crédito em geral, a regra que aflora, nomeadamente, no art. 17 da LULL é ou não compatível com a sucessão no direito documentado cartularmente (acerca do assunto, cf. as indicações constantes da nota 279).

2. A transmissão da participação social (por acto entre vivos)

a) Estrutura da transmissão

168. Como se viu no capítulo anterior (§ 2), de acordo com a orientação hoje dominante na doutrina e na jurisprudência germânicas, a transmissão voluntária inter vivos da participação social dá-se por contrato entre o seu titular e o adquirente, embora a sua eficácia possa, por disposição legal (supletiva) ou por cláusula estatutária, estar dependente do consentimento dos sócios, da corporação ou da sociedade, consoante os casos.

Em face do que se disse no parágrafo anterior, esta doutrina vale também para o direito português, apenas com a ressalva de que, entre nós, ainda parece dominar a opinião de que uma transmissão sujeita (nos termos vistos) a uma condicio iuris de eficácia quando realizada sem observância desta é apenas relativamente ineficaz [cclxxx] .

b) Objecto da transmissão

aa) 169. Como se disse anteriormente (n.º 1), o facto de a participação estar documentada por título de crédito não obsta a que o verdadeiro objecto da transmissão seja ela própria (enquanto direito documentado, ainda que se trate de documentação especial e qualificadora).

Viu-se também que a mesma se distingue de eventuais direitos de crédito dela decorrentes porventura existentes na titularidade do sócio ao tempo da alienação. Não pode, portanto, concluir-se, sem mais, que um acto de disposição a ela relativo abranja também estes. Para isso acontecer, é necessário que o acordo das partes tenha por objecto a participação e tais direitos [cclxxxi] . Estamos perante uma (mera) questão de interpretação de interpretação do negócio.

bb) 170. A transmissão da participação abrange, em princípio, todas as posições jurídicas activas e passivas que compõem o seu conteúdo. Viu-se, no entanto, no parágrafo anterior que a delimitação deste não tem ainda contornos definitivamente assentes. O sócio tem, na verdade, uma situação jurídica na corporação cujo conteúdo não se confunde (inteiramente) com o da participação (em sentido objectivo) e o estabelecimento da respectiva fronteira ainda requer um ulterior trabalho de elaboração doutrinal [cclxxxii] .

Em relação aos direitos especiais - que, na sociedade anónima, só podem referir-se a categorias de acções -, a lei diz expressamente que eles se transmitem com a participação (art. 24.4 CSC); ao passo que, em princípio, nas sociedades por quotas, são transmissíveis apenas os direitos patrimoniais (art. 24.3) e, nas SNC, são todos intransmissíveis (art. 24.2).

B - AS FORMAS DE TRANSMISSÃO (POR ACTO ENTRE VIVOS) DAS ACÇÕES

171. Importa, finalmente, fazer uma breve referência ao modo como se opera a transmissão das acções. Esta questão tem relativamente ao tema central deste trabalho um carácter algo marginal e, por isso, não se vai aqui além de uma síntese de ideias já expostas anteriormente e do levantamento de questões que, sendo de inegável interesse prático, não foram por mim ainda suficientemente estudadas, de forma a permitir conclusões seguras. Além disso, a análise será circunscrita às transmissões voluntárias entre vivos, que são aquelas que levantam maiores dificuldades [cclxxxiii] .

1. A questão da transmissão das acções por mero efeito do contrato

172. Um dos princípios caracterizadores do nosso sistema jurídico – pelo menos desde o código civil de 1867 (cf. os arts. 715, 1549, 789) – é, sem dúvida, o princípio consensualista ou princípio do mero contrato (cf., nomeadamente, os arts. 408, 409, 874, 879a), 954a) e 578.1 CC) [cclxxxiv] , segundo o qual os contratos translativos (ou constitutivos) de direitos são aptos para operar a sua transferência (ou constituição) solo consensu.

Ele traduz-se, portanto, na atribuição a este tipo de negócios de uma determinada qualidade. Questão diferente é a de saber em que condições um contrato assim concebido opera, efectivamente, a sua eficácia. Aqui estamos, na verdade, no domínio dos pressupostos gerais do fenómeno translativo, exteriores ao negócio, que podem resumir-se no seguinte: para que a transmissão se produza, é necessário que (além de um contrato apto para o efeito) o direito exista individualizado na esfera jurídica do transmitente [cclxxxv] .

Os artigos 408 e 409 CC tratam directamente deste segundo problema e pressupõem resolvido o primeiro no sentido apontado. O segundo permite às partes paralizarem a produção do efeito translativo que, de acordo com o princípio consensualista e os pressupostos gerais da transmissão, sem a sua cláusula de reserva da propriedade, se daria. O art. 408 define (directa e essencialmente [cclxxxvi] o momento em que a transmissão se dá.

173. O princípio do mero contrato (também dito da eficácia real dos contratos), na medida em que representa uma espiritualização do fenómeno translativo (substituindo o princípio da tradição, que, por sua vez também já conhecia formas fortemente espiritualizadas), significa uma simplificação do tráfico e, portanto, nessa medida, a sua promoção. Tendo os títulos de crédito surgido no sector dos valores mobiliários para tornar céleres e seguras as respectivas transacções, a afirmação pelos autores mais antigos da sobrevivência do princípio da tradição, pelo menos nos títulos ao portador [cclxxxvii] , é um anacronismo que, não só não é justificado pela função do título, como até a contraria. É portanto, de aplaudir inteiramente a aplicação, pela nossa doutrina mais moderna (e pela jurisprudência), do princípio consensualista às acções [cclxxxviii] .

174. A transmissão destas, quer estejam tituladas quer não, dá-se, portanto, nos termos gerais. Há no entanto, por um lado, que fazer uma ressalva; e, por outro, que ver o caso especial da acções fungíveis.

Quanto à primeira, é de referir que, havendo concorrência de transmissões, uma aquisição cartular de boa fé prevalece sobre uma anterior transmissão de direito comum. Esta é, na verdade, a consequência lógica do facto de a ordem jurídica prever uma lei especial de circulação dos direitos titulados.

Poderia mesmo pensar-se que quem tem a seu favor uma simples forma cartular de transmissão (v.g. o acordo de transmissão de uma acção ao portador acompanhada da entrega do título) deveria estar ao abrigo de qualquer pretensão de anterior transmissário (não empossado). A regra da tutela do adquirente (cartular) de boa fé garante, no entanto, suficientemente, a segurança do tráfico e constitui, por isso, o único caso em que se justifica um desvio às regras gerais.

É de referir, a propósito, que, verdadeiramente, não há aqui – ao contrário do que sucederia no caso de se dar, sem mais, prevalência à forma cartular de transmissão – um afastamento do princípio da prioridade temporal das transmissões. O segundo adquirente, cartular e de boa fé, não adquire o direito por um (válido) negócio translativo, mas ope legis, como se disse acima.

N.A.: Acerca deste ponto, revemos a nossa posição: o tráfico cartular (e também o escritural) deve ser desembaraçado de obstáculos susceptíveis de o entravar, incluindo de índole processual. Por isso, pensamos que, salvo em casos excepcionais de fraude comprovada - e, porventura, ostensiva -, uma transmissão cartular deve prevalecer sempre sobre uma transmissão meramente consensual.

175. Em relação às acções depositadas em regime de fungibilidade nos termos do DL. 59/88 e às acções escriturais – que, nos termos do art. 2.1 do DL. 229-D/88, constituem direitos fungíveis – é pelo menos duvidoso que a sua transmissão possa dar-se sem que ocorra a execução da ordem de transferência dada pelo alienante à instituição depositária das primeiras ou à entidade que tem a seu cargo o serviço de registo e movimentação das segundas. Na verdade, dada a natureza absolutamente fungível do objecto em causa, a situação não parece ser diferente daquela que ocorre no caso de depósito bancário de numerário. É ponto sobre o qual não tenho, no entanto, ainda uma opinião definitiva.

N.A.: Hoje existe um vasto setor da doutrina que nega as transmissões consensuais, em especial de valores mobiliários escriturais (cfr., por todos, Vera EIRÓ, «A transmissão de valores mobiliários - As acções em especial», Themis 2005, p. 145 ss). Contra, com mais indicações e assinalando que a fungibilidade reduz o campo das mesmas, podem ver-se Almeida COSTA / Evaristo MENDES, «Transmissão de acções tituladas nominativas» (2011), cit., p. 63 ss.

2 . As formas de transmissão em especial

a) Acções não representadas cartular ou escrituralmente

176. As acções sem representação, cartular ou escritural, são transmissíveis por acto entre vivos [cclxxxix] , nos termos gerais. Aplicando ao caso - no essencial - o regime da cessão de créditos [ccxc] , sendo o objecto desta individualizado, a transmissão dar-se-ia, entre as partes e face a terceiros, solo consensu, mas um eventual conflito de adquirentes seria resolvido de acordo com a regra da prioridade temporal da sua notificação ou aceitação (art. 584 CC).

Não há dúvidas de que, face à sociedade, a transmissão só é eficaz com a sua comunicação a esta (cf. o art. 228.3 CSC), ou, existindo livro de registo das acções, com o seu averbamento neste ou no termo do prazo referido no art. 326.5 CSC, porventura aplicável ao caso, por analogia [ccxci] . Mas a participação não é nenhum crédito pelo que a questão de um eventual conflito de adquirentes me parece, em princípio, de resolver segundo a regra geral da prioridade temporal da própria transmissão [ccxcii] . A norma do art. 584 CC poderá, eventualmente, justificar-se no caso dos créditos (cf. o art. 585 CC), mas não creio que a sua aplicação seja de generalizar [ccxciii] .

b) Acções tituladas ao portador

177. A transmissão por acto entre vivos das acções ao portador dá-se, entre as partes e face a terceiros, de acordo com o que se viu até aqui, por mero efeito do contrato de alienação, Havendo, no entanto, uma conflituante transmissão acompanhada de entrega do título (cf. o art. 327.1 CSC), o respectivo adquirente empossado de boa fé é tutelado de acordo com o princípio que se estrai do art. 21 LUCh (aquisição cartular).

Estando as acções registadas, a sua transmissão dá-se nos termos dos arts. 22 ss e 26 do DL. 408/82; e, relativamente àquelas que estiverem depositadas ao abrigo deste diploma, deverá ter-se em conta o seu art. 27 (cf. também o art. 4.3). Se estiverem depositadas e forem transaccionadas como direitos fungíveis (segundo o DL. 59/88), é duvidoso, como se disse acima, que a sua transmissão possa operar-se sem a execução da ordem de transferência do alienante pelo depositário.

N.A: Como se observou mais acima, a transmissão dá-se com eficácia entre as partes e em relação a terceiros em geral (máxime credores das partes) por mero efeito do contrato, mas, havendo uma transmissão jusmobiliária conflituante, esta deve prevalecer sobre uma anterior transmissão meramente consensual, salvo o caso excepcional da fraude. A regra da aquisição de boa fé, hoje constante do art. 58 do CVM, não chega, portanto, a intervir. Recorda-se também que as acções ao portador foram, entretanto, extintas (Lei 15/2017 e DL 123/2017).

c) Acções tituladas nominativas

178. A transmissão por acto entre vivos das acções tituladas nominativas dá-se - entre as partes e face a terceiros com excepção da sociedade (relativamente à qual o adquirente só é considerado sócio nos termos acima vistos (cf. o § 1 e o art. 326 CSC) - por mero efeito do contrato de alienação, com as especialidades resultantes do disposto nos arts. 4.3, 22, 26 e do DL. 408/82 (cf. o art. 1.1 deste diploma).

De acordo com a doutrina tradicional, tanto entre nós como na Itália (cf. o § 1), o adquirente cartular de boa fé é tutelado de acordo com o princípio legalmente previsto para os títulos à ordem e ao portador (cf. os arts. 16 II LULL e 21 LUCh e supra, § 1), pelo que, em caso de concorrência de transmissões, o seu direito prevalecerá. Sendo aplicável o regime do DL. 59/88, vale a observação feita na alínea anterior para as acções ao portador.

N.A: A matéria encontra-se hoje regulada no art. 102 do CVM. Como se observou a respeito das acções ao portador, a transmissão dá-se com eficácia entre as partes e em relação a terceiros em geral (máxime credores das partes) por mero efeito do contrato, mas, havendo uma transmissão jusmobiliária conflituante, esta deve prevalecer sobre uma anterior transmissão meramente consensual, salvo o caso excepcional da fraude. A regra da aquisição de boa fé, hoje constante do art. 58 do CVM, não chega, portanto, a intervir. Para este efeito, o registo da transmissão - que possui um significado legitimador - está fora do iter translativo, embora ele faça parte do processo de transmissão com eficácia plena.

d) Acções escriturais

179. A transmissão por acto entre vivos de acções escriturais dá-se, de acordo com o art. 5 do DL 229-D/88 através da sua inscrição em conta já existente ou aberta para o efeito em nome do beneficiário de declaração de alienação, dirigida à entidade encarregada do serviço deste tipo de acções, e da correspondente movimentação da conta do transmitente.

Como se disse anteriormente, a natureza absolutamente fungível do objecto em causa é, pelo menos, de molde a pôr em dúvida a possibilidade de uma transmissão anterior a esta escrituração contabilística. Seja como for, de acordo com a ideia de que a acção é um direito-valor – mas reservando uma opinião definitiva sobre o assunto para outra altura, já que é necessário ver se a segurança do tráfico o exige -, parece aplicável ao adquirente em cuja conta foram registadas as acções a regra da tutela do adquirente de boa fé.

N.A: A aplicação da regra da aquisição de boa fé consta hoje do art. 58 do CVM. Quanto ao caráter fungível das acções, como se observou, ele reduz o campo de aplicação do princípio da consensualidade, mas, a respeito de lotes individualizados (por ex., todas as acções inscritas em nome de x na conta y detida junto do intermediário financeiro z), ele ainda pode funcionar.


BIBLIOGRAFIA GERAL ·

(Autores cujas obras não são referidas no texto)

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C) Comentários ao HGB (Handelsgesetzbuch) (Código Comercial):

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E) Comentário à ZPO (Zivilprozessordnung)(Código de Processo Civil):

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ÍNDICE IDEOGRÁFICO SUMÁRIO

Acção

- acepções : n.ºs 17, 79, 131 ss

- - conjunto formado pela participação e o título/registo: n.º 131

- - fração do capital/unidade de valor: n.ºs 17, 131

- - participação social (em sentido objectivo): n.ºs 17, 78.1, 79, 82, 86, 131, 139, 170

-- (em) Renaud: n.ºs 17 ss

- - título: n.ºs 17, 131 ss; v. título accionário

- adquirente de boa fé: v. transmissão

- ao portador: n.ºs 28 ss, 134, 138, 148 s; v. título e transmissão

- - título de crédito: n.ºs 27 s, 148 s; v. título accionário

- autonomia : n.ºs 22, 82, 150; 76, 114, 129, 151, 158, 166 s; v. título e transmissão

- circulação : nºs 73 ss, 150 ss, 165 ss

- - à margem da sociedade: n.ºs 157 ss

- conceito/noção : n.ºs 6, 17, 59, 78.1, 79, 82, 131 ss, 137: v. acepções

- depósito: nºs 160, 164

- desmaterialização: n.ºs 26 s, 78.5, 147, 160 ss

- direito corporativo : n.ºs 17, 18 ss, 78.7, 145; v. participação social e Mitgliedschaft

- - Sem ou com obrigação de entrada: n.ºs 20 s

- (e) direito à qualidade de membro: nº 20; cfr. n.º 61

- direito-valor : nºs 21, 25 s, 78.6, 78.8, 146 s; cfr. n.º 16

- direito à representação (cartular) : n.ºs 18, 25, 27, 61, 78.3 s, 141 s

- (e) divisão do capital em ações : n.ºs 17, 22, 82, 131, 133, 137

- escritural : n.ºs 131, 133, 135, 138, 146 s, 161 ss; v. direito-valor

- fungibilidade : n.ºs 147, 160, 163, 175

- incorporação : n.ºs 29 ss, 39 ss

- indivisibilidade : cfr. n.º 10

- incindibilidade : cfr. n.º 10, 78.10; v. participação social e Mitgliedschaft (incindibilidade)

- não titulada nem escritural : n.ºs 73, 117, 136, 140 ss, 176

- - cessão: n.ºs 73, 78.18 s, 176

- nascimento : n.ºs 8, 24, 73, 78.2, 85 s, 136

- natureza jurídica: n.ºs 17 ss, 54 ss, 78.7 s, 78.15, 111 s

- noção: v. conceito

- nominativa : n.ºs 28 ss, 138, 150 ss; v. título e transmissão

- - direito à inscrição no registo das ações: n.ºs 28, 61, 155 s

- - (e) legitimação: n.ºs 28, 156

- - função da nominatividade: n.º 28

- - origem: n.º 150

- - (e) regime de registo ou depósito: n.º 166

- - (como) título à ordem: n.ºs 27 s, 73; cfr. 152 ss, 157

- - (como) título de crédito: n.ºs 27 ss, 151 ss; v. título accionário

- - (como) título nominativo: n.ºs 150 ss, 157 s

- - transmissão: v. transmissão

- objecto do tráfico jurídico : n.ºs 73 ss, 78.3 s, 165 ss; v. circulação e título accionário (transmissão)

- - fenómeno sucessório: n.ºs 7, 75, 78.17, 165 ss

- origem : n.º 19; v. nominativa

- - em Renaud: n.º 17

- participação social / Mitgliedschaft : n.ºs 1 s, 17 ss, 131 ss, 139; v. direito corporativo

- - (e) posição global de membro: n.ºs 60 s, 83, 139, 170

- - (e) outras concepções: v. natureza jurídica

- representação : n.ºs 27 ss, 131 ss

- - cartular: n.ºs 17, 27 ss, 131 ss, 148 ss

- - escritural: 131, 133, 135, 146 s, 161 ss

- titulada : n.ºs 17, 27 ss, 131 ss, 148 ss

- titulável : n.ºs 25, 53, 61, 78.1, 133, notas 56, 118 e 241

- título acionário : n.ºs 17 ss, 27 ss, 134, 138, 148 ss

- - desmaterialização/perda da função do título: n.ºs 26 s, 78.5, 147, 160 ss

- - direito ao título: nºs 18, 25, 27, 61, 78.3 s, 141 ss

- - direito ao registo (AN): n.ºs 28, 61, 155

- - espécies: n.ºs 27 ss, 132, 148 ss

- - função: n.ºs 30 ss, 133 s, 138, 146, 150 ss; cfr. 26, 158, 167,173

- - natureza causal: n.º 148

- - natureza declarativa: n.ºs 27, 51, 134, 148

- - (na) teoria geral dos títulos de crédito: n.ºs 27 s, 29 ss, 134, 148 ss

- - - autonomia: n.º 151, 167; v. autonomia

- - - incorporação: n.ºs 29 ss, 39 ss

- - - - (e) transmissão: n.ºs 31 ss, 172 ss

- - - legitimação: n.ºs 134, 152 s, 155 s

- - - -intermédia: 155 s

- - - regra de que o direito segue o título: n.ºs 27, 29 ss, 41, 50

- - - - crítica: n.ºs 41 ss, 75

- - (e) restrições à transmissibilidade: n.ºs 49 ss

- - segundo plano em relação ao direito inscrito: n.ºs 27, 41 ss, 146

- tráfico jurídico : v. circulação e transmissão

- transmissão : n.ºs 27 ss, 73 ss, 78.3 s, 78.14, 117, 151 ss, 165 ss

- - acções ao portador : n.ºs 27, 28, 33, 36 ss, 73, 149, 152, 177

- - acções escriturais: n.ºs 138, 163, 179; v. direito-valor

- - acções nominativas: n.ºs 27 s, 33 ss, 38 ss, 73, 151 ss, 155 ss, 178

- - acções sem representação formal: n.º 176

- - (e) autonomia: n.ºs 76, 78.19, 114, 129, 155 ss, 167; v. autonomia e tutela do adquirente

- - cartular: n.ºs 27 ss, 151 s, 156 ss

- - - (de) acções ao portador: n.ºs 27, 33, 38, 73, 149, 177; cfr. 36 ss (cessão), 172 ss (transmissão consensual)

- - - (de) acções nominativas: n.ºs 27 s, 33 ss, 73, 151 ss, 155 ss, 178; cfr. 37 ss (cessão); 172 ss (transmissão consensual)

- - - - (e) direito à inscrição no registo das ações: n.ºs 28, 61, 155 s

- - - - endosso (AN): n.ºs 27 ss, 39, 73, 152, 154, 157 ss

- - - (e) inoponibilidade de excepções pessoais: v. autonomia e cessão

- - conflito de transmissões: 37, 174, 176 ss

- - cessão: n.ºs 33 ss, 44 ss, 73, 76, 78.18 s, 176; v. consensualidade

- - - (e) inoponibilidade de excepções pessoais: n.ºs 76, 78.19, 151, nota 293

- - consensualidade: n.ºs 31 ss, 44 ss, 172 ss; v. cessão

- - (e) direitos especiais: n.º 170

- - (e) direitos patrimoniais autónomos: n.ºs 77, 78.12, 87, 97, 169; v. participação social / Mitgliedschaft

- - eficácia perante a sociedade: n.ºs 83, 117 s, 139, 156, 168, 176; cfr. 138, 178

- - escritural : n.ºs 138, 163, 179; v. direito-valor

- - fenómeno sucessório: n.ºs 7, 75, 78.17, 165 ss

- - modos: n.ºs 33 ss, 73, 78.17 s, 171 ss, 176 ss

- - objecto: n.ºs 31 ss, 41 ss, 73 ss, 166, 169 ss

- - tutela da sociedade que regista: n.º 157

- - tutela do adquirente de boa fé: n.ºs 47, 134, 138, 151 ss, 157 ss, 166, 177 ss

- transmissibilidade:

- - limitada: n.ºs 28, 50 ss, 118 ss, 126, 138, 144

- - - consentimento: n.ºs 118 ss

- - - - ineficácia relativa: n.º 120; cfr. 130

- - - eficácia erga omnes das restrições: n.ºs 118 s

- - - preferência: n.º 119

- - livre: n.ºs 28, 51, 162

- unidade de valor e de participação social : n.ºs 4, 6, 111, 131, 137

- valor mobiliário : 25 s, 131, 137 s, 142

- - escritural: v. (acção) escritural

- - titulado: v. (acção) titulada

Mitgliedschaft

- (e) acção: n.ºs 17 ss, 78.1

- conceito/noção : n.ºs 1 ss, 8, 23, 78.7 s; v. participação social

- (e) comunhão patrimonial: n.ºs 14, 54 ss

- conteúdo : n.ºs 2, 9, 11, 15 s, 78.7-9, 78.13s

- - (e) direitos derivados: n.ºs 9, 78.11

- direito subjectivo: v. natureza jurídica

- figura unitária do direito associativo privado : n.ºs 2 ss, 12 ss

- incindibilidade/indissociabilidade : n.ºs 10, 63, 78.10

- natureza jurídica : n.ºs 9, 12 ss; cfr. 54 ss

- - carácter social/corporativo: n.ºs 9, 12 ss, 78.7, 106

- - carácter unitário: v. incindibilidade

- - direito subjetivo: n.ºs 11, 15 s, 78.7 s, 106

- - - corporativo: n.ºs 15, 18 ss, 78.7, 106

- - - direito-valor: n.ºs 16, 78.8

- - posição em relação jurídica: n.º 9

- - posição/qualidade de membro: n.ºs 2 ss, 8 s, 106

- - relação jurídica: n.ºs 8 s

- nascimento : n.ºs 3 ss, 8, 78.1-4 (posição accionária)

- (e) participação social: n.ºs 1, 79

- posição (em relação) jurídica fundamental : n.ºs 8 ss, 15, 78.11 ss

- - distinta dos direitos patrimoniais dela destacados: n.ºs 9 s, 78.11 s; v. participação social

- (e) posição global de membro : n.ºs 6 s

- (nas) sociedades de capitais : n.ºs 4 ss, 8

- (nas) sociedades de pessoas : nºs 3, 8, 13 s

- (e) status: n.ºs 3, 62, 65, nota 7

- tráfico jurídico : n.ºs 63 ss; v. acção

- - objecto: nºs 63 ss, 75

- - transmissão: n.ºs 67 ss

- - - sociedades de pessoas: n.ºs 68 ss

- - - srl: n.º 71

- - - acções: 73 ss

- unidade : v. incindibilidade

Participação social

- accionária: n.ºs 79, 82 ss; cfr. 2, 6 s, 17 ss, 78.1-3, 78-7 ss; v. acção

- - (e) divisão do capital em acções: n.ºs 82, 131, 133, 137; cfr. 6, 8, 17, 22, 24, 78.1

- - nascimento: n.ºs 85 s, 136; cfr. 8, 24

- - participação social em sentido objectivo: n.ºs 131, 170; cfr. 4, 6 s, 78.1, 82 s,

- - (e) posições jurídicas derivadas: n.ºs 84, 87 ss; cfr. 9 s, 78.11

- - (e) qualidade de sócio/posição global de membro: n.º 83; cfr. 6 s

- - representação cartular/titulação: n.ºs 148 ss, 177 s; cfr. 27 ss

- - - transmissibilidade limitada e representação: cfr. n.ºs 49 ss

- - representação escritural: n.ºs 146 s, 179; cfr. 25

- (e) afectação do valor da sociedade: n.ºs 89 s, 126; cfr. 16

- - cessão: v. posição jurídica fundamental

- conceito/noção : n.ºs 79 ss, 85; cfr. 1

- - (e) Mitgliedschaft: n.ºs 1, 79

- - (e) status: n.º 107, nota 207; cfr. 3 e nota 7

- - (e) acção: v. acção, (participação social) accionária

- - (e) posição jurídica global de membro (sócio): n.º 83; cfr. 3 ss

- configuração legal e estatutária: n.º 114 e nota 209, n.ºs 143 s, 167

- conformação estatutária : n.ºs 118, 120, 143 s, 159; cfr. 28, 51

- conteúdo : n.ºs 81, 85, 90; cfr. 2, 9, 11, 15 s, 78.7-9, 78.13s; v. posição jurídica fundamental e incindibilidade

- - (e) direitos derivados: n.ºs 84, 87, 90 ss, 96, 104, 167, 169; cfr. 9, 78.11

- - (e) direitos inerentes: n.ºs 92, 96

- direito subjectivo: v. natureza jurídica

- direitos: v. conteúdo, incindibilidade e posição jurídica fundamental

- exoneração: n.ºs 104, 121, 127, nota 230; cfr. 78.14, nota 11

- (e) liberdade de associação/desinvestimento : n.º 128

- incindibilidade/indissociabilidade : n.ºs, 90, 92, 98 ss, notas 193 e 195; cfr. 10, 63, 78.10, nota 17

- - cfr. propriedade: n.º 87, 90

- - (nas) sociedades de pessoas: n.ºs 98 ss

- nascimento : n.ºs 85 s, 136; cfr. n.ºs 3 ss, 8, 24, 78.1-4 (posição accionária)

- natureza jurídica : 106 ss; cfr. 9, 12 ss, 54 ss

- - direito subjectivo: n.ºs 106 ss, 109 ss, 115

- - - direito-valor: cfr. n.ºs 16, 78.8

- - - direito de participação: nota 201; cfr. 62, 78.15

- - - social ou corporativo: nºs 106, 109 s, 115; cfr. 9, 15, 18 ss, 78.7

- - - «sui generis»: n.º 108; cfr. 62

- - posição contratual: n.ºs 96 e nota 193, 107, 109, 113

- - - (e) cessão da posição contratual: n.ºs 113 s, 116 ss

- - - limites/crítica: 106, 116 ss, 121 ss, 129; v. incindibilidade

- - posição social/corporativa: n.ºs 106, 110, 115, 125 ss, 129

- - - posição numa organização corporativa: n.º 124; cfr. 107

- - - (e) relação de poder: n.ºs 125, 128

- - - (e) risco: n.ºs 85, 125; cfr. 13

- participação qualificada : nºs 11, 139

- posição jurídica fundamental : nºs 84, 87, 89 ss, 129; cfr. 8 ss, 15, 78.11 ss

- - cessão: n.ºs 114 ss, 129 s, 152, 165, 176; cfr. 172 ss, 177s, 29, 32 ss, 36 ss, 51, 69 ss, 73, 76, 78.18 s

- - (e) direitos inerentes: n.ºs 92, 96

- - distinta dos direitos patrimoniais dela destacados: n.ºs 84, 87, 90 ss, 96, 104, 167, 169; cfr. 9 s, 78.11 s

- - - cessão dos direitos como direitos futuros: n.ºs 90, 92, 94, 96, 98 s, 104, 167; cfr. 10, 78.12 e 88

- - - direito ao lucro: n.ºs 87, 90 ss, 96, 98, 102, 114

- - - direito de subscrição preferencial de ações: n.ºs 101, 103

- - - outros direitos: n.ºs 104 s, 114

- - (e) frutos civis/rendimentos: n.º 87

- - (cfr.) locação: n.ºs 87 s, 96

- - (cfr.) propriedade: n.ºs 87, 90, 96

- - (e) qualidade de sócio: n.ºs 81, 83, 86, 98, 100, 107, 111, 139; cfr. 78.13

- (nas) sociedades de capitais : n.ºs 79, 82, 85 s; cfr. 4 ss, 8

- (nas) sociedades de pessoas : n.ºs 79, 85; cfr. 3, 8, 13 s

- terminologia : n.º 1, 79

- tráfico jurídico : v. posição jurídica fundamental e acções

- unidade: v. incindibilidade


ÍNDICE

NOTA PRÉVIA

6

TÍTULO I

A TRANSMISSIBILIDADE DAS ACÇÕES COMO QUESTÃO FUNDAMENTALMENTE TÉCNICO-JURÍDICA

7

CAPÍTULO I

DIREITO ALEMÃO

8

§ 1º

OBJECTO DA TRANSMISSÃO

(Teoria da MITGLIEDSCHAFT)

9

A – A teoria da MITGLIEDSCHAFT em geral

9

1. Conceito de MITGLIEDSCHAFT - 9

a) Nas associações e nas sociedades de pessoas - 10

b) Nas sociedades de capitais - 10

aa) Sociedades por quotas

bb) Sociedades anónimas

2. A MITGLIEDSCHAFT como posição numa relação jurídica fundamental - 12

a) A MITGLIEDSCHAFT como relação jurídica, rectius, como posição numa relação jurídica fundamental (conteúdo)

b) A MITGLIEDSCHAFT como unidade indivisível (ou incindível) – p. 14

c) A MITGLIEDSCHAFT como direito subjectivo – p. 14

12

3. A MITGLIEDSCHAFT como posição jurídica de carácter social ou corporativo p. 16

a) A questão da classificação da MITGLIEDSCHAFT nas sociedades de pessoas

b) A MITGLIEDSCHAFT como direito corporativo p. 17

c) A MITGLIEDSCHAFT nas sociedades como direito-valor (Wertrecht) p. 18

16

B A ACÇÃO COMO MITGLIEDSCHAFTSRECHT (DIREITO CORPORATIVO) E COMO WERTRECHT (DIRIETO-VALOR)

18

1. Conceito de acção

18

2. A acção como direito corporativo e como direito-valor p. 19

a) Origem p. 19

b) No pensamento de RENAUD

c) No pensamento jurídico moderno p. 20

aa) A acção como direito corporativo p. 20

bb) A acção como direito-valor p. 22

19

3. O título acionário p. 23

a) Acções ao portador e acções nominativas p. 25

b) A acção na teoria geral dos títulos de crédito p. 26

aa) Noção de título de crédito. O postulado da indissociabilidade da titularidade do direito e do título

bb) Função dos títulos de crédito à ordem e ao portador. A questão das suas formas de circulação e a regra de que o direito segue o título. p. 27

cc) Títulos à ordem e ao portador e direitos de transmissibilidade restrita p. 38

26

4. Breve referência a outras concepções da acção e da sua natureza jurídica p. 40

a) A concepção realista da acção: o accionista como (com)proprietário p. 40

b) As concepções obrigacionistas da acção: o accionista como credor da sociedade. Tese de MATSUDA

aa) A superação das concepções obrigacionistas (em geral) p. 42

bb) A concepção de MATSUDA p. 42

42

§ 2º

A MITGLIEDSCHAFT COMO «OBJECTO» TRANSMISSÍVEL

45

A - A MITGLIEDSCHAFT COMO OBJECTO DO TRÁFICO JURÍDICO

45

1. A MITGLIEDSCHAFT como objecto do tráfico. Natureza do fenómeno translativo

a) Doutrina dominante p. 45

b) Breve referência a outras construções p. 46

45

2. A transmissão da MITGLIEDSCHAFT (por acto entre vivos) p. 47

a) Nas sociedades de pessoas

b) Nas sociedades por quotas p. 48

c) Conclusão p. 49

47

B – A TRANSMISSÃO DAS ACÇÕES - p. 49

1. Os modos de transmissão das acções (a questão do objecto da transmissão no caso do direito accionário estar titulado)

a) Em geral (acções livres) p. 49

b) Acções vinculadas p. 50

c) Objecto da transmissão p. 50

49

2. O regime de transmissão

51

§ 3º

PRINCIPAIS CONCLUSÕES

52

CAPÍTULO II

DIREITO PORTUGUÊS

55

§ 1º

OBJECTO DA TRANSMISSÃO

(A acção como PARTICIPAÇÃO SOCIAL. Conceito e natureza)

55

A – A PARTICIPAÇÃO SOCIAL EM GERAL

56

1. Conceito de participação social

56

2. A participação social como posição numa relação jurídica fundamental e como unidade incindível. A questão da sua natureza jurídica, em especial, a questão da sua qualificação como direito subjectivo e como posição contratual

a) A participação social como posição jurídica fundamental, distinta dos direitos que têm nela a sua fonte e daqueles que lhe podem suceder p. 59

b) Natureza corporativa da participação social. A questão da sua qualificação como direito subjectivo e como posição contratual p. 69

58

B - A ACÇÃO COMO DIREITO CORPORATIVO E COMO DIREITO-VALOR

82

1. Conceito de acção. A participação accionária não titulada nem registada em conta p. 82

a) Conceito de acção. As acções como participações e como valores mobiliários p. 82

b) A participação accionária não titulada nem registada em conta p. 85

82

2. A acção como direito corporativo e como direito-valor

a) A acção como direito corporativo p. 87

b) A acção como direito-valor p. 88

87

3. As acções tituladas p. 89

a) Acções ao portador p. 90

b) Acções nominativas

c) Acções sujeitas a depósito nos termos do DL. nº 59/88, de 27 de Fevereiro p. 96

90

4. As acções escriturais (DL n.º 229-D/88, de 4 de Julho)

97

5. As acções registadas ou depositadas nos termos dos arts. 330 ss CSC e do DL n.º 408/82, de 29 de Setembro

100

§ 2º

A PARTICIPAÇÃO ACCIONÁRIA COMO «OBJECTO» TRANSMISSÍVEL

102

A – A PARTICIPAÇÃO ACCIONÁRIA COMO OBJECTO DO TRÁFICO JURÍDICO

102

1. A transmissão da participação accionária como fenómeno sucessório p. 102

a) Em geral

b) A questão da participação titulada p. 102

102

2. A transmissão da participação social (por acto entre vivos) p. 104

a) Estrutura da transmissão

b) Objecto da transmissão – p. 104

104

B – AS FORMAS DE TRANSMISSÃO (POR ACTO ENTRE VIVOS) DAS ACÇÕES

105

1. A questão da transmissão das acções por mero efeito do contrato

106

2. As formas de transmissão em especial p. 108

a) Acções não representadas cartular ou escrituralmente – p. 108

b) Acções tituladas ao portador – p. 109

c) Acções tituladas nominativas – p. 110

d) Acções escriturais – p. 111



* Os preceitos que, a este respeito, se indicam sem referência ao diploma a que pertencem são da Aktiengesetz de 1965.

[i] Cf., por exemplo, RAISER, p. 28; HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 3 (§ 53ª, n. 6); HEFERMEHL, 10.00, p. 26 (nº 63), 10.10, p. 6s (nº 10), 29 ss (nºs 47 ss); M Ö HRING/NIRK/TANK, I, p. 90 (nº 133); LUTTER1 (1988), I/3, p. 571 (n. 3 da introd. ao § 53a) ; ST ÜDEMANN, p. 33, 37 ss; GIERKE (J), p. 262 ss; WIELAND (K), II, p. 42 ss; W ÜRDINGER, p. 45 ss. O que se diz acerca das acções das sociedades anónimas vale, naturalmente, também para as das sociedades em comandita por acções.

[ii] Cf., por exemplo, BGHZ 81, p. 84; HEFERMEHL, 10.00, p. 26 (nº 63).

[iii] Cf. os §§ 13 ss GmbHG, bem como, por exemplo, HEFERMEHL, cit. na nota anterior, e BAUMBACH/ HUECK1, p. 24 (§ 3 GmbHG, n.º 6B), HUECK, in BAUMBACH/ HUECK1 (15ª ed., 1988), p. 5 (n. 15 da introd.), p. 54 (§ 3 GmbHG, n. 19), p. 210 (§ 14 GmbHG, n. 2).

[iv] Cf. a nota (1) e o texto correspondente.

[v] Cf., por exemplo, LUTTER, p. 86; WIEDEMANN, p. 23, WIEDEMANN 1, p. 95, 382 s; COING, § 35 BGB, n. 25; HEFERMEHL, 10.00, p. 26 ss (nºs 63 ss); HADDING1, p. 353ss (§ 38 BGB, n. 2 ss); HUECK/CANARIS, p. 190; LEHMANN/HOENIGER, p. 314.

[vi] Cf., por exemplo, LUTTER, p. 86, 99 s, 158; LUTTER1, I/2, p. 364 s (n. 12 da introd. ao § 54); HEFERMEHL, 10.10, p. 6 s (nº 10); HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 3 (n. 6 da introd. ao § 53a); HADDING, p. 353 s, 367 (§ 38 BGB, n. 2, 3a e 28); HUECK, p. 177; RAISER, p. 28; M ÖHRING NIRK/TANK, I, p. 90; KRAFT (A), I/1, p. 9 (§ 1, n. 31); MEYER-LANDRUT, p. 67 (§ 1, n. 39); GODIN/WILHELMI, p. 12 (§ 1, n. 16); GIERKE (J), p. 262 s; ST ÜDEMANN, p. 37; LEHMANN/HOENIGER, p. 314; WIELAND (K), II, p. 42; HUECK, in BAUMBACH/ HUECK1 (15ª ed., 1988), p. 5 (n. 15 da introd.), p. 54 (§ 3 GmbHG, n. 19), p. 210 (§ 14 GmbHG, n. 2).

Adde, em geral, acentuando a primeira perspectiva, por ex.: M. HABERSACK, Die Mitgliedschaft - subjektives und «sonstiges» Recht, Tubinga (Mohr) 1996, p. 16 s, D. REUTER, MK z. BGB, 1, 3.ª ed., Munique (Beck) 1993, p. 528, KARSTEN SCHMIDT, Gesellschaftsrecht, Colónia/... (Carl Heymanns) 4.ª ed., 2002, p. 547ss, PENTZ, in Rowedder / Schmidt-Leithoff, GmbHG Komm., 5.ª ed., Munique (Vahlen) 2013 p. 510 ss (§ 14, n. 2 ss), e ALTMEPPEN, in Roth/Altmeppen, GmbHG Komm., 8.ª ed., 2015, p. 383ss (§ 14, n. 13 ss).

[vii] Sobre a diferente estrutura da MITGLIEDSCHAFT nas sociedades de pessoas e nas sociedades de capitais, cf., por exemplo, HEFERMEHL, 10.00, p. 26 s (nº 64).

[viii] Com relação às associações, cf., por ex., PALANDT/HEINRICHS, p. 37 [§ 38 BGB, n. 1 a) e b); mas cf. também n. 2, e infra, n. 148].N.A: Na verdade, é logicamente concebível umstatus de titularidade variável, em especial quando a Mitgliedschaft tem uma base patrimonial individualista, como é típico do fenómeno societário. Neste caso, porém, estamos a afastar-nos da teoria geral dos estados pessoais, inseparáveis da pessoa.

[ix] Cf. infra, no texto (§ 2 e Tít. II).

[x] Cf. os §§ 31(4), 5 II, 55 III e IV GmbHG, e, por exemplo, BAUMBACH/HUEK1, p. 24, 39, 79 e 293 (respectiv., n. 6B / § 3, n. 3B / § 5, n. 2 / § 15 e n. 5 / § 55, todos da GmbHG), HUECK, in BAUMBACH/ HUECK1 (15ª ed., 1988), p. 54 (§ 3 GmbHG, n. 19), 98 e s (§ 5, n. 10 e 11), p. 210 (§ 14, n. 3), 224 s (§ 14, n. 3).

[xi] Para além dos casos indicados no texto, outros há que são de molde a pôr, pelo menos, em dúvida a possibilidade ou a conveniência de reconduzir, sempre, a posição do accionista à soma das suas acções e merecem uma breve referência. Considere-se, em primeiro lugar, o dever de fidelidade ou lealdade (Treupflicht) do accionista. Este manifesta-se em duas direcções: por um lado, face à sociedade; por outro face aos demais accionistas [cf. LUTTER 1 (1988), p. 569, n. 6 da introd. ao § 53a AktG, com indic. bibl.] Em qualquer caso, tanto poderá considerar-se directamente inerente à acção como à qualidade de sócio. Mas pode afirmar-se que faz parte daquela? Não terá natureza essencialmente pessoal? Note-se, aliás, que, sendo a resposta afirmativa, é a própria noção corrente de acção que deve ser ajustada, já que este dever não se circunscreve à relação sócio-sociedade. Pense-se, em segundo lugar, num hipotético direito de exoneração do accionista (sobre este, cf. o tit. II). É concebível ser um tal direito, em abstracto, inerente à MITGLIEDSCHAFT, transmitindo-se com ela. Mas, dependendo ele, em concreto, de certos pressupostos que se verificam na pessoa do alienante, pode o adquirente exercê-lo na qualidade de transmissário? Não haverá que distinguir, pelo menos, entre um direito abstracto e um direito concreto? Finalmente, importa referir o princípio da igualdade de tratamento, princípio já antes admitido como princípio fundamental do direito das «corporações» e hoje expressamente consagrado no § 53a AktG (cf., nomeadamente, LUTTER/ZÖLLNER, p. 576 e s, n. 1 ss /§ 53a AktG). A doutrina dominante não reconhece a existência de um verdadeiro direito subjectivo à igualdade de tratamento: aquele princípio traduzir-se-ia numa simples situação de protecção de interesses corporativos e patrimoniais integrante da MITGLIEDSCHAFT, isto é, da acção. Mas, admitindo a distinção feita no texto, a construção poderia ser diferente.

[xii] Cf., por exemplo, LUTTER, p. 97 s; WIEDEMANN, p. 39; HEFERMEHL, 10.00, p, 26 ss (nºs 63 ss), 10.10, p. 6 (nº 10), 29 (nº 47), 33 (nº 52); WÜRDINGER, p. 45; ECKARDT, I, p. 65 (§ 1, n. 42); LEHMANN/DIETZ, p. 355; SCHILLING1, n. 4 s /§ 14 GmbHG; TUHR, I, p. 542 (§ 38); FLUME, p. 125 ss.

[xiii] Cf., por exemplo. LEHMANN/DIETZ, p. 365; STÜDEMANN, p. 37, 40; MEYER-LANDRUT, p. 65 ss (§ 1, n. 37 e 40); HEFERMEHL, 10.00, p. 27 (nº 65), 10.10, p. 33 (nº 52): ROTH1, p. 169 (§ 14 GmbHG, n. 3.1); MATSUDA, p. 244; HUECK, in BAUMBACH/ HUECK 1 (15ª ed., 1988), p. 213 (§ 14 GmbHG, n. 10 s; cf também p. 216, n. 19).

[xiv] Cf. a nota (12).

[xv] Cf. HADDING1, p. 353 s (§ 38 BGB, n. 3). Nada impede, porém, a utilização do termo para assinalar (também) a própria relação social, em sentido lato.

[xvi] Cf., por exemplo, WIEDEMANN, p. 54, 128; WÜRDINGER, p. 47; GODIN/WILHELMI, p. 38 s (§ 8, n. 7); ECKARDT, I, p. 134 (§ 8, n. 26); STÜDEMANN, p. 43; KRAFT (A), I/1, p. 84 s (§ 8, n. 41 ss, com indicação de mais literatura).

Adde, por ex.: KARSTEN SCHMIDT, Gesellschaftsrecht (2002), cit., p. 560 ss, com mais indicações.

[xvii] Cf. o art. 8 (3) AktG e a lit. cit. na nota anterior. Note-se que o conceito de indivisibilidade, em sentido lato, comporta uma dimensão quantitativa (indivisibilidade stricto sensu) e uma dimensão relativa ao conteúdo da posição jurídica (incindibilidade). A primeira não implica necessariamente a segunda, mas ambas são afirmadas pelos autores em geral. Cf., por ex., UWE HÜFFER, AktG Komm, 9.ª ed., Munique (Beck) 210, p. 48 s (§ 8, n. 30).

[xviii] Cf., por exemplo, WIEDEMANN, p. 119, 212, 274 ss, 292 s, 296 ss; STÜDEMANN, p. 43; GODIN/WILHELMI, p. 38 (§ 8, n. 7); ECKARDT, I, p. 134 s (§ 8, n. 27); KRAFT(A), I/1, p. 85 (§ 8, n. 45, com indicação de mais literatura).

[xix] Cf., nomeadamente, WIEDEMANN, p. 119, 299 ss (cf. também p. 286); FLUME1, p. 778 s; SCHÖNHOFER, p. 86 s.

[xx] No caso das quotas, a admissibilidade da cessão da legitimação é discutida. Cf., por exemplo, MEYER-LANDRUT1, p. 184 s (§ 14 GmbHG, n. 7).

[xxi] Cf. WIEDEMANN, p. 288 ss [e a lit. cit. na n. (21)]; ECKARDT, I, p. 135 (§ 8, n. 28); KRAFT(A), I/1, p. 85 (§ 8, n. 46 ss, com indicação de mais literatura); SCHILLING1, n. 31 ss / §14 GmbHG.

[xxii] Qualificam a MITGLIEDSCHAFT, em geral, como direito subjectivo, nomeadamente: LUTTER, p. 101 ss, 158; WIEDEMANN, p. 39, e WIEDEMANN1, p. 95, 382 s; ULMER (P), n. 210 / §105 HGB; e (embora com referência às sociedades de pessoas) ainda: HUBER, p. 164, 168 ss (cf. 165 ss), e FLUME, p. 127. Cf. também SCHILLING1, n. 4 s / § 14 GmbHG; ROTH1, p. 167, 175 (n. 2.1 / §14 e n. 2.4 / §15 GmbHG (quotas de SQ); HUECK, in BAUMBACH/ HUECK1 (15ª ed., 1988), p. 211 (com mais indicações); SCHÖNHOFER, p. 29 ss (acções e quotas de SQ); SCHOLTZ/WINTER, n. 6 / §14 GmbHG (quotas de SQ); STAUDINGER/SCHÄFER, p. 175 (n. 84 / § 823 BGB: acções e quotas como«sonstiges Recht» no sentido do § 823 BGB); KÖHLER, p. 39. Adde, por ex., M. HABERSACK, Die Mitgliedschaft (1996), cit., passim, KARSTEN SCHMIDT, Gesellschaftsrecht (2002), cit., p. 549 s.

A propósito da posição de associado e de sócio numa sociedade de pessoas, nega tal qualificação, nomeadamente, HADDING1, p. 354 (n. 3a / § 38 BGB); HADDING, p. 251 ss, afirmando ser esta a orientação dominante da doutrina (p. 255), que analisa extensamente. Para uma indicação da restante literatura, num sentido e noutro, cf. LUTTER, p. 101, n. (82a), e WIEDEMANN, p. 39, n. (1), WIEDEMANN1, p. 95, n. (14). Sobre as acções, em especial, ver a nota a seguir e o texto correspondente.

[xxiii] Cf., nomeadamente, KRAFT/KREUTZ, p. 229, 55 (mas, quanto à MITGLIEDSCHAFT nas soc. civis, cf., em sentido diferente, p. 135 s); RAISER, p. 28, 30; GIERKE (J), p. 263 s, 322; LEHMANN/HOENIGER, p. 314 ss; MÖHRING/NIRK/TANK, I, p. 90; KRAFT (A), I/1, p. 9 s, 97 ss, 105 ss, 156 (n. 32 / § 1, 2 ss / § 10, 2 ss, 33 / § 11); ECKARDT, I, p. 65 (n. 42 / § 1); HEFERMEHL, 10.10, p. 29 (nº 74); MERTENS, p. 250; HUECK/CANARIS, p. 20 (cf. p. 13 ss); LUTTER/SCHNEIDER, p. 185; BOESEBECK, p. 1118; KLUNZINGER, p. 133; MATSUDA, p. 243 s.

[xxiv] WIEDEMANN1, p. 382 s; cf. também WIEDEMANN, p. 39. A mesma ideia pode ser expressa dizendo que a MITGLIEDSCHAFT é uma posição jurídica originária, ou um direito originário ou direito-tronco (Stammrecht), e que os direitos singulares dela decorrentes são direitos derivados (Folgerechte).

[xxv] HADDING1, p. 354 (n. 3a / § 38 BGB; cf. também a n. 2, p. 353).

[xxvi] Cf., criticamente, RIVOLTA, p. 128, 146.

[xxvii] Sobre o assunto, podem ver-se, nomeadamente: ULMER (P)4, n. 39 ss, 208 ss / § 105 HGB; STAUDINGER/KESSLER, p. 291 s, 305 ss (n. 23 ss,71 ss da Introd. ao § 705 BGB; TEICHMANN1, p. 482 ss; REUTER1, p. 488 ss (n. 1 ss / § 38 BGB); HADDING, p. 249 ss; LUTTER, p. 98 ss; FLUME1, p. 769 ss; LARENZ1, II (1981), p. 373 ss (cf. também p. 408 s). Cf. também supra, a seguir, e infra, § 2 e Tít. II.

Considerando que, no caso das sociedades, o fim comum imprime à relação um carácter mais intenso do que aquele que tem a (mera) relação obrigacional, diferenciando-a desta, cf. WIEDEMANN 1, p. 159, 357, WIEDEMANN, p. 41; cf. também BAUMBACH/HUECK1, p. 68 s. Considerando, com referência às acções, que os direitos e deveres que integram o conteúdo ou decorrem da MITGLIEDSCHAFT não estão, em princípio, unidos pelo sinalagma próprio das relações de carácter obrigacional, cf. LUTTER1, I/1, p. 368 (n. 4 / § 54); HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 21 (n. 7 / § 54).

[xxviii] Cf., nomeadamente, FISCHER (R), p. 105 s (n. 6 a / § 109 HGB), p. 39 s (n. 39 / § 105 HGB; cf. também n. 37 / § 105, p. 38); KESSLER, n. 75 da Introd. ao § 705 BGB (cf. também n. 4 ss / § 719 e n. 3 / § 717); cf., ainda, BAUMBACH/DUNDEN/HOPT, p. 449 (n. 2B / § 124 HGB), e BOHNENBERG, p. 354 (n. V g) / § 105 HGB) e 366 s (n. IV A / §109 HGB).

[xxix] Notando este aspecto, cf., por exemplo, BAUMBACH/DUNDEN/HOPT, p. 384 (n. 2 F / §105 HGB), e KRAFT/KREUTZ, p. 92. Cf. também infra.

[xxx] Cf. supra, n. (24).

[xxxi] Cf. WIEDMANN, p. 39. Segundo este autor (que cita ERMANN-WEITNAUER no mesmo sentido), direitos meramente patrimoniais seriam apenas os direitos reais e só o controverso direito geral de personalidade seria um puro direito de personalidade; os demais, como os direitos de autor, os direitos corporativos, etc., compor-se-iam de elementos patrimoniais e pessoais (p. 15). Cf. também FLUME, p. 127; SINN, p. 43; RAISER, p. 30; e, com relação à MITGLIEDSCHAFT como relação jurídica, LEHMANN/DIETZ, p. 355 s.

[xxxii] Cf., por exemplo, WIEDMANN, p. 40 s; WIEDMANN1, p. 702 s; BAUMBACH/HUECK1, p. 68 s (n. 1 e 2A da introd. ao § 13 GmbHG); e infra, no texto.

[xxxiii] Cf. WIEDMANN, p. 39; WIEDMANN1, p. 382 ss; LUTTER, p. 130 ss; STAUDINGER/SCHÄFER, p. 175 (n. 84 / § 823 BGB); HUECK, in BAUMBACH/ HUECK1 (15ª ed., 1988), p. 211 (§ 14 GmbHG, n. 5, com indicações); e infra, no texto. Adde, por ex., M. Habersack, Die Mitgliedschaft (1996), cit., passim.

[xxxiv] Cf. HUBER, p. 164 ss; GIERKE (J), p. 262 ss, 322 (em especial, p. 264); e infra, no texto.

[xxxv] RENAUD, p. 89 ss.

[xxxvi] RENAUD, p. 89 ss. Cf. o ADHGB (de 1861), art. 207, o HGB, § 178, a AktG de 1937, § 1, e a AktG de 1965, §1(2). Para uma leitura diferente do princípio, cf., no entanto, KRAFT (A), I/1, p. 9s (n. 30ss / § 1), EKARDT, I, p. 65 (n. 42 ss / §1); e, na literatura suíça, cf. o art. 620(1) CO e GREYERZ, p. 72. Cf. também infra, no texto.

[xxxvii] RENAUD, p. 89, 96 ss.

[xxxviii] RENAUD, p. 90, 105 ss.

[xxxix] Cf., por exemplo, WIELAND (K), II, p. 36 ss; LEHMANN/HOENIGER, p. 314 ss; STÜDEMANN, p. 33 ss; LEHMANN/DIETZ, p. 289 ss; BAUMBACH/HUECK, p. 12 s (n. 14 a 16 / § 1); HEFERMEHL, 10.10, p. 6 ss (nºs 9 ss); RAISER, p. 27 ss. Cf. também MATSUDA, p. 243 e 264.

Mas há quem circunscreva os significados da acção aos dois últimos: cf. KRAFT (A), I/1, p. 9 s (n. 30 ss / § 1); ECKARDT, I, p. 65 (n. 42 ss / §1). O termo é ainda usado como sinónimo de «posto»/posição de membro (Mitgliedschaftstelle ou Mitgliedstelle); cf., nomeadamente, COSACK(K), p. 600, 631 s.

[xl] Cf. LEHMANN, p. 9 s, 24, 66; STÜDEMANN, p. 26 ss; RENAUD, p. 89. Sobre a origem da moderna sociedade anónima, caracterizada sobretudo pela divisão do seu capital em acções, ver LEHMANN, p. 4 ss; cf. também, por exemplo, LEHMANN/HOENIGER, p. 307 ss; GIERKE (J), p. 248 ss; FISCHER, p. 19 ss; STÜDEMANN, p. 22 ss.

[xli] Ver LEHMANN, p. 26, 58, e, em especial, 66 ss; cf. STÜDEMANN, p. 28; GIERKE(J), p. 249; FISCHER, p. 69 ss. Cf. também, infra, a concepção de MATSUDA, p. 246 s.

[xlii] RENAUD, p. 89, 96, 98 ss, 105.

[xliii] RENAUD, p. 99 s. É de notar que, no que se refere à construção que este autor faz do direito, o seu pensamento não é clara e inequivocamente no sentido de considerar, antes de mais e directamente, como elemento de referência ou objecto do mesmo a qualidade de membro, à qual seria inerente um conjunto de (outros) direitos. Há, na verdade, quem veja no seu Aktienrecht um simples direito complexo, composto de uma série de direitos singulares (cf., neste sentido, RIVOLTA, p. 118).

[xliv] Cf., por exemplo, RAISER, p. 28; MÖHRING/NIRK/TANK, I, p. 90 (nº 133); STÜDEMANN, p. 33, 37 ss; GIERKE (J), p. 262 ss. Cf. também MATSUDA, p. 243 s.

[xlv] Cf. as notas (22 s) e (32). Cf. também RENAUD, p. 98 e 100.

[xlvi] Cf., nomeadamente, CANARIS, p. 933 (n. 1818), 1031 ss (n. 2040 ss); e infra, no texto. A classificação do direito como direito-valor não oferece, em geral, dúvidas no caso de ele estar documentado por título de crédito. Tratando-se de direito não titulado, há que distinguir a questão da sua classificação como direito-valor da do regime correspondente a essa classificação. A discussão, na doutrina alemã, centra-se no problema do regime.

[xlvii] Cf. supra, n. (36).

[xlviii] Cf., por exemplo, ECKARDT, I, p. 63 (n. 35 / §1).

[xlix] É de notar, no entanto, que, embora haja acordo substancial quanto ao significado material do princípio, nem todos concordam com a sua formulação legal [cf. supra, n. (36)]. Cf., por um lado, RENAUD, p. 89 ss; LEHMANN/HOENINGER, p. 314; GIERKE (J), p. 262 ss; BAUMBACH/HUECK, p. 12 s; e, por outro, KRAFT (A), I/1, p. 9 s (n. 30 ss / § 1); cf. também ECKARDT, I, p. 65 (n. 42 ss / § 1); MEYER-LANDRUT, p. 42 (n. 6 / §1) e COSACK, p. 600, 631 s.

[l] Sobre o grau de independência (despersonalização) não há, no entanto, unanimidade de opiniões (cf. WÜRDINGER, p. 4 ss, e KRAFT (A), I/1, p. 9 (n. 32 / §1).

[li] Cf. a nota ant. e infra, no texto.

[lii] Cf. infra, no texto.

[liii] Cf., por exemplo, KRAFT (A) (I/1, 1ª ed.), p. 283 s (n. 62 s, 65 / § 41; cf. também n. 3 / § 10, p. 82); LUTTER1, II/2, p. 372, 374 (n. 4 / § 189, n. 2 / § 191); GODIN/WILHELMI, p. 204 s (n. 1 / § 41; cf. também p. 220 s, n. 23 s / § 41), 1134, 1136 (anot. § 189, e n. 1 / § 191); cf. também ECKARDT, I, p. 464, 473 s (n. 11, 51 ss / § 41); HUECK/CANARIS, p. 192.

[liv] Cf. KRAFT(A) (1ª ed.), p. 283 s (n. 62 s, 65 / § 41); ECKARDT, I, p. 464, 473 s (n. 11 e 51 ss / § 41), p. 369 s (n. 34 ss / § 29); GODIN/WILHELMI, p. 204 s, 43 (n. 1 / §41, n.1 / §10).

[lv] Cf. LUTTER1, II/2, p. 372, 374 (n. 4 / § 189, n. 2 / § 191; cf. também KRAFT (A), p. 98 (n. 3 / § 10); GODIN/WILHELMI, p. 1135 (anot. §§ 189 e 191).

[lvi] Sobre o carácter fungível do direito, cf. SCHILLING1, I, p. 493 (n. 24 s da Introd. à GmbHG), II, p. 71 (n. 6 s / § 14 GmbHG); REUTER1, p. 312 s (n. 50 da Introd. ao § 21 BGB); cf. também CANARIS, p. 932 s (n. 1817).

A lei configura o direito como titulável a partir do seu nascimento, com a inscrição, no registo comercial, da sociedade ou do aumento de capital (cf. os §§ 41(4), 191): Cf. GODIN/WILHELMI, p. 221 (n. 24 / § 41), 1136s (n. 1 e 2 / § 191); ECKARDT, I, p. 473 s (n. 51 ss / § 41); KRAFT (A) (I/1, 1ªed.), p. 284 (n. 65 s / § 41); LUTTER1, II/2, p. 374 s (n. 4ss / § 191); BARZ, I/1, p. 306 (n. 30 / § 41).

[lvii] Cf., por exempo, ECKARDT,I, p. 142 (n. 4 / § 10); HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 320 (n. 90 / § 67); e infra, no texto.

[lviii] Cf., criticamente, CANARIS, p. 1037 (n. 2050).

[lix] Cf. CANARIS, p. 1031 (n. 2040; cf. também p. 932 s, n. 1815 ss); HUECK/CANARIS, p. 14 ss; ZÖLLNER4, p. 251 ss; ZÖLLNER, p. 7.

[lx] Cf., nomeadamente, CANARIS, p. 933 (n. 1818), p. 1033 s (n. 2045).

[lxi] Cf. OPITZ, Depotgesetz, 1955 (2ª ed.), n. 12 / § 42 desta lei, eFünftzig depotrechtliche Abhandlungen, Sammelband 1954, p. 46 ss, cit., nomeadamente, por CANARIS, p. 1032. Ver sobre o assunto: CANARIS, p. 1032 ss (n. 2043 s) ZÖLLNER4, p. 255 ss (257); BAUMBACH/DUNDEN/HOPT. p. 1070 s (n. 1 B DepotG); BAUMBACH/HEFERMEHL, p. 13, 40 ss; e cf., ainda, HUECK/CANARIS, p. 15 ss; ZÖLLNER, p. 6 s; BROX, p. 225 s.

[lxii] CANARIS, p. 1033 (n. 2044; cf. p. 932 s, n. 1815 ss).

[lxiii] CANARIS, p. 1053 ss (n. 2047 ss, 2050). É de notar, no entanto, que, se o conceito de direito-valor parece corresponder a um dado adquirido da ciência jurídica [cf. CANARIS, HUECK/CANARIS, ZÖLLNER 4, cits. na n. (61)], as construções que os diversos autores fazem do fenómeno não são inteiramente coincidentes [cf., nomeadamente, CANARIS, cit. na n. (61)].

[lxiv] Além do título individual chamado acção, o direito alemão conhece outros títulos (cf. os §§ 10 AktG e 9a DepotG), que não são directamente tidos em consideração no texto que se segue. Para uma perspectiva histórica do aparecimento e evolução do título accionário, ver K. LEHMANN, p. 26, 77ss. Sobre a sua natureza e função, cf., por exemplo, LEHMANN/HOENIGER, p. 317; GIERKE (J), p. 267; BAUMBACH/HUECK, p. 13 (n. 16 / § 1), 28 s (n. 1 / §10); WÜRDINGER, p. 53 ss; MÖHRING/NIRK/TANK, I, p. 92 (nº 137); HUECK/CANARIS, p. 14 ss; CANARIS, p. 1031 (n. 2040).

[lxv] Cf., por exemplo, BRUNS, p. 329; WIEDEMANN, p. 150; BAUMBACH/HUECK, p. 199 (n. 5 / § 68); BARZ, I/1, p. 515 s (n. 4 s / § 68); MÖHRING/NIRK/TANK, I, p. 96 (nº 143); GODIN/WILHELMI, p. 360 (n. 4 / § 68); LUTTER1, I/2, p. 524 s (n. 5 / § 68; cf. também 2ª ed., p. 831); HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 346 (n. 5 / § 68).

Actualmente, admitem a cláusula não à ordem HUECK/CANARIS, p. 192. A sociedade não tem, no entanto, segundo estes autores, poder para, por si só, configurar o título como Rektapapier, ela só o poderá fazer com o consentimento do accionista, já que este tem um direito inderrogável a que lhe seja entregue um título que sirva de veículo de transmissão do direito accionário (Umlaufpapier).

No domínio do HGB, admitiam uma cláusula estatuária «não à ordem» LEHMANN/HOENIGER, p. 338 (4). No mesmo sentido, no domínio da AktG 1937, cf. ULMER (E)1, p. 24 (com indic. de lit.) e 102. A doutrina hoje dominante parece considerar, no entanto, que, em matéria e titulação, a autonomia estatutária se limita à opção entre o título à ordem e o título ao portador (cf. a lit. cit. acerca da cláusula não à ordem). Diferente era a situação no domínio do ADHGB: cf. os arts. 182 IV e V e 223, e RENAUD, p. 416 (a acção nominativa podia ser um título à ordem ou nominativo); e, sobre o significado do «título à ordem» nesta altura, cf. WIELAND (K.), p. 39, e HAHN, p. 411 (anot. 5 ao art. 182 ADHGB).

[lxvi] Cf., por exemplo, HUECK/CANARIS, p. 25, 192; LUTTER1 (2ª ed.), I/3, p. 813, 853 (n. 3 / § 67, n . 9 do ap. ao § 68).

[lxvii] Cf., supra, a n. (57).

[lxviii] Cf., por exemplo, RAISER, p. 29 s; HUECK/CANARIS, p. 23 s, 191 s; ZÖLLNER, p. 9 s, 13 s, 173 s; ZÖLLNER4, p. 251 ss (277 ss), e infra, no texto. É de notar, no entanto, que a possibilidade de transmitir por cessão o direito documentado por título ao portador é controvertida (cf. sobre o assunto, nomeadamente, ZÖLLNER, p. 9s, 173, 166 s, ZÖLLNER4, p. 272 ss (285); no caso das acções nominativas, é, em geral, admitida (cf., por exemplo, HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 354 (n. 33 / § 68)), não tendo mesmo esta tese, que eu saiba, hoje em dia, opositores. Cf. infra, no texto.

[lxix] Cf. CANARIS, p. 1031 (n. 2040); HUECK/CANARIS, p. 14 ss; ZÖLLNER 4, p. 251 ss.

[lxx] Cf. HUECK/CANARIS, p. 6, 76, 192; ZÖLLNER4, p. 251 ss (em especial, p. 282 s). Cf. também, embora com um alcance menor do que o assinalado no texto, para os títulos de crédito em geral, ULMER (E)1, p. 73 ss, e, para as acções, STÜDEMANN, p. 51 s.

[lxxi] Cf., por exemplo, WIELAND( K), II, p. 40; LEHMANN/HOENIGER, p. 316; GIERKE (J), p. 267; BAUMBACH/HUECK, p. 28 s (n. 1 / § 10); GODIN/WILHELMI, p. 32 s (n. 5 / § 6), p. 43, 45 (n. 1 e 5 / § 10); HUECK/CANARIS, p. 25, 192 s; EKARDT, I, p. 142 s (n. 5 ss / § 10).

[lxxii] Esta disposição [o § 23 (3).5 AktG] foi introduzida pela lei de 13. 12. 1978, que deu, igualmente, nova redacção ao § 24. Sobre o assunto, cf. KRAFT (A, I/1, p. 99 s (n. 12 ss / § 10); ECKARDT, I, p. 315 s (n. 77 ss / § 23). Para a situação anterior à lei de 1978, cf., por exemplo, GODIN/WILHELMI, p. 134 (n. 1 / § 24).

[lxxiii] Cf., por exemplo, WIELAND (K), p. 39, BAUMBACH/HUECK, p. 29 (n. 2 / § 10), 198 s (n. 5 / § 68); MÖHRING/NIRK/TANK, I, p. 95 (nº 143); LUTTER1, I/2, p. 524 (n. 5 / § 68). O facto de uma acção ser vinculada (cf. infra) não he retira, segundo a doutrina dominante, o carácter de título à ordem: cf., por exemplo, HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 365 (n. 76 / § 68, com indicação de literatura).

[lxxiv] Cf. BRUNS, p. 329; BRUNS/RODRIAN, p. 244; WIEDEMANN, p. 150; HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 348 s (n. 12 a 14 / § 68); ZÖLLNER, p. 14 e 173; MÖHRING/NIRK/TANK, I, p. 92 s (nº 138).

[lxxv] Este tem mera eficácia legitimadora; a transmissão do direito e do título dá-se independentemente da inscrição do adquirente. Sobre o seu significado jurídico (incluindo a evolução que historicamente sofreu), cf. GODIN/WILHELMI, p. 353 s (n. 3 s / § 67); LUTTER 1, I/2, p. 513 ss (n. 12 ss / § 67); HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 321 ss (n. 22 ss / § 67); MEYER-LANDRUT, p. 503 s, 509 ss (n. 1 ss, 13 ss / § 67); SCHÖNHOFER, p. 30 ss; WIEDEMANN, p. 131 ss; LEHMANN/HOENIGER, p. 338 (mas cf. também p. 336).

[lxxvi] Sobre este direito, cf. WIEDEMANN, p. 139 s; BARZ, I/1, p. 523 (n. 18 / § 68), p. 526 (n. 24 / § 68); HEFERMEHL//BUNGEROTH, p. 319 (n. 14 / § 67); BRUNS, p. 329 e 332; MEYER-LANDRUT, p. 67 (n. 40 / § 1); COSACK, p. 634; SCHÖNHOFER, p. 33; cf. também STAUB/PINNER, p. 188 (n. 1 / § 222 HGB), p. 196 (n.1 / § 223 HGB).

[lxxvii] Cf. HUECK/CANARIS, p. 192, e infra, no texto (tít. II).

[lxxviii] Cf., por exemplo, HUECK/CANARIS, p. 1 (ss); ZÖLLNER, p. 15 ss. Cf. esta noção com o que se diz no texto correspondente à nota (59). Para uma noção mais restrita, cf. ULMER (E)1, p. 1, 16 ss (cf., também, 93 ss).

[lxxix] Cf., por exemplo, HUECK/CANARIS, p. 2; cf. também ZÖLLNER 4, p. 275 s, 278.

[lxxx] Cf. HUECK/CANARIS, p. 2 s; GURSKY, n. 1, 2 e 5 / § 952 BGB; QUACK, n. 1 / § 952 BGB; BAUR, p. 504.

[lxxxi] Cf., por exemplo, HUECK/CANARIS, p. 2 ss, 20 ss; CANARIS, p. 1034 s (n. 2047); BRUNS, p. 329 e 331; GURSKY, n. 5 / § 952 BGB. Cf. também (embora este autor tenha uma concepção mais estreita dos títulos de crédito, reduzindo-os aos títulos ao portador e à ordem) ULMER(E)1, p. 6, 72 ss (máxime, 74), 93.

[lxxxii] Cf., por exemplo, SAVIGNY, II, p. 232 ss; ULMER(E)1, p. 1, 20, 74 s; HUECK/CANARIS, p. 2 s, 23; CANARIS, p. 1034 s (n. 2046 s); ZÖLLNER4, p. 249 s; BGH, NJW 1958, p. 303.

[lxxxiii] Cf., nomeadamente, SAVIGNY, II, p. 237 s; e, para mais indicações, ZÖLLNER, p. 249 s e n. (1). A ideia de incorporação aparece já em LIEBE, p. 101.

[lxxxiv] Cf. supra, a n. (78) e o texto correspondente, bem como GIERKE, II, p. 105 ss, 116.

[lxxxv] No sentido de que o valor do título reside no direito, cf., nomeadamente, JACOBI, p. 342; e ULMER (E)1, p. 73 ss, 18.

[lxxxvi] Cf., nomeadamente, GURSKY, n. 5 e 7 / § 952 BGB; JACOBI, p. 346 s; GIERKE, II, p. 105 s, 116 s.

[lxxxvii] Cf. STÜDEMANN, p. 46.

[lxxxviii] Cf., nomeadamente, GIERKE, II, p. 105, 116 s; ULMER (E)1 , p. 1, 6, 20, 72 ss; GURSKY, n. 5 / § 952 BGB; LOCHER, p. 6. Na literatura posterior a 1989, cf., por ex., KARSTEN SCHMIDT, Gesellschaftsrecht (2002), cit., p. 777: «Verbrieftes Recht ist bei der Aktie die Mitgliedschaft unter Einfluss der dazugehörigen Teilrechte (...). Die Besonderheit der als Vertpapier verbrieften Aktie im Gegensatz etwa zum Geschäftsanteil bei der GmbH besteht darin, dass Verfügungen nicht über die Mitgliesdschaft selbst, sondern über die Aktie als Wertpapier getroffen werden. Es gilt der Grundsatz: das Recht aus dem Papier folgt dem Recht am Papier».

[lxxxix] Cf. GIERKE, II, p. 105 ss (em especial, p. 107).

[xc] Cf., por exemplo, JACOBI, p. 493; LUTTER1 (2ª ed.), I/3, p. 855 (n. 15 do ap. ao § 68 AktG).

[xci] Cf., por exemplo, BGH, NJW 1958, p. 302 s; BAUMBACH/HEFERMEHL, p. 21, 146 s (n. 46/1ª parte, n. 5 / art. 11 WG); LOCHER, p. 97 s; ULMER (E)1, p. 75 s; JACOBI, p. 466; HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 354 (n. 33 / § 68 AktG); BARZ, I/1, p. 515 (n. 3 / § 68 AktG); HUECK/CANARIS, p. 75 s. N.A: Em 2001, a lei foi alterada no sentido desta admissibilidade, já aceite pela doutrina maioritária, passando o § 68 (1) a dispor: «Namensaktien können auch durch Indossament übertragen werden». Cf., por ex., com mais indicações, Uwe HÜFFER, Aktienrecht, 9 ª ed., Munique (Beck) 2010, p. 336 (§ 68, n. 3).

[xcii] Cf. GURSKY, n. 5 / § 952 BGB; ULMER(E)1, p. 74 s; QUACK, p. 832 s (n. 1, 4 e 10 / § 952 BGB); e, ainda, PALANDT/BASSENGE, p. 1051 (n. 3 / § 952 BGB); BAUMBACH/HEFERMEHL, p. 14, 146 (n. 25/1ª parte, n. 5 / art. 11 WG: transmissão ope legis do documento).

[xciii] Cf., em geral, ULMER (E)1, p. 77 (o documento não é aqui Übertragungsmittel, mas é Übertragunssymbol), JACOBI, p. 467; para a letra, BGH, NJW 1958, p. 302 s, PIKART, n. 21 / § 952 BGB, HUECK/CANARIS, p. 75 s, HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 354 (n. 34 / § 68), BAUMBACH/HEFEMEHL, p. 146 s (n. 5 / art. 11 WG, com indic. de lit.); para as acções, BARZ, I/1, p. 515 (n. 3 / § 68 AKTG), GODIN/WILHELMI, p. 357, 359 (n. 1 e 4 / § 68 AktG), STÜDEMANN, p. 47; MÖHRING/NIRK/TANK, I, p. 92 (n. 138).

[xciv] Sobre os títulos como coisa móvel, cf., em geral, GIERKE, II, p. 104, 106s, JACOBI, p. 341 ss; para os títulos à ordem e ao portador, GODIN/WILHELMI, p. 357 (n. 2 / §68 AktG); para os títulos ao portador, PIKART, n. 23 / § 929 BGB e n. 1 e 20 / § 952 BGB; LUTTER1 (2ª ed.), I/3, p. 855 ss (n. 14 ss do ap. ao § 68); QUACK, p. 683 (n. 17 / § 929 BGB); WIEGAND, n. 6 / § 929 BGB. Tanto PIKART (n. 24 / § 929), como QUACK (n. 18 / § 929 BGB) e WIEGAND (n. 6 / § 929 BGB) reconhecem que a aplicação do direito das coisas é, no caso dos títulos à ordem, limitada; e não se dá nos títulos nominativos (cf. WIEGAND, n. 6, PIKART, n. 25).

[xcv] Notando, de algum modo, esta diferenciação entre os títulos à ordem e ao portador, cf., PIKART, n. 23 s / § 929 BGB, n. 20 s / § 952 BGB; WOLF/RAISER, p. 422.

[xcvi] Cf, ZÖLLNER4, p. 277 ss (em especial, 285); ZÖLLNER, p. 9 s, 173, 166 s; BAUMBACH/HEFERMEHL, p. 14 (n. 25/1ª parte); HUECK/CANARIS, p. 6, 23 s.

[xcvii] Cf., por exemplo, BAUMBACH/HEFERMEHL, p. 14 (n. 25/1ª parte: transmissão ope legis); HUECK/CANARIS, p. 23 s.

[xcviii] Cf. HUECK/CANARIS, p. 6; ZÖLLNER, p. 11 s; ZÖLLNER4, n. (71), p. 273. Contra, JACOBI, p. 440 ss.

[xcix] Cf. ZÖLLNER4, p. 277 ss (cf. também ZÖLLNER, p. 10 ss, 14, 83 s, 173, 166 s); HUECK/CANARIS, p. 6 e 76 (para os valores mobiliários apenas); HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 354 (n. 33 ss / § 68 AktG, para as acções); LUTTER1 (2ª ed.), I/3, p. 836 (n. 17 / § 68 AktG, para as acções).

[c] Cf. ZÖLLNER4, p. 281 ss; HUECK/CANARIS, p. 6, 76; LUTTER 1 (2ª ed.), I/3, p. 836 (n. 17 / § 68 AktG).

[ci] Recorda-se que, no direito alemão, enquanto no tráfico de coisas móveis (corpóreas), vigoram os princípios da separação e da tradição, a cessão de direitos (não reais), entre as partes, dá-se por simples efeito do contrato. Cf. sobre o tema Evaristo MENDES, «A compra e venda como contrato translativo. Alguns aspectos», O Direito 148 (2016)/IV, p. 779-821, em especial, 813 ss (texto de 1986).

[cii] Cf. ZÖLLNER, p. 281 (ss). Contra BGH, NJW 1958, p. 303 (com referência às letras); JACOBI1, p. 666 s (letras e cheques); ULMER (E)1, p. 77; e (no caso das letras) BAUMBACH/HEFERMEHL, p. 146 s (n. 5 / art. 11 WG).

[ciii] Cf. ZÖLLNER4, p. 281; LUTTER1 (2ª ed.), I/3, p. 836 (n. 17 / § 68 AktG).

[civ] ) Na doutrina mais recente, cf. a bem explícita posição de LUTTER 1 (2ª ed.), p. 855 ss (n. 14 ss do ap. ao § 68 ktG, em especial, n. 15, p. 855).

[cv] Afirmam que o valor do título reside no direito nele documentado e que o documento serve o direito, está em função dele, nomeadamente, JACOBI, p. 342; e ULMER(E)1, p. 73 ss, 18. Cf também ZÖLLNER, p. 251 ss (em especial p. 282 ss) e supra a n. (70).

[cvi] É de referir que, mesmo que incompatibilidade houvesse, a solução não teria que ser necessariamente o afastamento da cessão, tanto mais que a «regra» de que o direito segue o título é mais uma fórmula (didáctico-)interpretativa do fenómeno dos títulos circulantes do que um verdadeiro princípio jurídico: cf. ZÖLLNER, p. 275. Tal incompatibilidade não existe, porém, como se vai ver.

[cvii] Cf., nomeadamente, BAUMBACH/HEFERMEHL, p. 3 ss (n. 3 e 10/1ª parte). Cf. também JACOBI, p. 342 ss (em especial p. 344), p. 348 s; ZÖLLNER4, p. 277, 285. Sobre o sentido desta afirmação, cf. infra no texto.

[cviii] A ideia de que a particularidade dos títulos de crédito (circulantes) reside no facto de tornarem possível a circulação do direito neles documentado por formas de transmissão especiais (cartulares) aparece já em ULMER (E)1, p. 74. Cf. também HUECK/ CANARIS, p. 2 s, 23; CANARIS, p. 1034 s (n. 2046); e, ainda LOCHER, p. 7 ss (quanto ao significado do título).

[cix] Cf., nomeadamente, BAUMBACH/HEFERMEHL, p. 3 ss (notas 3 e 10/ 1ª parte). Para uma identificação expressa do título de crédito com o direito documentado, cf. ULMER (E)1, p. 74.

[cx] Cf. ZÖLLNER, p. 281.

[cxi] Cf., nomeadamente BGH, NJW 1958, p. 303.

[cxii] Considerando que as razões que levam à exigência da tradição são as mesmas nos títulos à ordem e nos títulos nominativos, cf. JACOBI, p. 348, 440 ss, 467.

[cxiii] ULMER (E)1, p. 77. Cf. também JACOBI1, p. 666 s. (o papel é um «sachlich sichtbares Symbol für das verbriefte Recht»).

[cxiv] BGH, NJW 1958, p. 303; cf. também JACOBI1, p. 666.

[cxv] Cf. supra a n. (103) e o texto correspondente.

[cxvi] Considera o argumento sem valor ZÖLLNER4, p. 281.

[cxvii] Cf. ZÖLLNER4, p. 281.

[cxviii] Cf., extraindo diferentes consequências deste pondo de partida, DEGNER, p. 121 ss (o título que documenta um direito de transmissibilidade restrita é um Rektapapier); BRUNS, p. 329 ss (sendo um direito titulável e titulado por um título à ordem, ele não pode ser de transmissibilidade restrita).

[cxix] Uma crítica, em geral procedente, das concepções da acção diversas da que, no seguimento de RENAUD, viria a impor-se na Alemanha pode ver-se já neste autor: p. 96 ss.

[cxx] Cf. SAVIGNY, II, § 64, p. 252 s e nota f1, p. 253 (= Obligationenrecht, II, p. 113, nota f1, cit. por FLUME 2, p. 10).

[cxxi] SAVIGNY, cit. na nota anterior. Sobre a sua concepção acerca da personalidade jurídica das corporações, cf. SAVIGNY1, II, §§ 85 ss, p. 229 ss (em especial, p. 230, 233, 236 s, 277 s).

[cxxii] SAVIGNY, nota f1, p. 253. Note-se que uma visão desta índole ainda hoje é recorrente, designadamente em textos jurídico-económicos (um exemplo é dado adiante, no texto).

[cxxiii] Art. 216 I: «Jeder Actionär hat einen verhältnissmässigen Antheil an dem Vermögen der Gesellschaft».

[cxxiv] Art. 213: «Die Actiengesellschaft als solche hat selbständig ihre Rechte und Pflichten…».

[cxxv] THÖL, I, p. 410 s (§ 121), p. 466 ss (§ 150). Cf., a este respeito, na Itália, Manara e, defendendo uma concepção limitada da personalidade jurídica, circunscrita às relações externas, na linha de Savigny, Rocco, infra, cap. II.

[cxxvi] Cf. HAHN, I, p. 440 (anot. 2 ao art. 213 ADHGB).

[cxxvii] Cf. HAHN, I, p. 444 (anot. ao art. 216 ADHGB); e infra, no texto (al. b)).

[cxxviii] Cf. WIELAND (K), I, p. 610 (§ 50 III), II, p. 35 (§ 91).

[cxxix] O texto pode ver-se, por exemplo, em KROPFF, p. 13 ss.

[cxxx] Cf. Proj. Gov., em KROPFF, p. 14.

[cxxxi] Cf. a nota anterior.

[cxxxii] Cf., por exemplo, RAISER, p. 30; FLUME2, p. 25 s, 29 s «gesellschaftsrechtich vermitteltes Eigentum» na terminologia do Bundesverfassungsgericht).

[cxxxiii] FLUME2, p. 13.

[cxxxiv] Cf. supra, nota (34) e o texto correspondente. Cf. também WÜRDINGER (1959), p. 39 s.

[cxxxv] Cf. FLUME2, p. 12.

[cxxxvi] Cf. supra, nota (13).

[cxxxvii] Cf. a lit. cit. por RENAUD (e respectiva crítica), p. 97; cf. também a nota (127) e a referência que ao assunto faz FLUME 2, p. 12.

[cxxxviii] Cf. supra, 1. b), bb).

[cxxxix] Cf. MATSUDA, p. 240 ss.

[cxl] Cf. MATSUDA, p. 246 ss (em especial, 246 s, 256 s, 262 ss).

[cxli] MATSUDA, p. 264.

[cxlii] Cf. MATSUDA, p. 256.

[cxliii] Cf., identificando no seio da MITGLIEDSCHAFT como posição jurídico-corporativa um tal direito, WÜRDINGER (1959), p. 39 ss.

[cxliv] Cf. supra, §1 A 2b).

[cxlv] Cf., nomeadamente, LUTTER, p. 98 ss; FLUME, p. 125 ss, 345 ss; FLUME1, p. 773 ss; ULMER (P)4, n. 210 / § 105 HGB; e infra, nota (148).

[cxlvi] Contra,HADDING, p. 354 (n. 3b / § 38 BGB; cf. também n. 3a e p. 367, n. 28). A importância da questão decorre do facto de o princípio da especialidade impedir que uma disposição tenha por objecto uma mera Gesamtheit: cf. HADDING 1, p. 354, 367 (n. 3b e 28 /§ 38 BGB). Sobre o princípio, cf., por exemplo, BAUR, p. 30 s, e PIKART, n. 18 ss /§ 929 BGB.

[cxlvii] Cf. supra, § 1 A 1a). A doutrina fala, a este propósito, em autonomização ou objetivação(Verselbständigung, Vergegenständlichung) da MITGLIEDSCHAFT: cf. LUTTER, p. 98 ss; FLUME1, p. 782.

[cxlviii] Na jurisprudência, cf., nomeadamente, BGH, NJW 1954, p. 1155 s, BGHZ 81, p. 82 (84 ss). Na doutrina, ver, em especial, sobre o assunto, WIEDEMANN, p. 51 ss; FLUME, p. 345 ss; ULMER (P) 4, n. 298, 302 ss (em especial, 315 ss) / § 105 HGB; SCHÖNHOFER, p. 29 ss. Cf. também: KRAFTZ/KREUTZ, p. 135 ss; RENAUD, p. 402 ss; LUTTER, p. 98; FLUME1, p. 769 ss (773 ss); GIERKE (J), p. 322 s; STÜDEMANN, p. 38 e n. (26); SCHOLTZ/WINTER, n. 6 / § 14, n. 21 ss, 81 / § 15, n. 1s, 10ss / § 16 GmbHG; BAUMBACH/HUECK1, p. 9 s (ns. 3A a C / §16 GmbHG); SCHILLING1, n. 5 / § 14 GmbHG; SCHILLING/ZUTT, ns. 3, 133 s / § 15, ns. 1, 3 ss / § 16 GmbHG; BAUMBACH/DUDEN/HOPT, p. 449 (n. 2B / § 124 HGB); FISCHER (R), p. 109 ss (n. 21 ss / § 109 HGB); HEFERMEHL, 10.00, p. 31 (nº 74), 10.10, p. 29 ss; LARENZ 1, II (1981), p. 404, 408 s [com lit. e jur. cits. nas ns. (1) e (2) da p. 409]; HÜFFER, p. 400; LEHMANN/DIETZ, p. 125, 180, 356; SCHRÖTTER p. 61 s; ROTH, p. 1333 s (n. 7 ss / § 413 BGB; PALANDT/THOMAS, n. 1a) / § 717 BGB; PALANDT/HEINRICHS, n. 2 / § 38 BGB. Sobre as especificidades do tráfico accionário, cf., no entanto, a nota 88 e o texto correspondente, bem como a concepção de Matsuda.

[cxlix] Cf. supra, §1 A 1a) . Cf. ainda, com indic. bibl., SCHRÖTTER, p. 31, 58 ss; MATSUDA, p. 254 ss; FLUME1, p. 769.

[cl] Cf., nomeadamente, WIEDEMANN, SCHÖNHOFER, FLUME, SCHOLTZ/WINTER, cits. na nota (148); cf. também MEYER-LANDRUT1, p. 237 ss (n. 2 ss / § 16 GmbHG); SCHILLING/ZUTT, n. 7 / § 16, n. 133 s / § 15 GmbHG.

[cli] Cf. WIEDEMANN, p. 53 s, 128; e supra, o texto correspondente às notas (16) s, (145).

[clii] Para uma tentativa de construção do fenómeno, nas sociedades anónimas, em termos algo semelhantes, cf. supra, §1 B 4 b) (Matsuda).

[cliii] Sobre esta, cf., por exemplo, v. TUHR, I, p. 548 (§ 38); ROTH, p. 1133 s (n. 8 / § 413 BGB); HADDING, p. 367 (n. 28 / § 38 BGB).

[cliv] Cf., por exemplo, KRAFT/KREUTZ, p. 92, 135 s; ULMER (P) 4, n. 209 / § 105 HGB (cf. também n. 283 s).

[clv] Cf., por exemplo, KESSLER, n. 75 das notas prelim. ao § 705 BGB, n. 4 / § 719 BGB; GAMM, anot. ao § 719 BGB; FISCHER (R), p. 39 (n. 39 / § 105 HGB), p. 105 s (n. 6 / § 109 HGB); e supra, notas (28) s.

[clvi] Cf. KLUZINGER, p. 30, 70; KRÜGER-NIELAND/ZÖLLER, n. 10 / § 137 BGB.

[clvii] Cf. HADDING, p. 255 ss; HADDING1, p. 367 (n. 28 / § 38 BGB, neste caso, com referência às associações); KRAFT/KREUTZ, p. 136 («Übertragung im Wege eines dreiseitigen Vertrages eigner Art»; é de notar, no entanto, que estes autores consideram aplicáveis analogicamente os §§ 398 ss, 415 I (1ª frase)/182 ss, estes quanto ao consentimento).

[clviii] Cf. (explícita ou implicitamente) BGH, NJW 1954, p. 1155 (1156); ULMER (P)4, n. 302 / § 105 HGB (cf. também n. 208 ss); FLUME1, p. 774; HEFERMEHL, 10.00, n. 75 (p. 32); FISCHER (R), p. 110 s (n. 22 s / § 109 HGB); BAUMBACH/DUNDEN/HOPT, p. 449 (n. 2 B / § 124 HGB).

[clix] Sobre o assunto, cf., por exemplo, LARENZ1 (1982), p. 560.

[clx] Cf., por exemplo, FLUME, p. 350 s; ULMER (P)4, n. 302 / § 105 HGB; e, para a MITGLIEDSCHAFT em geral, LUTTER, p. 99 ss. Cf. também (implicitamente) HEFERMEHL, 10.00, n. 75 (p. 32).

[clxi] LARENZ1, II (1981), p. 409.

[clxii] Cf., nomeadamente, ROTH1, p. 167, 175, 185 (n. 2.1 / § 14, n. 2. 4 e 2.6 / § 15 GmbHG; cf. também ROTH, p. 1334, n. 10 / § 413 BGB). Cf. também HEFERMEHL, 10.00, nº 74 (p. 32); PALANDT/HEINRICHS, p. 412 (n. 1b) / § 413 BGB); e BGH, NJW 1954, p. 1156; ULMER(P) 4, n. 302 / § 105 HGB.

[clxiii] Para além do § 15 V GmbHG, cf. também o § 68 (2) AktG e infra, B.

[clxiv] A posição jurídica do membro de «Vorgesellschaft» e do subscritor de novas acções correspondentes a um aumento de capital ainda não registado é, legalmente, intransmissível (§§ 41 (4) e 191); cf. ECKARDT, I, p. 474 (n. 57 / § 41; cf. também p. 369, n. 34 / § 29); KRAFT (A), I/1 (1ª ed.), p. 283 s (n. 62 s / § 41); LUTTER 1, II/2, p. 372, 374 (n. 5 / § 189, n. 2/ § 191); cf. também BARZ, I/1, p. 306 (n. 29 / § 41); GODIN/WILHELMI, p. 220, 1136 (n. 23 / § 41, n. 1 / § 191), e supra, nota (53).

[clxv] Cf., nomeadamente, LUTTER1 (2ª ed.), I/3, p. 851 (n. 2 do apêndice ao § 68); HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 357 (n. 45 / § 68); KRAFT (A), I/1, p. 98 (n. 4 / § 10); GODIN/WILHELMI, p. 362 s (n. 8 s ao § 68); SCHÖNHOFER, p. 70; e supra, n. (57).

[clxvi] Cf., por exemplo, HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 354 s (n. 33 e 38 / § 68); GODIN/WILHELMI, p. 359 s (n. 4 ao § 68); BARZ, I/1, p. 515 (n. 3 ao § 68). Cf. também SRAUB/PINNER, p. 191 (n. 7 ao § 222 HGB), e supra, n. (68).

[clxvii] Cf. supra, § 1 B 3 bb).

[clxviii] Cf. supra o texto correspondentes às n. (58), (62 s) e cf. ainda: LUTTER1, I/2, p. 528 (n. 16 ao § 68), 546 s (n. 18 ss do apêndice ao § 68); HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 355 s (n. 40 s ao § 68); GODIN/WILHELMI, p. 360 s (n. 4 ao § 68), para as acções nominativas; HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 356 s (n. 43 ao § 68), para as acções ao portador.

[clxix] Cf. a n. (165 s) e infra, no texto (tít. II).

[clxx] Cf. o § 413 BGB e os comentários sobre esta disposição.

[clxxi] RENAUD, p. 408, 425. Este autor contesta mesmo que estejamos perante uma cessão. (Não me parece que a concepção de cessão de créditos então dominante seja objecção suficiente para negar o mérito substancial da posição deste autor).

[clxxii] Cf., porém, LEHMANN/HOENINGER, p. 336 e n. (2), em sentido idêntico ao de RENAUD; LUTTER1, I/2, p. 543 (n. 6 ao § 68; mas também p. 42, n. 2 ss: aplicação dos §§ 398 ss, sem mais restrições). Sobre a aplicação do § 399, cf., por exemplo, HEFERMEHL/BUNGEROTH, p. 357 s (n. 44 s / § 68); GODIN/WILHELMI, p. 363 s (n. 9 / § 68).

(*) Os preceitos que se indicam sem referências ao diploma a que pertencem, a menos que outra coisa resulte do contexto, são do Código das Sociedades Comerciais (CSC).

[clxxiii] Cf., nomeadamente, os arts. 8.2, 23, 37.2, 88, 92, 105, 124 e 465.3 do CSC. Na doutrina, cf., por exemplo, XAVIER, col. 63 ss [e também XAVIER1, nota (76a), p. 171, 176 s]; VENTURA, p. 371, 373 (e também p. 393 ss); BRITO CORREIA, p. 289 ss. Cf., ainda, VAZ SERRA, v.g., 176 BMJ, p. 34s, que, como outros autores (por exemplo, XAVIER), utiliza também o termo «socialidade». Alguma doutrina prefere falar em «posição social» [cf., por exemplo, ANDRADE, I, p. 184 e n. (1)], e há quem fale indistintamente de parte, posição, quota ou participação social (cf. FERRER CORREIA, II, p. 59).

NA: Cf., ainda, por ex., ENGRÁCIA ANTUNES, Direito das Sociedades, 7.ª ed., Porto, 2017, p. 387 e s, P. PAIS DE VASCONCELOS, A participação social nas sociedades comerciais, 2.ª ed., Coimbra (Almedina) 2006, p. 7 ss, 367 ss, máxime 370 [falando num «direito social» (posição de sócio), singular, global e complexo, que, se bem compreendi, tem por objeto - ou incide sobre - a «parte social» (parte, quota ou acção), isto é, toda a sociedade se esta é unipessoal, e uma parte dela (um quinhão) se é pluripesssoal, apesar da personalidade jurídica].

[clxxiv] Cf. O art. 180 CC. Como se pode concluir da análise feita no § 1 do cap. anterior e do próprio facto de esta disposição admitir, tal como acontece no direito alemão (cf. os §§ 38 e 40 BGB), que a posição de associado seja configurada estatutariamente como transmissível, a tradução literal de MITGLIEDSCHAFT por qualidade de associado não me parece a mais adequada. Trata-se, no entanto, de uma simples questão terminológica, a que não deve atribuir-se qualquer significado jurídico especial. A respeito dos ACEs, o DL 430/73, de 15 de Agosto, fala em parte e em participação do membro (arts. 11 e 14). N.A: A situação é semelhante no caso dos AEIEs [art. 22 do Reg (CEE) 2137/85 (participação no agrupamento, participation dans le groupement, participation in the grouping, Beteiligung an der Vereinigung ) e art. 5 do DL 148/90].

[clxxv] Cf., por exemplo, o art. 995 CC.

[clxxvi] Cf., nomeadamente, os arts. 205 ss e 219 ss.

[clxxvii] Cf., por exemplo, os arts. 176.2 e 182. Cf. também, para a posição de sócio comanditado, o art. 469 e, para a de sócio comanditário de uma sociedade comandita simples, o art. 475.

[clxxviii] Cf., nomeadamente, os arts. 272, 276, 298 ss, tendo em conta que, em regra, o legislador, partindo do pressuposto de que há emissão de títulos se refere à participação titulada (cf., no entanto, o art. 304.4). Cf. também, para as sociedades em comandita por acções, o art. 465.3 (onde a identificação é implícita). Na doutrina, cf., para além dos autores e obras cits. na n. (173), FERRER CORREIA, II, p. 72. Cf., no entanto, infra, n. (183).

[clxxix] Cf. (no essencial), no segundo sentido assinalado no texto, nomeadamente, XAVIER, col. 65 s [e também XAVIER1, n. (76a), p. 177 s]; FERRER CORREIA, II, p. 59 s, 84 s; VENTURA, p. 371 e 373; BRITO CORREIA, p. 289 ss [com a ressalva assinalada na n. (183), infra]. Veja-se também infra, 2. N.A: Na literatura contemporânea, cf., por ex., COUTINHO DE ABREU, Curso de Direito Comercial, II - Das Sociedades, 6.ª ed., Coimbra (Almedina) 2019, p. 203 («conjunto unitário de direitos e obrigações atuais e potenciais do sócio (enquanto tal)»), e P. OLAVO CUNHA, Direito das Sociedades Comerciais, 7.ª ed., Coimbra (Almedina) 2019, p. 419 e ss.

[clxxx] Neste trabalho, omite-se, em geral, qualquer referência às sociedades em comandita para não complicar o discurso, embora algumas observações feitas a propósito dos restantes tipos sociais valham, também, com as devidas adaptações para elas.

[clxxxi] Cf. Xavier, col. 64 (com a ressalva de que se trata de uma autonomia limitada). Sobre a situação nas sociedades por quotas, cf. VENTURA, p. 373 ss. Cf. também, além da literatura alemã citada no cap. anterior, nomeadamente, VISENTINI, p. 977 s; FERRI 1, p. 303.

[clxxxii] Cf., no entanto, LABAREDA, p. 9. Na SA em formação, nasce com o acto constitutivo da mesma (art. 274). É como registo que a SA surge como tal, isto é, como sociedade anónima (definitiva) com o capital dividido em ações (arts. 5 e 271). N.A.: Com a respectiva representação cartular ou escritural, as ações adquirem a adicional qualidade de valores mobiliários (art. 46 do actual Código dos Valores Mobiliários - CVM). Cf., por ex., ALMEIDA COSTA /Evaristo MENDES, «Transmissão de acções tituladas nominativas», Estudos dedicados ao Prof. Doutor L. A. Carvalho Fernandes, III, Lisboa (UCE) 2011, p. 15 e ss, 21 e ss.

[clxxxiii] Cf., no entanto, BRITO CORREIA, p. 289 (que identifica a participação social com esta posição jurídica global). Cf., nomeadamente, os arts. 288, 375.2, 379/384, 385. A inclusão de alguns «direitos» no conteúdo da participação social em geral e da própria acção é discutível, como acontece com alguns direitos especiais dos sócios (mas cf. o art. 24.4). O mesmo se passa com as obrigações acessórias referidas nos arts. 209 e 287; no sentido da sua inclusão, cf., no entanto, VENTURA, p. 217 ss (embora com referência às sociedades por quotas). Cf. também o Cap. I, § 1 A 1, e col., p. 64. Para conceitos mais restritos de acção, cf., no Cap. I, o § 1 B 1, 2 e 4 (em especial MATSUDA). Também é, teoricamente, possível considerar que a «qualidade de sócio», tal como, por exemplo, a cidadania, é um bem em si - na medida em que lhe é inerente um estatuto jurídico que representa para quem dele beneficia uma situação de vantagem -, constituindo este bem o objecto de afectação de um direito subjectivo, justamente, o direito à qualidade de sócio. Este pode ainda ser concebido amplamente, de forma a abranger, tendencialmente, todas as posições activas, considerando a sua atribuição como contrapartida da entrada. Nesta concepção, a acção seria uma simples unidade de medida, a menos que se entendesse que, por cada unidade de capital subscrito, ao acionista seria atribuído um direito à qualidade de sócio. No primeiro caso, porém, estaríamos perante uma concepção diferente daquela que subjaz aos textos legais; no segundo, a situação seria idêntica à exposta no texto, mas a linguagem utilizada menos própria. Cf. infra, o que se diz sobre a participação como direito subjectivo.

[clxxxiv] É o caso, nomeadamente, dos direitos ao lucro e à quota de liquidação resultantes de uma deliberação de distribuir dividendos ou de dissolver a sociedade e liquidar o seu património: cf. VAZ SERRA, 176 BMJ, p. 42 (nº 20); XAVIER1, p. 177. Cf., no entanto, BRITO CORREIA, p. 289, 292, 305ss, 313ss, 364 (reconhecendo a autonomia de tais direitos, mas incluindo-os, apesar disso, no conceito de participação social). Na doutrina suíca, cf., designadamente, PESTALOZZI-HENGGELER, p. 17; KRAFT (M.C.), P. 91; GREYERZ, p. 79.

[clxxxv] Cf. o Cap. I, § 1 A e B2. Note-se, contudo, que a participação ou posição de sócio (Mitgliedschaft) nasce antes do registo, como componente da SQ ou SA em formação, com a celebração do ato constitutivo da sociedade. O mesmo vale, mutatis mutandis, para o aumento do capital. Cf. a seguir, no texto.

[clxxxvi] Cf. XAVIER, col. 63.

[clxxxvii] Cf., porém, no sentido de que a acção (ou participação accionária) surge com a escritura de constituição da sociedade, baseando-se no art. 274 CSC, LABAREDA, p. 9. N.A: Veja-se também, no sentido do texto, o citado estudo de ALMEIDA COSTA /Evaristo MENDES, «A transmissão de acções tituladas nominativas» (2011), p. 13 e ss.

[clxxxviii] Sobre os mais modernos e convincentes conceitos de direito subjectivo e de propriedade, vejam-se, em especial, COMPORTI, sobretudo, p. 460 ss; COMPORTI1, p. 1 ss (e também COMPORTI2, p. 1ss, em especial, p. 31ss); e, entre nós, MENEZES CORDEIRO, p. 177 ss (em especial, p. 221 ss, 236), MENEZES CORDEIRO1, I, p. 296 ss (em especial, p. 304 ss, 349 ss), II, p. 879 ss (em especial, p. 898), e, ainda, MENEZES CORDEIRO2, p. 15 ss; GOMES DA SILVA, p. 19 ss (em especial, p. 49 ss); ASCENSÃO, p. 44 ss; 425 ss.

[clxxxix] A opção por um destes termos depende do conceito que deles se tem, questão que não interessa para os fins deste trabalho. Sobre o assunto, cf., por exemplo, COMPORTI, n. (111) e (112), p. 467 s; MENEZES CORDEIRO, p. 251 ss; ASCENSÃO, p. 44 ss.

[cxc] Para os fins deste trabalho, é indiferente a construção da relação locatícia como real ou meramente obrigacional, valendo o que se diz no texto para ambos os casos. Sobre a questão da natureza do direito do locat á rio, pode ver-se, nomeadamente, MENEZES CORDEIRO2, com ampla indicação de literatura.

[cxci] No sentido do texto, cf. MOTA PINTO, p. 227 ss, 392 ss.

[cxcii] Sobre os vários sentidos do termo, cf. RAISER e FLUME, p. 9 ss (em especial, p. 117ss). Sobre o estabelecimento mercantil, a literatura é muito abundante, mesmo no que se refere à doutrina pátria. A quase totalidade dos autores tem, no entanto, se bem compreendo o fenómeno, uma visão desfocada do mesmo, centrada nos elementos técnicos (e/ou técnico-jurídicos) de suporte da actividade mercantil e não na organização global dos factores e na posição de mercado «conquistada», pelo que me limito, na impossibilidade de tratar aqui do tema, a remeter para os escritos de ORLANDO DE CARVALHO, nomeadamente,Critério e Estrutura do Estabelecimento Comercial, I, O problema da empresa como objecto de negócios, Coimbra (Atlântida Editora) 1967, passim, 110 RLJ, p. 102 ss, 114/115 RLJ, p. 360 ss, 9ss. Cf. também, de entre as obras de FERRER CORREIA, Sobre a projectada reforma da legislação comercial portuguesa, in 44 ROA (1984), p. 5 (20 ss); e, ainda, V. XAVIER, Estabelecimento comercial, in Polis, II, col. 1121 ss. Note-se que tal organização produtiva de mercado, em que a posição de mercado ocupa hoje em dia lugar central, é um quid dinâmico, requerendo contínuo investimento e sujeito a erosão concorrencial.

N.A.: Na literatura posterior a 1989, vejam-se, com mais indicações, COUTINHO DE ABREU, Da empresarialidade, Coimbra (Almedina) 1996, e Curso de Direito Comercial, I, 12.ª ed., Coimbra (Almedina) 2019, p. 201 e ss., 225 e ss., bem como Evaristo MENDES, Sumários de Direito Comercial, Lisboa (AAFDL) 1991/92, p. 195 e ss., «Modelo económico constitucional e Direito comercial», Estudos em memória do Prof. Doutor Paulo Sendin, Lisboa (UCE) 2012, p. 167 e ss.

[cxciii] A qualificar-se a participação social como posição contratual, ela terá, portanto, uma especificidade marcada, no confronto com a posição contratual de índole patrimonial geral, da qual são via de regra destacáveis direitos (de crédito), existindo um tráfico jurídico dessa posição - via de regra vinculado, no interesse do contraente cedido (cf. o art. 424 CC) -, mas sobretudo um tráfico (livre) destes direitos (cf. o art. 577 CC). A incindibilidade da participação social - que se viu afirmada a respeito do direito alemão [supra, § 1 A 2b)], aludindo-se também ao postulado da indissocialbilidade da titularidade do direito acionário e do título [supra, § 1 A 3b)] - é na nossa doutrina mais pressuposta do que afirmada. Cf., em todo o caso, VENTURA1, p. 62 s (cf. também p. 10) e Reflexões sobre direitos dos sócios (1984), p. 11 s, bem como, quanto à concepção da posição contratual, em geral, e da participação social, em especial, como categoria jurídica autónoma e unitária, constituída por elementos funcionalmente interligados, MOTA PINTO, em especial, p. 67, 224, 284 ss, 390, e, ainda, p. 82. Veja-se também a nota 195 e o texto correspondente.

O problema é largamente tratado na doutrina suíça. Aparentemente, a situação é controvertida, uma vez que, enquanto uma parte dos autores afirma sem mais o princípio da incindibilidade da MITGLIEDSCHAFT (cf., nomeadamente, PESTALOZZI-HENGGELER, p. 16, 25), em caso de transmissão não consentida de acções vinculadas, outra parte (cf., em especial, BÜRGI, p. 200 ss), seguida pelo Tribunal Federal [cf. BGE 83 (1957) II, p. 297ss; BGE 90 (1964) II, p. 235 ss], considera que há uma dissociação dos direitos patrimoniais, que passam, juntamente com o título, para o adquirente, enquanto a MITGLIEDSCHAFT, com o restante conteúdo, se mantém no alienante. Esta situação é vista por alguns autores como uma excepção ao princípio da incindibilidade (cf. GREYERZ, p. 79, 132). Outros consideram que, havendo apenas a transmissão dos direitos de crédito decorrentes da MITGLIEDSCHAFT e não os chamados direitos patrimoniais abstractos que a compõem, não se verifica tal execepção (cf. KRAFT, p. 80 s, 89 s, 228 ss, 244), embora haja uma dissociação da MITGLIEDSCHAFT e do título. Vistas bem as coisas, não parece haver dissociação da MITGLIEDSCHAFT em si, mas a situação também não é de simples dissociação do direito e do título. Na verdade, sendo este necessário para a transmissão da MITGLIEDSCHAFT (art. 967 CO), o adquirente está seguro de que o alienante não pode retransmitir a sua participação social e, com isso, prejudicar a sua aquisição dos direitos de crédito (presentes e futuros), dela decorrentes e que lhe foram transmitidos. Mas, além disso, é considerado legitimado para o exercício de tais direitos, contra a regra de que vale como tal quem está (no caso das acções nominativas, únicas que estão em causa) inscrito no livro das acções (art. 685.4 CO). N.A.: em 1991, ocorreu uma reforma do direito das sociedades anónimas helvético, devendo o problema reanalizar-se a essa luz.

Na doutrina italiana, cf., em especial, VISENTINI, p. 967, 974 ss. Cf. ainda, nomeadamente, ANGELICI, p. 123 ss (em especial, p. 125 s); DE FERRA, p. 3; FERRI, p. 344.

[cxciv] Neste sentido, MOTA PINTO, p. 392. N.A.: acerca da relação que existe entre o crédito de dividendo e a participação social e dos problemas atinentes à titulação e ao tráfico do crédito, cf. também Evaristo MENDES, «Direito ao lucro de exercício no CSC», Estudos dedicados ao Prof. Doutor M. J. Almeida Costa, Lisboa UCE) 2002, p. 530 e ss.

[cxcv] Esta é também a solução que se defende para o direito alemão: cf. infra, tít. II, cap. I, § 1, onde se trata igualmente da possibilidade de uma execução «comum» da participação social. Os preceitos em causa são, no entanto, vistos por alguns autores como uma excepção ao princípio da indissociabilidade da participação social ou, mesmo, utilizados como argumento para contestar o princípio. Cf. Raul VENTURA, Reflexões (1984), p. 11 s e, na literatura posterior a 1989, por ex., P. TARSO DOMINGUES, CSC em Comentário, coord. de Coutinho de Abreu, V, 2.ª ed., Coimbra (Almedina) 2018, p. 100 e ss, e Tiago ARNOULD, «O destaque do direito aos lucros: esvaziamento do direito de voto e titularidade oculta», RDS V (2013) 1/2, p. 369 ss, ambos com mais indicações e falando numa dissociabilidade, mas circunscrita aos direitos patrimoniais concretos, ativados ou autónomos, transmissíveis também como direitos futuros. Note-se que, no caso em análise, há uma efectiva dissociação dos direitos, pelo menos material (cf. infra, no texto). Em geral, porém, os créditos de dividendo e o relativo à quota de liquidação não se encontram compreendidos pelo princípio da indissociabilidade.

[cxcvi] De acordo com a noção ampla de coisa utilizada pelo legislador (cf. o art. 202.1 CC.), a participação social – que a lei reconhece expressamente como objecto (unitário) do tráfico jurídico, cf., em especial, os arts. 995 CC, 182, 228 ss, 326 ss CSC – pode ser considerada como tal e os rendimentos que, tipicamente, produz com carácter de periodicidade poderão ser qualificados como seus frutos, naturalmente civis, apesar de o 212 CC parecer estar especialmente concebido para as coisas corpóreas. Esta qualificação só tem, no entanto, interesse para resolver a questão da submissão de tais rendimentos ao regime legal dos frutos e, para os fins deste trabalho, esta questão pode ficar em aberto. Cf. em todo o caso, sobre o assunto, SIMONETTO, p. 488 ss, 558 ss.

[cxcvii] Questão distinta é a de saber se é possível uma restrição com eficácia estatutária (e não meramente contratual, nos termos do art. 577 CC) do direito em causa. No direito alemão, alguma doutrina pronuncia-se em sentido afirmativo. Tenho bastantes reservas quanto a esta doutrina, como se verá (cf. infra, tít. II eIV). Note-se, contudo, que a fonte ou matriz social do direito tem influência no regime a que fica sujeito, em especial quanto ao seu exercício, dado o princípio da intangibilidade do capital social (cf. os arts. 31 ss CSC).

[cxcviii] Cf., para as acções, infra, título III.

[cxcix] Cf. Cap. I § 1 A 2 e 3, B 2; e, para outras concepções (realistas e obrigacionistas) da acção, em especial, § 1 B 4.

[cc] Pronuncia-se abertamente no sentido da qualificação da participação social como direito subjectivo de carácter corporativo GRAFFENRIED, p. 18. Cf. também KRAFT (M.C.), p. 89 ss, STEIGER (F), p. 18 ss, JÄGGI, p. 154; e, ainda, WIDMER (N.C.), p. 16, e SCHLUEP, p. 97 s [para a MITGLIEDSCHAFT em si (Recht auf die MITGLIEDSCHAFT als solche)].

[cci] Cf., entre outros: MANARA, p. 512 s [tese da compropriedade; cf. também ROCCO, p. 51, na sequência da sua concepção da personalidade (meramente relativa) das sociedades comerciais (p. 11 ss, em especial, 48 s, 69 ss) (mas cf., ainda, p. 70, 76 s); para maiores desenvolvimentos e também para a crítica desta doutrina, cf., entre muitos, RIVOLTA, p. 39 ss, e, de entre os autores partidários da «dissolução» da personalidade jurídica das sociedades, ROSSI, p. 17 ss]; CARNELUTTI, p. 39 ss (em especial, p. 40 s: figura ambígua, entre o direito real e o direito de crédito); BIONDO BIONDI, p. 546 ss (direito de participação de carácter absoluto, situação jurídica complexa, incluindo direitos e vinculações); BUONOCORE, p. 179 ss [direito à qualidade de sócio, de natureza obrigacional e real (p. 185, 216 ss); cf. para a contestação desta natureza real do direito, COMPORTI1, p. 397 s - para o qualificar correctamente é necessário superar as categorias tradicionais dos direitos reais e dos direitos de crédito (p. 398)]; RIVOLTA, p. 138 ss (direito de carácter patrimonial e natureza especial, denominado direito de participação, constituído por um conjunto de poderes e faculdades que garantem ao seu titular a percepção (pro quota) da riqueza adquirida pela sociedade – cf., nomeadamente, p. 176; é de notar, no entanto, que este não esgota o conteúdo da participação (cf. p. 1, 139 ss), considerando o autor os poderes de carácter administrativo (e as eventuais obrigações que formam com aqueles o conteúdo da posição de sócio) como ligados externamente ao direito por um vínculo funcional (cf. p. 146 ss), pelo que a qualificação que o autor faz não incide sobre a participação social em si, como um todo, mas sobre uma posição jurídica nela contida (ainda que considerada como a sua essência), e, por outro lado, não sendo possível operar uma dissociação deste direito do restante conteúdo da participação (cf. p. 264 ss), a reconstrução do fenómeno é de utilidade duvidosa, salvo quanto ao reconhecimento no conteúdo da participação de uma posição jurídica com determinadas características e conteúdo); PASTERIS, p. 196 ss [direito de participação de conteúdo complexo, traduzindo (segundo parece, cf. p. 197), apenas a posição activa do sócio, de natureza especial (mas a análise é limitada ao conteúdo patrimonial do direito)]. Cf. também ASQUINI, p. 185 s; CANDIAN, em especial, p. 70 ss (direito de crédito); e GRAZIANI, p. 636 s (partindo da contraposição direito real, direito de crédito, aproxima-se desta categoria, embora não seja um direito de crédito em sentido estrito); bem como, para a análise crítica destas teses, por exemplo, RIVOLTA, p. 77 ss e, no cap. I, § B 4.

[ccii] Cf., nomeadamente, ASCARELLI, p. 376 ss; DE MARTINI, p. 436 ss; DE FERRA, p. 3 ss (em esp., p. 11 ss); SANTINI, p. 439 ss; FERRARA Jr., p. 352; DE MAJO, p. 547 ss; GALGANO, p. 13 e 141. Consequentemente com esta qualificação, consideram (salvo a intervenção de título de crédito) a transmissão da participação como cessão do contrato (arts. 1406 ss CCit), ainda que sujeita a regras especiais de circulação, mormente no caso da participação accionária, em especial, SANTINI, p. 445 ss, DE FERRA, p. 16 ss (cf. p. 11 ss); DE MAJO, p. 547 ss. Em sentido diferente, cf., nomeadamente, RIVOLTA, p. 275 ss (com indic. de lit.); cf., ainda, FERRI, p. 6, 145 ss, 335 ss; STOLFI, p. 220 [com indic. de lit. na n. (38)].

[cciii] Cf., nomeadamente, ASCARELLI1, p. 345 ss; GASPERONI, p. 31 ss. Cf., ainda, COTTINO, p. 591 e 598. Para a sua análise crítica, cf., em especial, RIVOLTA, p. 129 ss.

[cciv] Cf. GATTI, p. 33 ss.

[ccv] Sobre o tema, em geral, podem ver-se ainda, nomeadamente, FORNASIERO, p. 87 ss; SPATAZZA, p. 150 ss; FOIS, p. 78 ss; ROSSI, em especial, p. 16 ss; SIMONETTO, p. 521 ss (em esp., 531 ss), fazendo uma análise do conceito, do conteúdo e da natureza da participação social e considerando a qualidade de sócio como termo de troca. Note-se, ainda nesta linha, que a qualidade de sócio - com os direitos associados, proporcionadores de uma situação de vantagem, mormente patrimonial - pode, de facto, entender-se como um bem, objeto de afetação jurídica: em troca de uma entrada de capital, por ex., adquire-se essa qualidade ou adquire-se uma quota, uma ação ou um lote de ações, a que é inerente essa qualidade (cf. supra, nota 183, e infra, no texto).

[ccvi] Cf., nomeadamente, BASTIAN/GERMAIN, 30.00 nº 24 (p. 14); RIPPERT/ROBLOT, I, p. 488 (nº 672), 569 ss (nºs 762 ss), 793 ss (nºs 1145, 1147 ss); HÉMARD/TERRÉ/MABILAT, III, p. 22 ss (para as acções), SAVATIER, p. 347 s, 359 s; GASTAUD, p. 33, 37 ss, 53, 55 ss. Cf. ainda DELHAY, p. 426 ss, 435 ss (em especial, p. 497).

[ccvii] Cf., nomeadamente, FERRER CORREIA, II, p. 59, 84 s (e, para a ideia da participação como status, III, p. 8 s); J. TAVARES, p. 187 ss; PINTO COELHO1, p. 190, 197 s, 205 (e também PINTO COELHO, 88 RLJ, p. 162, 90 RLJ, p. 50); OLAVO1, p. 113 s; STJ 154 BMJ, p. 357. VAZ SERRA não se pronuncia abertamente; cf., no entanto, 176 BMJ, p. 43 (nº 20), 57 (nº 24), 54, 67 (nºs 24 e 29) e os arts. 8.3 e 12 do projecto de articulado. Cf. ainda GUERRA DA MOTA, p. 66 ss (seguindo RIVOLTA). N.A: Para uma análise desenvolvida, na literatua contemorânea, cf. P. Pais de Vasconcelos, A participação social (2006), cit., bem como, nos manuais gerais de direito das sociedades, por ex., COUTINHO DE ABREU, Curso II - Das Sociedades (2019), cit., p. 203 e ss, Engrácia Antunes, Direito das Sociedades (2017), cit., p. 387 e ss, e, sobre a participação social como «propriedade corporativa», A Aquisição Tendente ao Domínio Total, Coimbra Editora, 2001, p. 63 e ss, P. OLAVO CUNHA, Direito das Sociedades Comerciais (2019), cit., p. 287 e ss, 419 e ss, MENEZES CORDEIRO, Direito das Sociedades, I, 3.ª ed., Coimbra (Almedina) 2011, p. 611 e ss, todos com mais indicações. Note-se que a ideia de status ocupa nalguns destes autores (em especial, P. Vasconcelos e M. Cordeiro) um lugar saliente. Cf., ainda, XAVIER1, p. 176 e s, nota 76a, referindo sobretudo Ascarelli, e Evaristo MENDES, «Direito ao lucro de exercício» (2002), cit., p. 535 e ss, e «Aquisições potestativas no artigo 490 do CSC», V Congresso DSR, Coimbra (Almedina) 2018, p. 347 e ss.

[ccviii] Cf., em especial, MOTA PINTO, p. 82 [e a n. (2)], p. 82 s; cf., no entanto, para as quotas de SQ, MOTA PINTO1, p. 8); VENTURA, p. 393, VENTURA1, p. 9 ss (em especial, p. 10 s); XAVIER1, n. (31), p. 568 (segundo parece); STJ, 175 BMJ, p. 246, 248 s (SNC). BRITO CORREIA considera a participação (que para ele é a posição global de sócio) como posição contratual e como universalidade de direito: p. 291.

Sobre a posição contratual como entidade ou categoria dogmática autónoma, coexistindo no sistema jurídico (na panóplia dos conceitos jurídicos) com o direito subjectivo e a obrigação simples, cf. MOTA PINTO, nomeadamente, p. XXIII, 65 ss, 191 ss, 223 s, 281 ss, 314 ss, 373 ss, 390. Esta é também a posição da doutrina italiana dominante: cf., por exempli, ZACCARIA, p. 244, 248, 249 ss (em especial 252 s, 255 ss, 257). Cf., no entanto, para chamada perspectiva atomística da posição contratual e do respectivo fenómeno circulatório, GALVÃO TELES, por exemplo, Cessão do contrato, inVI RFDUL (1949), p. 148, 164 s; e CICALA, Il negozio di cessione del contrato, Napoli 1962.

[ccix] Cf. sobre esta MOTA PINTO, p. 183 s, 490 ss. Quer isto dizer que a participação social circula com a respectiva configuração legal e estatutária: é com isso que um potencial adquirente deve e tem o direito de contar. Sobre o tema, cf. também RENAUD, supra, nota 171 e texto correspondente. Note-se que problema inteiramente distinto, mas de indiscutível relevo prático, é o da oponibilidade de excepções ao cessionário (apenas) dos créditos resultantes da participação social. A esta cessão aplicam-se as regras gerais dos arts. 577 ss CC, como se disse acima.

[ccx] Cf. RENAUD e LEHMANN/HOENIGER, cits. nas notas (171 s) do cap. anterior.

[ccxi] Cf., no cap. ant., § 2, a posição LARENZ [nota (161)].

[ccxii] Sobre o art. 426.1, cf. MOTA PINTO, p. 454 s(s).

[ccxiii] É doutrina pacífica nos restantes ordenamentos jurídicos que têm sido referidos. Para o direito alemão, cf. o cap. ant.; para o direito suíço, cf., por exemplo, STAUFFER, passim, GREYERZ, p. 76 s, 121; para o direito italiano, por exemplo, FERRERA Jr, p. 350, GALGANO, p. 131. Entre nós, cf., no sentido do texto, LABAREDA, p. 219 s; contra, BRITO CORREIA, p. 372 (para a cessão). Cf. infra, no texto, § 2.

[ccxiv] A situação é idêntica no direito italiano (cf. o art. 2355 III CCit) e também na generalidade dos restantes direitos.

[ccxv] O mesmo se passa também no direito italiano (cf. o art. 2479 CCit).

[ccxvi] No direito alemão, cf. o § 137 BGB e infra, tít. IV. No direito português, não há nenhuma norma legal com um alcance correspondente a estas disposições. Cf., no entanto, o art. 1306 CC e o art. 62 CRP, que proclama a transmissibilidade dos direitos patrimoniais como princípio geral do ordenamento jurídico.

[ccxvii] Cf. o § 399 BGB e infra, tít. II.

[ccxviii] Cf. também, para as Srl/SQ, o art. 2479 CCit.

[ccxix] Cf., nomeadamente, ASCARELLI, p. 376 ss; DE MARTINI, p. 429, 431 ss; e SPATAZZA, p. 354. Para outra justificação da eficácia de tais cláusulas a partir da natureza do direito, cf. GRAZIANI, p. 636 s (regime da cessão de créditos, em especial, art. 1260 CCit.).

[ccxx] Cf. sobre o assunto DE FERRA, p. 217 ss; SPATAZZA, p. 377 ss; GALGANO, p. 146 s; FERRI, p. 366 s; ANGELONI, p. 3 ss; FOIS, n. (59), p. 197 (todos com indic. de lit.).

[ccxxi] Para a eficácia real da cláusula de preferência, cf. as explicações dadas por GALGANO e FERRI, cits. na nota anterior.

[ccxxii] As sociedades anónimas (e por quotas) em que os sócios estão obrigados a efectuar prestações acessórias constituem um fenómeno à parte de que não pode aqui tratar-se. É de notar, no entanto, que o Código Civil italiano prevê expressamente, neste caso, a necessidade de consentimento da administração da sociedade para a transmissão da participação social (arts. 2 345 II e 2478 II), o que exclui a aplicação do art. 1 406. Por outro lado, a recusa do consentimento parece dever estar sujeita ao regime geral de transmissão das acções vinculadas, pelo que a situação é diferente da que se verifica na cessão do contrato (cf. no texto).

Este tipo de sociedades anónimas apareceu na Alemanha no século XIX, como forma de associação dos produtores de beterraba. Para a transformação da sua produção agrícola em açúcar, estes constituíam uma sociedade anónima e obrigavam-se a entregar, periodicamente, certas quantidades daquele produto. O fenómeno estendeu-se depois a outros sectores de actividade económica, mas conservando uma dimensão e um significado relativamente modestos.

No domínio do ADHGB (que não previa este tipo de sociedade anónima), o contrato de fornecimento e o contrato de sociedade eram distintos. A partir do HGB, a doutrina passou a ver na sociedade em causa uma sociedade com características próprias e a considerar a obrigação de efectuar prestações acessórias como fazendo parte do conteúdo da participação accionária. A lei vigente (AktG de 1965) regula a matéria no § 55, que, na linha do anterior direito, só admite uma sociedade assim configurada se as acções forem vinculadas (isto é, se a sua transmissão depender do consentimento da sociedade) e só autoriza a assunção de obrigações de efectuar prestações periódicas não consistentes em dinheiro. Nas sociedades por quotas, a autorização para conformar o tipo de modo a abranger este género de obrigações decorre do § 3 da GmbHG.

O Cód. Civ. it. segue, no essencial, o regime do direito alemão e o mesmo acontecia no projecto VAZ SERRA (art. 4, nºs 1 e 3). O CSC, inspirando-se no Projecto de COIMBRA relativo às SQ (art. 3º), não segue nenhum destes modelos, podendo as prestações não ter carácter periódico, ser de carácter pecuniário, e não sendo claro se a obrigação correspondente integra ou não o conteúdo da participação social. Para uma primeira abordagem do tema, pode ver-se VENTURA, p. 200 ss (que considera a obrigação parte integrante da quota: p. 217 ss, em especial, 221). Para a situação existente no direito das SQ na Alemanha (onde não vigoram as restrições constantes da AktG), cf., nomeadamente, ULMER (P)1, I (Suplem.), n. 52 ss (em especial, 61 ss) / § 3 GmbHG.

[ccxxiii] Cf., por exemplo, FERRARA, p. 356 s.

[ccxxiv] No direito português, cf. os arts. 328 s CSC. A situação actual do direito italiano remonta à sentença da Cassazione de 15.5.1978, n. 2365, publicada em praticamente todas as revistas italianas da especialidade, com comentários de variados autores: cf. por exemplo, Giur. Comm. 1978, II, p. 639 ss (com anot. de Castellano). Cf. também Cass. 25.10.1982, n. 5567, por exemplo, in GIUR, Comm. 1983, II, p. 153 ss (com anot. de Castellano); e, para um contentário-sintese sobre a matéria, cf., DALMARTELLO, p. 337 ss.

[ccxxv] A situação é algo diferente nas sociedades por quotas, onde a transmissibilidade só no regime supletivo legal tem uma função equiparável àquela que possui nas sociedades anónimas (cf. no CSC, por um lado, o art. 229.1 e, por outro, o restante regime constante dos arts. 228 a 231).

[ccxxvi] Cf., no entanto, CICALA, passim.

[ccxxvii] Cf., por exemplo, ZACCARIA, p. 249 ss (em esp., 252 s, 255 ss). Para as acções, cf. também DE MAJO, p. 546 ss (em especial, p. 549), que parte da ideia da sua transmissão como cessão do contrato para concluir que o consentimento é elemento constitutivo da mesma.

[ccxxviii] Cf. ZACCARIA, p. 248, com indic. de lit. na n. (20). É de notar, no entanto, que este autor admite duas construções do fenómeno: a do negócio trilateral e a de um negócio bilateral sujeito a condicio iuris (cf. p. 258 ss).

[ccxxix] Entre muitos, cf. ASCARELLI, p. 364 s, 368 ss; DE FERRA, p. 204 ss, e, na jur., cf. Cass. 8.6.1954, n. 1910, in Riv. dir. comm. 1954, II, p. 422 ss (com anot. de DE MARTINI); Cass. 13.7.1957, in BBTC 1957, II, p. 544 s (com anot. crítica de DE MAJO).

[ccxxx] Para a concepção da cessão do contrato como negócio trilateral, cf. MOTA PINTO, em esp., n. (2), p. 193 ss (e também, por exemplo, p. 65, 108, 193, 474 ss), englobando nela a cessão de participação em sociedades de pessoas e por quotas [p. 82 e n. (2), p. 82 s]. Menos claro, VAZ SERRA, anot. ao ac. STJ de 3.3.1977, in 111 RLJ, p. 40 s (embora refira que, sem o consentimento, a cessão não está completa).

No sentido de que a cessão não consentida de parte social de SNC é inoponível à sociedade, cf. STJ, BMJ 175, p. 246, 248 s. No mesmo sentido da mera ineficácia relativa de cessão não consentida de quotas de SQ, cf. o art. 228.2 CSC e VENTURA, p. 579 s. Para a participação social em geral, incluindo as acções, também neste sentido, cf. LABAREDA, p. 287. Note-se, ainda, que, nas SQ e SA, em que a transmissão funciona como sucedâneo de um direito geral de exoneração (que não existe), o requisito do consentimento não serve para impedir o sócio de sair da sociedade (no caso das SQ, desde que se cumpra o disposto no art. 231.3), desvinculando-se da relação social, mas, no essencial, para filtrar as entradas de novos sócios (eventualmente, também para manter equilíbrios de poderes). No caso das quotas e acções não liberadas, a tutela do credor dá-se de outro modo (cf. os arts. 206 e 286). Cf., infra, no texto.

[ccxxxi] Cf. o tít. II, cap. I, §§ 3 e 4.

[ccxxxii] Neste sentido, cf. FERRI, p. 6, 145 ss; e supra, o cap. I.

[ccxxxiii] Cf., desenvolvidamente, sobre o assunto, o tít. II, cap. I, §§ 3 e 4, e também o tít. IV.

[ccxxxiv] Cf., no cap. anterior, RENAUD, cit. na n. (171), e cf. também a n. (172). Relativamente à participação accionária, cf., ainda, VAZ SERRA, 176 BMJ, p. 39, e o art. 5.2 do projecto (cf., no entanto, o art. 12).

[ccxxxv] Sobre o tema, cf. infra, tít. II, cap. I, § 5.

[ccxxxvi] Cf. o cap. I, § 1 B e, por exemplo, XAVIER, col. 63 (que, no entanto, considera corresponderem estas três acepções, mais propriamente, a uma tríplice perspectiva da acção); LABAREDA, p. 5 ss.

[ccxxxvii] Cf. o cap. I, § 1 B; e, por exemplo, PINTO COELHO, 88 RLJ, p. 180 s; XAVIER, col. 66; VAZ SERRA, 176 BMJ, p. 38 s, 54.

[ccxxxviii] Cf. o cap. I, § 1 B 3; e também, por exemplo, DE FERRA, p. 31 ss (com a ressalva de que, como se viu no capítulo anterior, o título não é veículo de circulação da participação accionária; esta é que é o objecto do tráfico e do regime legal).

[ccxxxix] Cf. a lit. cit. na n. (41). N.A.: Sobre as participações em apreço, focando, em especial, o problema da sua transmissão, cf. Nuno PINHEIRO TORRES, Da transmissão de participações sociais não tituladas, Porto (UCP), 1999.

[ccxl] Cf. o cap. I, § 1 B; e também, por exemplo, LABAREDA, p. 8, 36 s, 136, 219 (mas com a ressalva de que, segundo penso, conatural à acção é apenas a sua susceptibilidade de ser representada cartular ou escrituralmente e não a titulação); VAZ SERRA, 176 BMJ, p. 39, e art. 5.3 do Projecto.

[ccxli] Deve ter-se presente que, de acordo com o regime legal supletivo, a participação é configurada como titulável e que é necessário indicar no contrato de sociedade a espécie de título ou o regime (das acções nominativas ou das acções ao portador) a que ficarão sujeitas as acções escriturais [cf. o art. 1, nºs 2 e 3, do DL 229-D/88, e o art. 272 d) CSC].

[ccxlii] Cf. o título II, cap, I, § 3.

[ccxliii] Sobre o assunto, cf., sobretudo, MORELLO, p. 188 ss, em especial, p. 196 ss (embora dando importância decisiva à titulação). Cf. também XAVIER1, p. 159 ss, e o § 23 (5) AktG, bem como o título II.

[ccxliv] Como se viu no capítulo anterior, no direito alemão, a qualificação é real, não representando a sua adopção uma simples comodidade de linguagem.

[ccxlv] Cf. o art. 1, nº 3, do DL 229-D/88 e o cap. I, § 1 B 2 (onde a expressão direito-valor é, no entanto, usada, em geral, como sinónimo de valor mobiliário meramente escritural).

[ccxlvi] Sobre esta disposição, considerando que o seu sentido não é claro, cf. BRITO CORREIA, p. 375. Cf. também LABAREDA, n. (1), p. 240 s.

[ccxlvii] Cf., no entanto, LABAREDA, n. (1), p. 240 s (entendendo que o novo instituto está condenado ao fracasso porque a falta de título impediria a autonomia da acção).

[ccxlviii] Cf. o cap. I, B 2, e infra, no texto e notas. Sobre a experiência francesa de desmaterialização dos valores mobiliários e o significado desta (operada pelo decreto nº 83-359, de 2.5.1983, publicado, por ex., na Rev. soc. 1983, p. 421 ss), cf. nomeadamente, GUYON, p. 451 ss; RIPERT/ROBLOT, II, p. 5 ss (nºs 1734 ss), I, p. 794 ss (nºs 1147 ss, em especial, 1149, 1158 ss). Cabe, em especial, notar que as acções nominativas são originariamente (no CComFr e no CCom de 1833) acções registadas junto da sociedade e - apesar disso - com um regime especial de circulação. Só ao longo do séc. XIX, nalguns paízes, como a Alemanha e a Itália (e depois também Portugal, entre outros), mas não em França, se elevou o documento que tipicamente se entregava ao titular, para prova da respectiva titularidade, à condição de título circulante (título de crédito à ordem ou título de crédito nominativo de massa), relegando o registo (livro das ações) para o papel de instrumento de legitimação do exercício dos direitos. Cf. infra, no texto.

[ccxlix] Sobre o sistema do DL 59/88, cf. BRITO CORREIA, p. 374, 385 ss; e LABAREDA, p. 251 ss.

[ccl] Cf. o cap. I, § 1 B 2, e, em especial, o art. 4.2 da lei italiana de 19.6.1986, n. 289, relativa à administração centralizada de valores mobiliários: “II trasferimento disposto ai sensi del primo comma produce gli effetti propri del trasferimento secondo la disciplina legislativa della circolazione del titoli”. O texto desta lei vem publicado, por ex., na Riv. soc. 1987, p. 188 ss. Sobre o assunto ver, sobretudo, PAVONE LA ROSA, p. 313 ss, que, porém, ao contrário da doutrina italiana e estrangeira que cita (no sentido do texto), considera a fórmula do art. 4.2 da lei n. 289 “genérica e sibilina” (p. 311) e, tendo como pano de fundo a ideia de que a tutela cartular do adquirente de boa fé é uma mera extensão do regime da circulação dos bens móveis só possibilitada pela presença do título (que, na concepção dominante do fenómeno, constitui o objecto directo do tráfico), sem a qual tutela não é, portanto, concebível (cf. p. 309 ss), afasta a sua aplicação à transmissão escritural. Sem aceitar esta perspectiva das coisas, creio, no entanto, que esta questão requer uma reflexão mais aprofundada e, por isso, o que vai dito no texto não deve ser visto como uma adesão inequívoca e definitiva à tese da tutela do adquirente de boa fé registado em conta, mas tão só como a solução que, face aos textos legais e ao actual estado da doutrina, parece de acolher (cf. infra, no texto). Cf. ainda, além da lit. cit. por este autor, OPPO, p. 446.

[ccli] Cf. a n. (248). Sobre o problema da tutela do adquirente de boa fé, em especial, cf. infra, 3 e § 2.

[cclii] Cf., nomeadamente, PINTO COELHO, 88 RLJ, p. 161 ss; VAZ SERRA, 176 BMJ, p. 34 ss (em esp., p. 36; cf. também 106 RLJ, p. 219 ss, 228 ss); XAVIER, col. 66 (s); OLAVO, p. 46 ss (em esp., p. 48 s); LABAREDA, p. 37; e, ainda, FERRER CORREIA, III, p. 8 s; A. ANTHERO, II, p. 292 s; FIGUEIREDO, p. 17 ss; MOREIRA, II, p. 213 ss. É doutrina incontestada na Alemanha e na Suíça (embora neste país possa haver emissão de documentos que não são títulos de crédito se os estatutos o previrem) e dominante na Itália. (É de notar que, neste país, a doutrina que contesta a qualificação do documento accionário como título de crédito aceita que o regime de circulação é o dos títulos desta natureza). Contra, PINTO FURTADO, II/I, p. 207 (só regime de circulação destes; e, quanto a este, cf. p. 213).

[ccliii] Cf., por exemplo, PINTO COELHO, 88 RLJ, p. 180; OLAVO, p. 49 s, 70.

[ccliv] Cf. a nota (237).

[cclv] Cf., por exemplo, ESCARRA/RAULT, III, p. 6 s, 93 s e (nºs 996, 1064); BRULLIARD/LAROHE, p. 221 (nº 347).

[cclvi] Cf. SAMPAIO PIMENTEL, p. 238.

[cclvii] Publicado no Diário de Lisboa de 19.1.1867, p. 193 ss (cf. p. 194).

[cclviii] Cf., por exemplo, MOREIRA, II, p. 213, 215; PINTO COELHO, 88 RLJ, p. 177 ss; FIGUEIREDO, p. ss; OLAVO, p. 56 ss; XAVIER, col. 67 s.

[cclix] Cf., nomeadamente, OLAVO, p. 57 s. Este artigo foi, entretanto, revogado pelo CVM, que passou a conter um regime geral dos valores mobiliários, accionários ou não [cf. supra, no texto, B.1a)].

[cclx] Cf., em especial, OLAVO, p. 7 ss; FERRER CORREIA, III, p. 3 ss.

[cclxi] Cf., nomeadamente, os autores citados na nota ant. (com indic. de bibl.) e, ainda, PINTO COELHO, 88 RLJ, p. 177 ss; MOREIRA, p. 214 ss (para os títulos nominativos, em especial).

[cclxii] Cf., nomeadamente, OLAVO, p. 30 ss; FERRER CORREIA, p. 64 ss; XAVIER, col. 67.

[cclxiii] Abstrai-se aqui daquela corrente de opinião minoritária e hoje superada, na qual se integra, nomeadamente, ULMER (E), segundo a qual só os títulos ao portador e à ordem seriam verdadeiros títulos de crédito.

[cclxiv] Abstraio aqui da concepção francesa, porque nela, como se disse, o verdadeiro título é o registo, tendo o documento accionário natureza meramente certificativa (doutrina dominante).

[cclxv] Pelo menos deste GUILHERME MOREIRA (cf. cits. ants.).

[cclxvi] É a concepção hoje reconhecida pela jurisprudência da Cassazione e pela doutrina italiana dominante (cf., por exemplo, CIAN/TRABUCCHI, p. 1389, n. II.1 / art. 2022; cf. também p. 1390, n. I, 1 a 3 / art. 2023). No mesmo sentido, entre nós cf. VAZ SERRA, 177 BMJ, p. 39 ss (em especial, 79 ss); e STJ (ac. de 16.6 1972), 106 RLJ, p. 215 ss, com anot. de VAZ SERRA. Embora o que discutiu neste aresto não tenha sido directamente a natureza do transfert, a solução dada ao caso tem como corolário a sua natureza legitimadora. Cf., ainda, XAVIER, 68 s.

[cclxvii] Para o nosso anterior direito, cf., nomeadamente, CUNHA GONÇALVES, I, p. 410, III, p. 64.

[cclxviii] Cf. CUNHA GONÇALVES, 1, p. 407.

[cclxix] A transmissão por endosso constava do projecto de VAZ SERRA relativo às acções (cf. o art. 21, e 177 BMJ, p. 23, 34 ss) e era prevista pelo Decreto nº 7, de 30.12.1892 (para os títulos de dívida interna nominativos), mas a nossa doutrina não aproveitou este ponto de apoio legislativo para a construção do fenómeno circulatório dos títulos nominativos: cf. VAZ SERRA, 177 BMJ, p. 28 s (citando G. MOREIRA); cf., ainda, CUNHA GONÇALVES, I, p. 407 (impossível a transmissão por endosso se estatutos o previrem; mas cf. III, p. 64 s); XAVIER, col. 68 (é discutida a possibilidade de transmissão por endosso, mas, na prática, este é utilizado); PINTO FURTADO, II/I, p. 208, 212 (admissibilidade duvidosa no direito constituído, mas solução preferível de jure condendo).

[cclxx] Cf. a objecção de PINTO FURTADO (II/I, p. 213) à ideia de tutela do adquirente de boa fé de acção nominativa que tem a seu favor o transfert. Cf., também, na literatura italiana, MOSSA, p. 274 s.

[cclxxi] Cf. BRITO CORREIA, p. 374, 386 ss.

[cclxxii] Cf. o Dec. nº 83-359, de 2.5.1983, art. 1 I.

[cclxxiii] Cf. ainda, nomeadamente, o art. 1 , nºs 1 e 2, do DL nº 408/82, de 29 de Setembro. Sobre o carácter anónimo da acção ao portador, cf. MOSSA, p. 247, 276.

[cclxxiv] Este ponto é desenvolvido no título II (relativo à transmissibilidade).

[cclxxv] Cf. LABAREDA, p. 241 (nota).

[cclxxvi] Cf. o art. 1 II do dec. 83-359 e, nomeadamente, RIPERT/ROBLOT, I, p. 804 (nº 1161); GUYON, p. 458. É de notar que só as sociedades com acções cotadas podem optar pela forma de representação ao portador (cf. GUYON, p. 457).

[cclxxvii] Para uma primeira análise, pode ver-se LABAREDA, p. 245 ss e BRITO CORREIA, p. 378 ss.

[cclxxviii] Sobre tal autonomia, em geral, cf., nomeadamente, FERRER CORREIA, III, p. 10, 64 ss; OLAVO, p. 30 ss. Com relação ao problema focado no texto, cf. PINTO COELHO, 88 RLJ, p. 146; e na literatura estrangeira, nomeadamente, DE FERRA, p. 31 ss (em especial, p. 47 ss). Cf. também, sobre toda a problemática a seguir focada, VAZ SERRA, 176 BMJ, p. 39, 48 ss, 67, 70 ss (em especial 74 ss), 177 BMJ, p. 27 s, e os arts. 5.2, 7 ss.

[cclxxix] A minha perspectiva do fenómeno cartular (mas só pretendo discutir aqui o fenómeno cartular accionário) não coincide, portanto, com a chamada teoria da propriedade, largamente dominante na doutrina alemã, italiana e francesa. Entre nós, para uma clara adesão a esta, cf. OLAVO, p. 36 ss. FERRER CORREIA não toma partido sobre a questão de saber se o “direito sobre a letra” é ou não direito de propriedade, embora a sua construção se aproxime da dos defensores daquela teoria (cf., em especial, III, p. 38 s, 72 ss). Para um exemplo do exagero a que tal teoria foi levada – e que mostra, no caso concreto, o seu carácter artificial -, cf. RIPERT /ROBLOT, p. 794 ss (nºs 1147 ss, em especial, nº 1149). Para uma perspectiva essencialmente coincidente com a do texto, cf. BIANCA, p. 69 ss. N.A: veja-se também Evaristo MENDES, «A compra e venda como contrato translativo», O Direito 148 (2016)/IV, p. 782 ss (cf., ainda, p. 793 ss) (texto de 1986).

Para a construção jurídica da letra de câmbio na base da primazia do “direito de crédito cambiário”, tendo o título, na circulação cambiária normal, uma mera função de legitimação (na qual se funda a aparência do direito), ver SENDIN, nºs 2 ss, 22, 24 ss, 35 ss, 51 ss, 60 ss, 65 ss. Para a apreciação crítica da tese da propriedade (ou, em geral, do direito real) e do princípio da incorporação, cf., deste autor, os nºs 31 ss e, a propósito da análise das doutrinas cambiárias, em especial, nºs 23.3, 171, 176 ss, 183 ss. N.A: Numa óptica semelhante, cf. Paulo SENDIN / Evaristo MENDES, O aval e a questão do protesto para accionar o avalista do aceitante, Coimbra (Almedina) 1991, p. 95 e ss, e, mais recentemente, Carolina CUNHA, Letras e Livranças. Paradigmas Actuais e Recompreensão de um Regime, Coimbra (Almedina) 2012, p. 77 ss, 371 ss/410 ss, e Manual de Letras e Livranças, Coimbra (Almedina) 2015, p. 59 ss, 80 ss.

[cclxxx] Cf., em especial, o art. 228.2 CSC, STJ, 175 BMJ, p. 246 ss, supra, n. (230) e infra, tit. II. Contra, como se viu acima MOTA PINTO, p. 23 (nota), p. 192ss (n. (2), p. 192, 474 ss.

[cclxxxi] Cf. LABAREDA, p. 231 s. Cf. também, neste capítulo, supra, § 1, A 2 a), com diferenciações (em especial, no que respeita ao direito de subscrição preferencial de novas quotas e acções).

[cclxxxii] Cf. supra, neste e no cap. I, o § 1 A. Tal como acontece na cessão da posição contratual, também aqui surge, ainda, o problema de definir quais as posições jurídicas do titular da participação existentes ao tempo da transmissão susceptíveis de passar para o adquirente e quais as que, tendo carácter pessoal, o não são. O tratamento desta questão não cabe, porém, no âmbito deste trabalho.

[cclxxxiii] Sobre a transmissão por morte e a transmissão forçada, pode ver-se LABAREDA, p. 235 ss, 209 ss.

[cclxxxiv] Sobre a situação anterior ao código de Seabra, cf. COELHO DA ROCHA, II, 754, o art. 454 CCom de 1833 e a anotação a este artigo de SAMPAIO PIMENTEL, II, p. 188 s. Acerca da intenção de manter o princípio no actual código civil, cf. GALVÃO TELES, Contratos civis, in 83 BMJ (1959), p. 114, 117 ss, Venda obrigatória e venda real, in VII RFDUL (1950), p. 85 s; VAZ SERRA, Efeitos dos contratos, in 74 BMJ (1958), p. 333, 349 ss. Em geral, cf. ALMEIDA COSTA, p. 192 ss e, do mesmo autor, Contrato, in POLIS, I, col. 1222, 1238 s; VENTURA, O contrato de compra e venda no Código Cívil, in 43 ROA (1983), p. 588 ss, 593 ss. N.A.: Veja-se, ainda, Evaristo MENDES, «A compra e venda como contrato translativo», O Direito 148 (2016)/IV, p. 779 ss, em especial, p. 793 ss, quanto às acções tituladas [texto de 1986].

[cclxxxv] É para mim duvidoso se à titularidade do direito deve ser equiparado o mero poder de um não titular de dele dispor como seu, embora, salvo estudo mais aprofundado da questão, penda para a afirmativa.

[cclxxxvi] Esta restrição justifica-se porque, no nº 1, embora a norma explícita se refira directamente à questão do momento da passagem da propriedade (cf. os nºs 1 e 2), há também uma outra implícita que afirma o princípio do mero contrato, pressuposto pela primeira e ao qual se refere a ressalva da parte final. Pode, portanto, afirmar-se que do art. 408.1 se extraem, verdadeiramente, duas normas: a de que a transmissão é um efeito directo dos contratos translativos (princípio do mero contrato), com as limitações previstas na lei; e a de que, tratando-se de coisa determinada e existente no património do alienante (ou de que ele podia dispor) ao tempo do contrato, é também um efeito imediato. Cf. PESSOA JORGE, p. 192, e, entretanto, Evaristo Mendes, «A compra e venda como contrato translativo», O Direito 148 (2016)/IV, p. 787 e s (texto de 1986).

[cclxxxvii] Para as acções nominativas, no sentido de que a sua transmissão se dá solo consensu (embora com eficácia limitada às partes, cf. o art. 168, § 1 CCom), cf. já CUNHA GONÇALVES, III, p. 64 (mas cf. p. 60 e 62, para os títulos à ordem e ao portador).

[cclxxxviii] Cf., nomeadamente, STJ (ac. 16.6.72), 106 RLJ, p. 215 ss (com anot. de VAZ SERRA, p. 219 ss, 228 ss); VAZ SERRA, 176 BMJ, p. 67 ss (73 ss, em especial, p. 78 s), 177 BMJ, p. 27 s, 79 ss, e art. 12 do projecto; XAVIER, col. 68. É também a opinião hoje dominante em Itália e na França: cf., nomeadamente, DE FERRA, p. 77 ss, BIGIAVI, p. 2 s, 29 s (cf., ainda, 12 ss, 14 ss), 41 (cf., ainda, 38 ss) – para os títulos de crédito em geral -, DE MARTINI1, p. 118, 119 ss, 122 s, 129 ss, COTTINO, p. 604, GALGANO, p. 138, todos com indic. de lit.; Cassation, sent. de 7.5.1981 (nota de GUILBERTEAU), in 100 Rev. Soc./Journ.soc. (1982), p. 92 ss, LAMY Societés, p. 802, HÉMARD/TERRÉ/MABILAT, III, p. 12, 13s (com indic. de lit.). Para a situação na Alemanha, cf. o cap. I, § 1 B 3. É de notar, no entanto, que, do meu ponto de vista, o princípio deve ser referido ao negócio de alienação do direito titulado, não havendo lugar para distinguir entre uma transmissão (consensual) do «direito sobre o título» e uma eventual cessão (igualmente consensual) da participação.

N.A.: Vejam-se, ainda, Evaristo MENDES, «A compra e venda como contrato translativo», O Direito 148 (2016)/IV, p. 793 ss. (texto de 1986), e ALMEIDA COSTA /Evaristo MENDES, «Transmissão de acções tituladas nominativas» (2011), cit., p. 41 ss. Contra, cf. por ex., com mais indicações, SOVERAL MARTINS,Títulos de crédito e valores mobiliários, Parte II - Valores mobiliários, I - Ações, Coimbra (Almedina) 2018, p. 79 ss.

[cclxxxix] Sobre a possibilidade de transmitir este tipo de acções, cf. LABAREDA, p. 220 s. Contra, BRITO CORREIA, II, p. 372.

[ccxc] Cf. VAZ SERRA, 176 BMJ, p. 54 e 67 e art. 12.1 do projecto; XAVIER, col. 68. N.A.: sobre o assunto, vejam-se, ainda, por ex., Nuno PINHEIRO TORRES, Da transmissão de participações sociais não tituladas, Porto (UCP), 1999, p. 79 ss, e COUTINHO DE ABREU, Curso de Direito Comercial, II - Das Sociedades, 6.ª ed., Coimbra (Almedina) 2019, p. 359 (defendendo a aplicação analógica do regime de transnissão das quotas).

[ccxci] LABAREDA considera como data da própria transmissão em si (e não da sua mera eficácia face à sociedade) a que resulta da aplicação do art. 326.5: p. 221.

[ccxcii] Sendo aplicável ao caso o art. 1.1 do DL. 408/82 (cf. supra, § 1), o que é dito no texto deve entender-se sem prejuízo do disposto neste diploma, na medida em que o exigir a realização dos objectivos visados pelo legislador ao instituir o regime de registo ou depósito obrigatórios [cf., em especial, os arts. 4.3 e 26.1; e também o art. 337 CSC e LABAREDA, n. (1), p. 247].

[ccxciii] O completo esclarecimento desta questão depende, nomeadamente, de uma investigação sobre a razão de ser do art. 584 CC que não pode aqui fazer-se. Note-se que já se aludiu também à não aplicação de outra norma - o art. 585 do CC -, entendendo de aplicar o princípio presente no art. 427 deste Código [supra, 1 a)]. N.A.: quanto ao art. 584, não vejo, hoje, razão para a sua não aplicação. A regra deve ser a da prioridade temporal da notificação (ou equivalente), não do negócio translativo.

· Relativa aos dois volumes da obra.